Um
dos meus tipos inesquecíveis
Fernando Braga
No passado, costumava ler
na Seleções Readers Digest, dentre os
contos, aquele que era chamado ¨o meu tipo inesquecível¨. Durante o decorrer
de nossas vidas, todos temos a lembrança de alguns personagens, que não
esquecemos, apesar do longo tempo decorrido.
Na minha adolescência, era
comum, os amigos, nos reunirmos no jardim central da cidade, onde, sentados nos
bancos, trocávamos ideias, falávamos de nosso futuro, de filmes, de futebol e
principalmente das meninas.
Em um banco de jardim, um
pouco distante, sempre, lá estava ele, um mendigo, esfarrapado, judiado
fisicamente, mas ainda moço, deitado no banco, com seu cão deitado no chão, um vira-lata
grande, certamente mestiço de pastor alemão. Vivia ele dos pequenos trocados
que os que por ali passavam, ocasionalmente, lhe davam. Quando ganhava um sanduíche, o que primeiro fazia, era repartir com o seu cachorro. A água, bebia
ele e o cão, da torneira próxima. Quando alguém se aproximava dele, o cão se
erguia, rosnava, mostrava os dentes e
Pinão tinha que afagá-lo e pedir para deitar-se.
Um dia, nos aproximamos e
sentamo-nos no banco ao lado para trocar algumas palavras com Pinão, que, neste
dia estava sóbrio ou meio sóbrio. Contou-nos um pouco de sua vida.
Disse:
— Sempre fui um pobre
coitado
— Sempre fui um miserável
— Sempre precisei da ajuda
dos outros
— Sempre morei na rua.
— Minha família,
praticamente não existiu. Não conheci meus pais. Não tenho pais, irmãos, amigos
e nunca tive mulher. Cheguei a trabalhar como ajudante de caminhão, mas após um
acidente fiquei manco e sem condições. Nunca mais consegui emprego. Comecei a
beber e a viver ao Deus dará.
Completou ele:
— Se sofrimento é comum
entre os homens
— Se sofrimento existe
para melhorarmos
— Se sofrimento é coisa de
Deus para nos ensinar a viver
— O meu sofrimento começou
faz tempo e não vai nunca terminar. São 38 anos de sofrimento!
Não tenho ninguém neste
mundo, a não ser Capeta, este cão a meu lado, amigo fiel.
— Nunca tive um lar, faz
anos que não deito em uma cama.
— Nunca tive nada, nada, nada...Me chamam de
bêbado e fogem de mim.
— Bebo porque sou muito
infeliz. Quando peço uma ajuda, poucos dão e a maioria me manda ir trabalhar. Outros
dizem que não ajudam bêbado.
Enfatizou:
— Bebo, porque sou muito
infeliz
— Bebo porque não tenho
nada melhor para fazer
— Bebo para esquecer que
estou vivo. E hoje, não fico mais sem a cachaça, a mardita cachaça. Seja o que
Deus quiser!
Continuou:
— Banho, tomo naquela
fonte luminosa quando, bem tarde, a praça fica vazia. Parte do dia percorro as
ruas e vou de casa em casa pedindo ajuda e às vezes me dão um prato de comida, que
divido com Capeta. Consigo algo, mais frequente, nas casas mais pobres. Os ricos,
nem abrem a porta para falar comigo.
Neste mesmo dia em estávamos
conversando, aproximou-se um rapaz que deu a ele uma nota de vinte, muito
dinheiro, mesmo para nós. Saímos todos juntos e perguntei por que ele havia
dado tanto!
Ele ressaltou:
— Dei porque não vai me
fazer falta e ele com 20 vai comprar tanta cachaça que vai se esquecer da vida!
Pouco tempo após, soubemos
que Pinão havia falecido deitado no banco de jardim e que para se aproximarem
dele tiveram que chamar o pelotão da polícia, para dominar o cachorro, que não
deixava ninguém se aproximar do morto. Nunca me esqueci!!
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