Um encontro na
selva.
Ises de Almeida Abrahamsohn.
Era a primeira vez
que eu vinha à Amazônia. Desde pequena eu me senti atraída pela imagem da
remota e impenetrável selva permeada por rios tortuosos e igarapés efêmeros.
Iria passar quatro dias em uma pousada distante dez horas de lancha de Manaus. Juan,
um índio peruano, era o nosso guia.
Saímos às cinco da
manhã, a melhor hora para observar pássaros. A trilha era bem conhecida de Juan
que nos indicava plantas, insetos, ruídos e as enormes sumaúmas, mães de todas
as árvores, cujas copas se alçam até 70 metros. Cuidadoso, o guia insistia para
que ficássemos todos juntos para não nos perdermos. A copa das árvores esconde
o céu e a vegetação mais baixa é tão densa que oculta a visão a mais de três
metros. Os mateiros têm todo um sistema de referências na floresta que nós não
percebemos.
Eu, encantada em fotografar detalhes de folhas,
insetos e troncos, de repente olhei em volta e não vi mais ninguém . Ouvia as
vozes das pessoas e segui por uma trilha naquela direção apenas para descobrir
dez minutos depois que estava perdida. Chamei alto o nome do guia algumas vezes,
mas sem resultado. Que idiota... Com essa idade me perder nessa trilha que
qualquer curumim saberia aonde vai dar! Certamente iriam notar a minha falta,
mas após quanto tempo?
Estava em uma
pequena clareira de onde dois outros
caminhos estreitos se ofereciam como
alternativa para prosseguir. Tinha medo de me afastar ainda mais das trilhas
principais. Ainda tinha água na garrafa
e tomei um gole para aliviar a garganta seca. Fiquei pensando naqueles
corajosos das expedições de Rondon no fim do XIX e começo do XX. Índios hostis,
malária, febres várias, às vezes fome, que loucura! Sentei num tronco meio podre, sobre meu boné,
depois de verificar que não havia nenhum formigueiro. Fiquei naquela clareira
perto de uma hora. Gritava ocasionalmente com a esperança de que me ouvissem,
mas nada. Só o zumbido dos insetos e ao longe o ronco de um bugio. Já nervosa,
com as pernas entorpecidas, as costas e o peito ensopados de suor levantei-me para verificar de novo a trilha
por onde vim e que já havia tentado percorrer sem sucesso.
Ouvi farfalhar no
alto das árvores. Um macaco, talvez, mas o que avistei era um emaranhado de
folhas e cipós saltando de um ramo a outro entre as altas copas. Ajustei a tele
para fotografar. Impossível! Deslocava-se muito rápido e jogava pequenos cocos amarelos
na trilha à minha frente. Na minha ânsia de fotografar a estranha criatura fui caminhando pelo
caminho marcado pelos frutinhos amarelos. E assim, de repente, me vi numa
clareira maior que reconheci pelas duas sumaúmas; era onde Juan havia contado ao
grupo sobre as míticas criaturas da floresta. Entre elas, Sel, o guardião da
selva, protetor de árvores e animais, inimigo dos caçadores que, às vezes,
ajuda incautos amantes da natureza a encontrar o caminho de volta.
Quando contei o episódio com a estranha
criatura revestida de folhas Juan riu e
comentou apenas:
— Até agora ninguém conseguiu fotografar o Sel!
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