O segredo de Nicholas - Jeremias Moreira



 O segredo de Nicholas
Jeremias Moreira

Sentia-se o silêncio típico de arrabaldes naquela parte do vilarejo. Havia algumas casas isoladas, feitas de alvenaria, seguidas por fileiras de outras, de madeira, geminadas. Mais adiante a rua se tornava estrada e percorria quilômetros de lavouras e pomares abandonados, campos abertos e ressequidos que se estendiam até o horizonte, num evidente sinal de decadência. Logo depois surgia o abismo.

Diziam que a região era rica em bauxita.

O geólogo Nicholas, da mineradora Brasfer, chegara há poucos dias para realizar um estudo do solo. Numa noite, no bar do Neco, ouviu a história de uma arca com valioso tesouro, enterrada entre os escombros de uma igreja incendiada.  Na tentativa de debelar o fogo, o padre, acabara engolido pelas chamas. Não sem antes amaldiçoar o lugar. No mesmo instante, uma fenda se abriu transversal à estrada. Com o passar dos anos tornou-se um profundo despenhadeiro que interrompeu, para sempre, o acesso aos destroços do santuário.

Nicholas interessou-se pelo assunto e quis saber como, até hoje, ninguém fora buscar a arca.

− É impossível atravessar o precipício. Quem ousou enfrentar a maldição foi sugado pela força magnética da cratera.

Ele saiu decidido a ver isso de perto. Subiu no jeep e rumou em direção ao local. O desfiladeiro era mesmo assustador. Alem de largo e profundo, exalava forte cheiro de enxofre. Ele desceu do carro e foi examinar.

Sem que percebesse, um vulto se aproximou. Quando se deu conta, assustou-se. Mas logo foi encantado pela figura de uma linda mulher. Ela era alta, com longas pernas e um corpo escultural. Cabelos negros como a noite escorridos pelos ombros. Olhos sedutores e lábios cereja.

Falou com uma voz melodiosa:

− O que procura meu senhor?

Meio embriagado com tanta beleza, Nicholas desceu o olhar pelo seu corpo. Quando chegou aos pés sentiu-se confuso. Não eram pés, eram patas mal disfarçadas. 

Respondeu ainda embaraçado:

− Quero ir aos escombros do mosteiro incendiado.

− Posso construir uma ponte sobre o desfiladeiro. Porém, com a condição de que, quem primeiro atravessa-la, entregará sua alma a mim.

O timbre sedutor da voz da mulher não produziu mais efeito. Nicholas deduzira que se tratava do Demônio travestido de mulher.

Pensou um pouco, pediu um tempo e foi até o vilarejo. Voltou depois de uma hora. Trazia uma mochila e um cachorro. Encontrou a mulher a sua espera e disse que aceitava sua oferta.

Imediatamente o Diabo fez com que surgisse uma ponte.

Nicholas tirou um pedaço de carne da mochila, esfregou no focinho do cachorro e atirou do outro lado da ponte.

Imediatamente, o cachorro correu para pegar a carne e atravessou a ponte. Foi o primeiro ser a atravessar.

O Diabo percebeu que formulara mal sua proposta. Irado, abandonou seu disfarce e, por ter sido ludibriado, atirou-se no precipício.

Livre do Diabo, Nicholas foi até os destroços da igreja e localizou a arca. Junto dela havia uma carta. Ele leu! Em seguida, colocou a arca no jeep e a levou para a vila.

Entregou-a ao pároco da igreja com a recomendação de coloca-la no altar e de nunca ser aberta.

Recuperado do golpe e enfurecido, o Diabo jurou vingança.

No dia seguinte, bem cedo, Nicholas foi embora do vilarejo. Não revelou a ninguém o conteúdo da carta!

Na estrada um mochileiro pedia carona. Nicholas parou o jeep e o examinou. Era um jovem e calçava botas de campanha. Nicholas abriu a porta lateral, mandou-o entrar e partiu. Logo depois sentiu um forte cheiro de enxofre.

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