MOMENTOS DA VIDA - CARLOS CEDANO



MOMENTOS DA VIDA
CARLOS CEDANO

Foi um grito de terror que rasgou o silêncio da noite, acordou a todos que saíram precipitadamente de seus quartos sem saber o que acontecia. Do alto da escada viram um corpo no meio de uma poça de sangue e ao lado a Cidinha, que apavorada e sem poder falar, contemplava a cena perguntando: Quem é ele? Quem é esse cara?

A família Fernandes tinha chegado ao sitio três dias antes, passariam uma semana e o tempo pressagiava dias ensolarados e noites sem nuvens e sem chuvas. A alegria de todos tinha um motivo maior, domingo seria aniversário de casamento de seu Donato e dona Irma Fernandes. Trinta anos de casados e de contínua felicidade! No dizer da apaixonada esposa.

Com eles estavam a filha Gina, Arturo o filho mais velho com a noiva, e o caçula Miguel. Também veio Cidinha, uma cozinheira de mão cheia, ela não podia faltar! Maria, a moça que trabalhava na casa de campo, tinha feito uma limpeza pra ninguém botar defeito, a casa estava um brinco!

Seu Donato e dona Irma sentaram-se nas poltronas de balanço de onde contemplavam com olhar divertido o vai e volta dos filhos e empregados, da Van para a cozinha, levaram quantidades enormes de mantimentos e bebidas. O motivo justificaria os pecados da gula!
O espetáculo das “formiguinhas” demorou mais de meia hora na maior descontração e todo mundo divertindo-se:  Cadê o gelo gritava Arturo? E o carvão? Indagou o caçula. Quem quebrou essa garrafa de vinho, pô? Perguntou Gina sorrindo. Era uma família feliz sem dúvida! E o domingo seria o grande dia, que também contaria com a presença de outra pessoas, todas do circulo íntimo de família.

Na sexta feira desde cedo curtiram a piscina até o inicio do entardecer, tempo no qual foram servidos variados e deliciosos antepastos e bebidas bem geladas, como o sol exigia! Às dez horas da noite foi servido um jantar daqueles e logo após, o momento esperado! A entrega dos presentes ao casal com direito a lágrimas e renovação de promessas de amor eterno! A joia que dona Irma ganhou de seu Donato causaria inveja à mais amada das mulheres! Por volta de uma hora da manhã o cansaço cobrou seu preço e todos foram dormir e com certeza acordariam tarde!

Mas não foi assim! No topo da escada seu Donato se esforçava para conter a ansiedade dos filhos em descer rápido, quase o atropelando, calma minha gente, sejamos cuidadosos e prudentes, disse ele um pouco nervoso.

Olharam o corpo de perto e viram tratar-se de um homem de uns quarenta anos, vestia-se como alguém do lugar, moreno e calvície incipiente. O cara estava em cúbito ventral no meio de uma grande mancha de sangue. Pai! - Disse alto Arturo - é melhor chamar a polícia já! O pai com a cabeça concordou e o filho telefonou. A chegada do inspetor Renato demoraria ainda quarenta e cinco minutos.

Durante a espera as perguntas foram surgindo, como esse cara entrou em nossa casa? Quem foi o assassino? Indagava seu Donato. Não existe nenhuma porta forçada, nem janela quebrada, será que alguém dentro de casa abriu a porta pra ele? Especulou Gina, e se foi isso, quem, quem o faria?

Bateram à porta. É a policia! - Gritou o caçula abrindo-a. Eram seis horas da manhã, o inspetor logo examinou a vítima, o corpo ainda estava levemente “quente”, levantou-se e sem falar percorreu a casa, verificou portas e janelas e depois disse: Estão aqui todos os que estavam aqui na hora da descoberta do cadáver? Dona Irma respondeu: a única pessoa que está faltando é a Maria que é nossa faxineira aqui no sítio. Podem chamá-la? Perguntou seu Renato e o caçula foi procurá-la.

Maria apareceu, estava pálida, parecia em choque e com olhar perdido! Posso usar algum lugar para falar com ela? Pediu o delegado pra seu Donato que o encaminhou para um pequeno escritório.

Acho que é melhor ligar pra nossos convidados de domingo Gina, você tem jeito pra lidar com isso, explique-lhes a situação e cancele as visitas. Tá certo pai, respondeu ela.

Uma hora depois o inspetor pediu pra falar com o casal e disse: Por volta de quase duas e meia da manhã Maria abriu a porta para seu namorado, um tal de Bituca, se amaram durante um tempo, quando ele disse que ia embora e se despediu Maria estranhou não escutar a porta fechar-se, levantou-se e surpreendeu Bituca na sala carregando uma sacola, ele estava roubando! Maria pediu-lhe pra deixar a sacola e ir embora, porém ele insistiu em levá-la, Maria não deixou, e se estabeleceu uma luta surda. E quando o amante tentou  de estrangulá-la Maria alcançou uma gaveta, puxou-a, pois sabia que nela acharia uma faca,  e, num último esforço, quase desmaiando agarrou-a e a enfiou no peito do cara, ele ainda quis reagir e com medo Maria ainda deu-lhe duas facadas mais, ele deu dois passos e caiu no lugar onde foi encontrado, ela recolocou as coisas no lugar e foi a seu quarto à espera das consequências!

Vocês viram que ela vestia uma camiseta rolê né? Sim, assentiram todos, então o investigador trouxe Maria, já sem a camiseta, e mostrou marcas de dedos no seu pescoço. Foi um caso simples de solucionar, caso típico de legítima defesa! Concluiu o investigador Renato.

A família respirou aliviada, mas estava traumatizada, era como se o ocorrido tivesse sugado a alegria e felicidade de todos. Então seu Donato respirou fundo e com voz firme disse: nossa família sempre lidou bem nos piores momentos que passamos e o segredo foi nossa fé de que juntos podíamos superar os maiores desafios, hoje estamos frente a uma situação difícil e juntos, uma vez mais, vamos superá-la.


Aos poucos os ânimos voltaram e a família reencontrava suas forças internas, vamos dar a volta por cima, foi o sentimento que se impôs nesse momento da vida deles! Domingo será dia de festa!

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