SEM PERDÃO
Carlos Cedano
Recebi
mensagem telegráfica de Henrique escrita em termos sucintos e misteriosos. Foi uma surpresa inesperada recebê-la de uma
pessoa que tinha desaparecido de minha vida nos últimos trinta anos e cuja
lembrança não me trazia nenhuma felicidade, ao contrário, foi muito
desagradável e na nossa briga não fui mais incisiva e radical porque estava de
posse de um segredo meu que eu mesma não gostava de lembrar. O telegrama vinha
de muito longe, de uma minúscula cidade situada na divisa do Acre com o Perú e
que dizia:
Maria
Fernanda,
Só
agora poderei explicar-lhe o mistério do segredo que você me confiou e que nunca
esqueci! Estou à beira da morte e preciso te contar algo, e ver se consigo
obter seu perdão para morrer em paz!
Henrique
O
que será que ele quer me contar, e por quê? Por que me chamou de tão longe para
implorar meu perdão, será que ele sabe algo mais sobre o segredo que pesa na
minha alma até agora?
Cheguei
após uma penosa viagem que durou mais de três dias entre avião e ônibus. Era uma
aldeia habitada por um grupo de pessoas vindas de diferentes lugares do país e
vinculado ao Santo Daime. Fui levada rapidamente à cabana onde se encontrava Henrique,
e me disseram que estava acamado ha muitos dias e ansioso por minha chegada. Entendi
que estava em seus últimos momentos!
Não
o reconheci imediatamente, era um cadáver esperando pelo último suspiro. Quando
abriu os olhos e me reconheceu, esboçou um sorriso, me aproximei dele o mais
que pude. Seu aspecto era repugnante e decrépito, quase irreconhecível. Como às
vezes a morte pode ser feia! – pensei.
Fiquei
a sós com ele, mas por pouco tempo,
o
que confessou me deixou horrorizada e nunca imaginei que um ser humano fosse
capaz de semelhante maldade e covardia. Não quis escutar tudo. Foi suficiente o
que entendi, e sai vomitando da choupana! Essa mesma tarde morreu. Desejei
profundamente que estivesse ardendo no inferno!
O
orientador da seita, seu Lucas, me explicou que desde que chegou Henrique
sempre teve um comportamento de misantropo, não gostava de ninguém, não
socializava e mal respondia às saudações que recebia, desparecia na floresta
por muitos dias e voltava carregando folhas, cogumelos e outras ervas, fazia
experiências e até agora não sabemos sobre o que? Não deixou nenhum registro!
Pedi
pra o orientador ajuda pra voltar
pra São Paulo.
Porem
o tormento do segredo que me afligia foi substituído por algo pior, uma dor
maior e mais terrível, minha nova via
crucis apenas começava e minha viagem de volta foi totalmente tomada pela
pergunta insistente que não conseguia responder:
Como
vou contar isso para meu marido e meu filho? Tudo por culpa desse maldito
canalha e covarde a quem não consegui perdoar mesmo quando suplicou chorando e com
o desespero estampado em seu rosto!
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