She should have died
hereafter:
There would have been
a time for such a word.
Tomorrow, and
tomorrow, and tomorrow,
Creeps in this petty
pace from day to day
To the last syllable
of recorded time:
And all yesterday,
have lighted fools
The way to dusty
death. Out, out, brief candle.
Life but a walking
shadow, a poor player
That struts and frets
his hour upon the stage
And then is heard no
more. It is a tale
Told by an idiot,
full of sound and fury
Signifying nothing W. Shakespeare
É morta... Não devia ser agora.
Sempre seria tempo para ouvir-se
Essas palavras. Amanhã, volvendo
Trás amanhã e trás amanhã de novo.
Vai, a pequenos passos, dia a dia,
Até a última silaba do tempo
Inscrito. E todos esses nossos ontens
Tem alumiado aos tontos que nós somos
Nosso caminho para o pó da morte.
Breve candeia,
apaga-te. Que a vida
É uma sombra ambulante; um pobre ator
Que gesticula em cena uma hora ou duas,
Depois não se ouve mais; um conto cheio
De bulha e fúria, dito por um louco,
Significando nada. Tradução Manuel
Bandeira
SOM E FÚRIA
Oswaldo U. Lopes
Mauricio
Di Franco era um bom ator. Não sejamos modestos,
grande ator, famoso, ator
global. Era figura carimbada na novela das nove, fizera filmes também, sempre
com sucesso. Sua marca eram os personagens de época, escravatura, período
colonial, impérios, primeiro e segundo, inicio do século XX e por ai afora.
Brilhava
também nos contemporâneos, fazia um vilão que arrancava ódio dos telespectadores.
Andara ainda pelo teatro com bom desempenho, era bom no imaginário dialogo com
a plateia, sua voz ia longe. Conseguira, a custa de muito treino e exercício,
dizer suas falas de costas para o público, sem que nenhuma palavra fosse
perdida. Já representara Ibsen, Brecht, Albee, Pinter, Dias Gomes, Abílio
Pereira de Almeida, Pirandello, Beckett, Moliere, Racine, Machado de Assis e
por ai afora.
Bem faltava algo caro leitor. Todo ator sonha em não morrer
sem representar William Shakespeare.
Quando jovem imagina Romeu ou Mercutio, aos trinta Hamlet, nos quarenta Othello
ou Macbeth se passar disso, sem emplacar, ainda resta o Rei Lear que vai dos
sessenta aos setenta.
Sozinho
em seu camarim à uma hora de começar o espetáculo Mauricio se olhava no espelho
fartamente iluminado e pensava no Macbeth que iria estrear naquela noite com
ele no papel título. A peça maldita, a peça escocesa cujo nome os atores e
pessoas que trabalhavam no palco não queriam nem pronunciar.
Não
se sabe muito da peça. É a mais curta das tragédias de Shakespeare, só aparece
no famoso fólio com todas as suas outras obras. Dela não se conhecem publicações
separadas, os famosos quartos. Sempre teve má fama, a matança é geral, dos
personagens elencados só dois ficam vivos ao fim da peça.
Mauricio
pensou por um instante na sua cara metade e no modo como ela recebeu a noticia
da peça. A mulher de Mauricio chama-se Monica Andrade Di Franco e é a própria
inversão de Lady Macbeth. Médica, obstetra, também consagrada, não tem filhos o
que, nesse ponto e apenas nesse a assemelha a Lady. Mas a semelhança para por
ai. Funciona como uma verdadeira cadeia de arrasto colocada aos pés de
Mauricio.
Monica
parecia mais uma das bruxas do enredo, embora fosse bonita e elegante. Quando
Mauricio anunciou sua intenção de montar a peça escocesa, já foi de pau para
cima dele.
— Você
quer dizer Macbeth, já esta com tanto medo dela que nem fala o nome. Olha,
pensa bem, só duas montagens de Shakespeare no Brasil deram certo. Sergio
Cardoso com Hamlet e Paulo Autran com Othello o resto deu com os burros n’agua,
mal se aguentou um mês em cartaz e não foram poucas. Se você quiser eu posso
até fazer a Lady Macbeth, tenho as mãos cheias de sangue do meu trabalho.
Mauricio olhou-a com raiva crescente, a
filha da puta tinha toda razão, mas bem que podia ajudar ainda que ao final a
vaca fosse pro brejo. Sabia que ela estava absolutamente certa e que o passado
shakespeariano no Brasil era ruim de dar medo.
Começava
pelas traduções. Os tradutores eram na sua totalidade scholars, acadêmicos ou
poetas clássicos e não abriam mão de versos decassilábicos ou alexandrinos.
Como era possível coloquiar com a plateia arrotando versos desse tipo. Quando
não enfiavam uma porção de Ohs! tornando o texto absolutamente artificial,
traiam, por falso moralismo, a clara intenção do autor. Veja-se o exemplo de
Hamlet. O dialogo entre Polônio e Hamlet (A2, C2)
Pol – Do you know me, my lord?
Hamlet - Excellent, excellent well: you are a
fishmonger
O
teatro elisabetano comportava publico estimado em cerca de 800 pessoas. As
entradas mais baratas, de um penny, eram lugares em pé ao redor do palco, gente
bem popular. O horário de trabalho não estava estabelecido em leis, mas pelas
corporações e assim os jovens podiam ocorrer ao teatro durante a tarde.
Todo
mundo sabia que fishmonger era cafetão. Qual a tradução habitual no Brasil:
peixeiro, vende peixe, rufião, proxeneta. Até André Gide na sua badalada
tradução de Hamlet saiu-se com: “marchand de poisson”.
Só
Geraldo de Carvalho Silva teve a coragem de sacar: dono de bordel. Hamlet quer
constranger Polônio porque este cogita que sua filha case com o príncipe, um
excelente partido que um dia será rei, com certeza. Dai compara- o ao dono de
um bordel.
Na
Inglaterra e nos países de língua inglesa que sofreram forte colonização
britânica, o verso pentâmero iâmbico é quase a maneira de falar natural. Associa-se
a isto o aparecimento da bíblia do Rei James no começo do século XVII. Na
tradição protestante o manuseio da bíblia já não é privilégio dos padres.
Qualquer fiel pode e deve fazê-lo. Isso fez e faz com que os pronomes usados na
linguagem shakespeariana sejam entendidos e compreendidos sem muito esforço.
Porque
os tradutores brasileiros nunca tentaram o verso iâmbico é um mistério. Não
diga que ele não existe entre nós. Um lindo exemplo de verso iâmbico é de Noel
Rosa:
aTÉ
amaNHÃ, se DEUS quiser. Se NÃO chover, eu VOLto PRA te VER, oh muLHER.
Dai
Mauricio se debruçou sobre o texto e com mais dois da equipe reescreveu, partindo
do texto de Manuel Bandeira, o seu próprio Macbeth com o qual pretendia
interagir e se comunicar com o público que estava no teatro. Fizera até um
puxado no palco para jogá-lo parcialmente dentro da plateia e assim facilitar
esse contato. Pouco sobrara de Manuel Bandeira, mas o texto ficara enxuto e
muito mais direto. Também pudera o tão louvado texto de Manuel Bandeira
traduzia “It is a tale told by an idiot, full of sound and fury” por “um conto cheio de bulha e fúria, dito por
um louco”. Sound por bulha, é de rachar e o que Manuel Bandeira tinha
contra Idiot ser Idiota mesmo. Bem o teste final era hoje, mas todos os ensaios
e discussões mostravam que fora na direção certa.
Deveria
ter morrido mais tarde...Amanhã e amanhã , mais amanhã... E os nossos ontens
deixam para os tolos a estrada empoeirada da morte...A vida nada mais é do que
uma sombra que passa... Um pobre ator que gesticula...Uma desesperada história contada
por um idiota...som e fúria que não significam nada...Um punhal
imaginário...Vem que te empunho... É um punhal que vejo com seu cabo pronto
para minha mão.
O
sucesso fora extraordinário! O elenco foi chamado ao palco por 10 vezes e mais
chamariam se tivessem concordado e superado a enorme estafa do dia. Sentiam as
pernas até bambear. Vencera e com a peça maldita, a maldita peça escocesa. Todo
o reboliço do sucesso já passara, a coxia estava quase vazia e ele continuava
no camarim.
Nisso
a porta se abriu e Joaquim, o porteiro, avisou com voz lúgubre:
—
Mauricio acabam de telefonar: a Monica foi baleada em um assalto quando vinha
para cá e morreu no hospital.
Mauricio
se olhou no espelho, ainda com a armadura que usara em cena e o olhar sombrio
do assassino impiedoso e murmurou:
— Não deveria ter morrido agora...Deveria
ter esperado para ver o meu sucesso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário