UM TREM MUITO ESPECIAL!
Carlos Cedano
Mrs. Laura Keynes e
Mrs. Mary, companheiras de muitas aventuras, estavam muito felizes nesta viagem
costa a costa nos Estados Unidos. Trem muito luxuoso, serviço excelente e de
extremo conforto, justificavam amplamente o preço pago, mesmo na segunda classe
onde estas características se mantinham em elevado padrão. Seriam seis semanas de
muitas expectativas.
— Sabe, Mary -disse
Mrs. Laura - Esta viagem tem algo diferente, nunca estive numa que em apenas cinco
dias os passageiros tivessem um entrosamento tão espontâneo, parecem amizades de
muito tempo!
— Eu também percebi
isso, e acho muito bonito. Respondeu Mrs. Mary.
Continuaram caminhando
ao longo do trem, então Laura - acenando discretamente para um senhor que parecia ser
o avô de um menino sentado a seu lado – disse:
— Ele está sempre com o
rosto triste e parece carregar uma amargura profunda.
— Você sempre me surpreende Laura Keynes, como
conseguiu chegar a essa conclusão? - Perguntou Mary.
— Eu mesmo não sei, talvez intuição. - foi a resposta de Laura.
A viagem era cheia
de surpresas com uma nova cada dia. Nesse dia teria lugar um concerto de Rock com
uma pequena banda formada por quatro jovens que se conheceram no trem. Foi um
sucesso!
Outra noite foi a
vez de um concertista de violão clássico, um francês foi “descoberto” por uma moça que se
interessou por ele, e que quando soube
de sua profissão, espalhou a noticia e a pressão foi imediata. O jovem aceitou,
e o comentário geral era que se tratava
de um “virtuosi”.
Cada apresentação consolidava
a integração do grupo, as pessoas vivenciavam sentimentos inéditos, e os
sorrisos de felicidade afloravam facilitando
novas relações de amizades.
Num jantar Laura e
Mary tiveram a companhia de Selma, jovem senhora recentemente divorciada. Ela
não lamentava a separação, tinha sido necessária – dizia - porém não conseguia
evitar o sentimento de culpa que a invadia.
Durante a conversa, Selma
confessou que tinha conhecido na viagem um senhor alegre, divertido, e muito
atencioso. Porém, alguma coisa dentro dela travava sua espontaneidade. As
amigas se entreolharam, e Laura disse:
— Pelo que falou até
agora Selma, sua vida foi um processo continuo de repressão de sentimentos. Parece que esta faltando um pouco
de loucura na sua vida!
— Eu também acho! Disse
Mary.
As três riram, e
como já era tarde foram dormir.
Os dias passavam sempre
com alguma novidade que podia ser desde uma atividade artística de alguém ou
grupo de passageiros, até torneios de bridge, xadrez, canastra entre outros.
Não faltaram palestras oferecidas pelos próprios passageiros.
Um encontro
agradável para as duas amigas foi com o grupo de teatro que discutia o tema da peça que apresentariam aos passageiros. Ainda
não existia consenso, mas um casal de jovens propunha apresentar a famosa cena
do balcão de Romeu e Julieta. Deixaram a reunião no momento que se iniciava a
votação do grupo.
No dia seguinte no
café da manhã, elas tiveram uma surpresa: aquele avô de rosto sempre triste não
existia mais, tomava seu lugar um sorriso amplo, alegre e descontraído, algo ou
alguém era responsável por isso! Nesse momento chegou Selma e sentou-se com
elas perguntando:
— O que vocês estão
comentando?
— Olhe o senhor que
está com o menino. Ele está totalmente mudado, parece estar feliz! – espantou-se Mary.
— Graças a Deus -
disse Selma – ele é viúvo e um ano atrás perdeu seu filho e a nora num acidente
de aviação. Seu neto é agora quem dá sentido a sua vida.
Em quanto falavam
apareceu uma senhora dona de uma postura elegante e trazendo da mão uma linda
menina. O neto do viúvo correu e abraçou a menina com muito carinho e alegria. A
dama disse:
— Bom dia Mark,
descansou bem? Perguntou com um sorriso ligeiramente insinuante.
— Muito bem
Anastácia! Sonhar com uma mulher como você é como reencontrar o lado bonito da
vida!
Riram e continuaram
conversando enquanto as agora três amigas observavam e comentavam:
— Que acham vocês?
Perguntou Laura.
—Parece promissor!
Respondeu Mary.
—Muito promissor e
com final bem feliz! Confirmou Selma.
Uma semana antes de
acabar a viagem foi anunciada a apresentação dos jovens de teatro. Seria sobre a cena clássica
do balcão de Romeu e Julieta.
No dia do evento
Laura e Mary chegaram cedo e ocuparam dois lugares perto do palco improvisado
com um beliche decorado com originalidade e bom gosto. Começou o espetáculo no
meio de um silencio beirando o absoluto. Aos poucos foram emergindo as emoções
acompanhadas de lagrimas e soluços contidos.
Na sua fala final
Julieta disse:
Oh! Romeu, Romeu, por que razão és tu Romeu?
Quem
és tu que, encoberto pela noite, vens descobrir meu segredo?
Meu
receio é que sendo noite, isto não passe de um sono. (1)
Esse final liberou
uma explosão de aplausos, choros e alegria, os meninos não representaram, foram
mesmo Romeu e Julieta.
Na véspera da
chegada e arrumando as malas as amigas conversavam:
— Então Selma
decidiu assumir seu pretendente! Falou Laura.
— Sim, e me pareceu muito
feliz quando me apresentou Bernard, o engenheiro que trabalha para o Governo -
respondeu Mary – E parece que ira visitá-lo em Kansas.
Caminhando ao longo
do trem as duas amigas aproveitaram para os últimos contatos com as novas
amizades estabelecidas. Encontraram o casal que interpretou Romeu e Julieta e o
parabenizaram, os meninos de mãos dadas, estavam radiantes e felizes e longe
deste mundo.
O fim da viagem
causou nas amigas um pouco de tristeza, tinham vivido uma aventura tendo a
sensação de que o trem era especial e a viagem infinita:
— O que é bom acaba
né Laura? Comentou Mary.
— É verdade, porém
nossa amizade nos ajudará a manter vivas as lembranças que foram tão fortes e
especiais. Conto com você Mary?
— Com certeza minha
querida amiga.
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(1)
Inspirado nos
diálogos do filme “SHAKSPEARE APAXIONADO”
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