Difícil
Reparação
Maria Verônica
Azevedo
Nós estávamos os quatro parados em
círculo na entrada do velho casarão.
Leila, com as mãos trêmulas, examinava o
papel um pouco amassado com fortes marcas das dobras, bem envelhecido pelo
tempo. A emoção se espalhava entre nós.
A gente lembrava que deveríamos começar
a procura a partir do chafariz do jardim...
Mas ele não estava lá. Alguém, não
sabíamos quem nem quando, tinha tirado o chafariz dali. No lugar tinham
plantado um canteiro de margaridas.
Estava tudo diferente por ali. Eu pensei
alto:
— Se mudaram tanto assim o jardim... Será
que vai adiantar a gente cavar?
— Claro que vai, falou a Flaviana. O
buraco era bem fundo. Acho que ainda está lá.
Leila começou a ler:
— Dez passos para a direita... Alguém
lembra em que direção?
— A gente estava de costas para a casa.
Eu me lembro bem.
— Então vamos lá. Falou decidido o
Oscar.
— Quinze passos para a esquerda.
Continuou a Leila.
Nós quatro nos movemos juntos com passos
nervosos e alguns encontrões.
Finalmente paramos na frente de uma
escultura de mármore: um grande leão com ar ameaçador.
— E agora? Gritou Oscar, muito nervoso.
Essa é a posição em devemos cavar.
— Vocês têm certeza de que era aqui? Eu
nunca tinha visto este leão.
— Claro! Você não está vendo que este
leão é novo? Foi colocado bem no lugar em que a gente enterrou o cachorro. Não
vai dar para cavar.
Nós estávamos querendo consertar a
situação.
A vovó, já muito idosa, tinha deixado um
diário onde lamentava o fato de seu cão de estimação, Fidélio, que ela tinha
criado desde novinho, com tanto carinho, tê-la abandonado daquele jeito, de um
dia para o outro, sem razão.
Nós, os netos, ao lermos o diário,
ficamos nos sentindo culpados por termos dado fim no cachorro, que sempre
furava a nossa bola. Já tinha dado cabo de três bolas num só mês.
Oscar acabara com o problema levando
Fidélio para um banho de cachoeira. Ele achava que o cachorro ia se perder no
mato e não saberia voltar. Mas o cão da vovó caiu na cachoeira ao atravessar o
rio pelas pedras. Bateu a cabeça e
morreu ali mesmo.
Sem coragem de contar à vovó, tínhamos
feito o enterro no jardim. Por via das dúvidas, fizemos um mapa do local.
Agora, tantos anos depois, emocionados
com o diário, queríamos reparar o dano, fazendo um enterro decente para
Fidélio, ao lado do túmulo da vovó.
Diante da escultura do leão, concluímos
que seria impossível resgatar os restos do Fidélio.
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