GABRIEL, O OPORTUNISTA. - Oswaldo U. Lopes


GABRIEL, O OPORTUNISTA.
Oswaldo U. Lopes

         Gabriel era jovem, completara 21 anos e tinha muitas ideias na cabeça. Nenhuma delas incluía faculdade, curso superior ou trabalho. Como muitos de sua geração e de sua classe, média alta, era individualista e pensava mais em si do que no mundo a sua volta.

         Tinha planos e se preparara com certo cuidado para eles. Concluíra o colegial meio que a duras penas, mas falava inglês como poucos, conversava bem e era alegre contador de casos e aventuras. O plano maior era viajar e conhecer o mundo. Talvez a família tivesse condições de ajudar, mas impunha seu preço, concluir um curso superior e preparar-se para a vida. Negativo, não era o que Gabriel desejava agora, pelo que munido de passaporte decidiu partir como diziam, nu com a mão no bolso.

         Já tinha ouvido falar que o melhor jeito de começar era empregando-se em um navio desses luxuosos que fazem cruzeiros norte-sul e leste-oeste. A companhia, dona do navio, cuidaria de seus vistos, entradas e saídas. Com seu modo brincalhão e falando um bom inglês, não foi difícil encontrar trabalho num desses navios bem grandes, Linha C.

         Lá se foi rumo ao norte com várias paradas pelo caminho, no próprio Brasil e no Caribe. O trabalho não era muito difícil, camareiro, arrumava cabines e corredores. Pela sua pouca experiência ficou trabalhando nas cabines menos pomposas, onde viajavam os de classe média, em geral marinheiros de primeira viagem. De pesado só o transporte de malas quando alguma das cabines chegava a seu destino, como aconteceu em Miami, por exemplo.

         Chegaram a Nova York para uma parada de alguns dias, a embarcação ainda deveria subir mais e aportar no Canadá. Gabriel achou que de barco já estava bom e desceu. Haviam lhe dito que pela Nova Inglaterra, Maine, New Hampshire era muito fácil andar,  inclusive entrar e sair do Canadá. Como não era rota frequente de hispânicos a vigilância era meio frouxa. Não deu outra! Trabalhando em motéis, restaurantes de beira de estrada, foi se aventurando. Já  era outono e as cores da Nova Inglaterra, bonitas demais. Andou pelo lago Chapelain, andou perto do Rio São Lourenço, entrou e saiu do Canadá um montão de vezes até que deu com os costados num hotel muito grande num lugar chamado Bretton Woods em New Hampshire.

         O Hotel chamava-se Mount Washington Hotel e ele achou curioso encontrar no saguão uma caixa, com tampa de vidro que continha inúmeras bandeiras entre elas a do Brasil. Uma placa aludia ao fato de ali ter-se realizado em julho de 1944, a conferência que deu origem ao FMI e ao BIRD, com representantes de muitos países, inclusive da Rússia. Gabriel tinha uma vaga ideia de datas e de guerras e aquilo lembrava a Segunda Guerra Mundial. Lembrava também de seu pai que quando jovem, era de uma geração mais participativa e costumava frequentar passeatas cujo mote era sempre: FORA FMI!

         Bem, às vezes viajar era mais instrutivo do que livros e salas de aula. O hotel era muito grande, mas não estava lotado.  Gabriel que trabalhava de camareiro e garçom logo reparou numa senhora de idade incerta, entre os 55 e os 65 anos, que também reparou nele. Mrs. Charlotte Louise Edwards. Tinha dinheiro em penca e o poder que o dinheiro confere. Logo, logo Gabriel era o camareiro pessoal e o único garçom a servi-la.

Não é difícil imaginar o resto, Gabriel era oportunista e agarrou a chance de imediato. Foi transformado em secretário particular e agora o dinheiro cuidava de seu passaporte. Mrs. Charlotte tinha um maravilhoso apartamento em Londres e ele agora era o secretário pessoal dela. Tinha por ela mais respeito do que pela própria família e começou a fazer cursos na London School of Economics. Escreveu para a família contando onde estava e o que esta estudando, para grande surpresa de todos, e omitiu é claro a dama inglesa.  Charlotte não era exigente e até admitia certas escapadas de Gabriel nas baladas londrinas.


         Bem, a história não termina aqui, mas o futuro é confuso e nublado. A diferença de idade é cruel, Gabriel era secretário e amante de Charlotte o que era muito conveniente no momento, mas e depois? O oportunismo de Gabriel dizia-lhe para aproveitar o agora sem pensar muito para frente, embora a frente estivesse quase ali...

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