Oswaldo U. Lopes
Ser atriz não é fácil, se
você não é conhecida vão te confundir no máximo com modelo, se atingiu a
notoriedade não consegue ter vida própria. A notoriedade esta em conflito
permanente com a privacidade.
Enquanto esperava sua vez de entrar em cena, refastelada na
cadeira que tinha impresso seu nome, Monica Antinori olhava a praça a sua volta,
e pensava:
- Cá estou eu na sempre maravilhosa Florença fazendo de conta que é
Verona e representando Lady Capulet na colorida e esplêndida versão de Romeu e
Julieta.
Já
passara a idade de Julieta, mas encarara numa boa ser a mãe da própria. Era
claro na peça que a Sra. Capuleto tinha entre vinte e sete e trinta e poucos
anos, no máximo.
Por que topara participar? A Sra.
Capuleto não tinha nome, as falas não eram muitas, algumas até duras, mas o
diretor propusera e realizou longas e belas cenas de danças, com o seu rosto em
close e a música de Prokofiev ao fundo. Cinema era bom por causa disso, as
cenas não são cronológicas e, algumas vezes era possível ver até a edição e os
cortes antes do filme estar terminado.
Seu rosto ficara lindo,
fazia jus a sua fama e notoriedade. Ao inferno com a modéstia!
Uma vantagem suplementar de um papel não tão marcante eram as
folgas, muitas folgas. As filmagens tinham Florença como cenário, mas não a
Praça da Signoria. Era evidente demais, não ia passar por Verona nem com a
manada toda tossindo.
Monica aproveitava as folgas e ao entardecer já no
lusco-fusco, metia um enorme óculos escuro, uma echarpe, terninho justo e um
lenço conjugado com chapéu e ia para a Piazza. Já fizera isso outras vezes,
nunca fora notada embora sua presença na cidade fosse comentada todo santo dia
nos jornais e revistas; até o telejornal anunciava a belíssima atriz entre nós.
Naquela noite esbarrou em Antônio jovem calabrês, moreno,
esbelto e... Per la Madonna... Lindo. Acabaram sentados tomando café ao ar
livre na noite deliciosamente quente do verão toscano. Antônio confessou que
entre outras razões, viera para ver sua atriz favorita Monica Antinori e passou
a descrevê-la com um misto de encantamento e luxúria, desejo e êxtase.
Terminaram a noite, tórrida de sexo, no hotel onde ela estava
hospedada sob o olhar cínico e cúmplice do concierge que fazia pequenos gestos
enquanto entregava a chave.
Antônio continuava a falar de Monica Antinori enquanto
abraçava voluptuosamente Aurora Ardenti como se apresentara Monica.
No dia seguinte a má noticia: a filmagem seria num canto da
piazza, já preparado e disfarçado. O inevitável acontecia, uma multidão de
curiosos se juntava em torno.
Sentada em sua cadeira Monica sorria e fazia comentários
superiores com seus colegas de filmagem. O megafone convidava a ação e a voz
claramente anunciava: Monica per piacere a la arena.
Levantou-se com o vestido de época, o cabelo lindamente
posto, joias discretas enfim tudo que a consagrara e consagrava e caminhou para
as câmeras. Foi ai que percebeu bem à frente, na multidão, Antônio que atônito
olhava para aquilo e num gesto rápido mordeu o polegar e desandou a correr em
sua direção. Foi contido muito antes e levado pela segurança, mas o gesto de
morder o polegar era a mensagem inequívoca de ódio e desdém.
Monica voltou-se para a câmera e começou sua fala que
surpreendeu por seu conteúdo sombrio e trágico. Aplaudiram-na ao extremo quando
terminou, ainda com o olhar gelado e frio.
Não era uma grande atriz,
era uma enorme atriz.
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