OS TRÊS MOSQUETEIROS - Suzana da Cunha Lima


OS TRÊS MOSQUETEIROS
Suzana da Cunha Lima

Eram chalezinhos simples, com uma boa varanda à frente, olhando para a estrada de terra que levava à sede, onde ficavam  o refeitório, recepção e salas para recreação.  Havia uns oito iguais, pareciam casinhas de brinquedo espalhados num tapete verde, cercados de árvores e jardins, por onde corria livre a brisa suave, característica dos dias de outono.

Lá levei meus três netos, primos entre si, mais ou menos da mesma idade, numas férias inesquecíveis.  Jogamos bola, brincamos de pega-pega, de estátua, de pular corda, de amarelinha e de todas aquelas brincadeiras antigas, de minha própria infância.

No final do dia íamos tomar banho, mudar de roupa para jantar. Depois ainda esticávamos o dia, vendo um pouco de televisão ou jogando carteado. Mas era pouco tempo, o sono chegava cedo nos olhinhos deles, e assim voltávamos logo  para dormir.

Nesta hora, a escuridão cobria tudo, apenas o céu parecia um celeiro de estrelinhas piscando. Tínhamos que ter cuidado para não tropeçar em alguma pedrinha ou raiz, naquele pedaço da trilha. A gente só via a luzinha da varanda, brilhando como um farol em noite escura. Os meninos se agarravam comigo,  fazendo as perguntas mais engraçadas que já ouvi, para espantar o medão que tinham.

— Oi vó, tem mesmo bicho papão que come criança?

— Isso é conversa de gente ignorante.

— Mas,  a mamãe sempre fala que tem...

— É brincadeira dela, Marquinho, só para ver se você acredita nestas besteiras.

— E se aparece um ladrão por aqui, vó?

— Eu espanto ele, Robinho, não tem nada para ele roubar. E imagine se ele ia se atrever a nos assustar, estou com os três mosqueteiros, certo?

— Está escurão porque não penduraram ainda a lua no céu, não é, vó? Perguntava o menorzinho, com um fio de voz.

— Já penduraram sim, Andrezinho, mas as nuvens a cobriram  todinha. Daqui a pouco ela vai aparecer, bem brilhante no céu.

Nós dormíamos no mesmo quarto e todos tinham a sua caminha esperando, mas o ritual da hora de dormir era diferente para cada um.   Marquinho levava a foto da mãe e dormia com ela agarrada, Robinho ficava embaixo do lençol e nem sua cabeça aparecia, e Andrezinho se agarrava comigo. E depois que rezávamos, eles me pediam:

— Vó, deixa a gente dormir primeiro e depois você dorme, está bem?

— Podem deixar meninos, durmam em paz que vovó ainda vai ler este livro.

Eu nem chegava a passar uma página e eles já estavam todos ressonando, cansados de um dia cheio de brincadeiras.

Fizemos isso em três verões seguidos, sempre no mesmo chalé porque acho que um pouco de tradição na meninice é uma boa referência na vida adulta. Na última vez, porém, eu estava bem triste,  tinha acabado de perder meu marido. Quando nos ajeitamos para dormir, naquela noite, não consegui segurar as lágrimas, que deslizavam silenciosas pelo meu rosto.  Foi quando Andrezinho percebeu e me perguntou:

— Você está com saudade do vovô, não é, vó? Eu o abracei, concordando.

—  Estou sim, Andrezinho, foram muitos anos juntos, sabe?

— Ah, vó não precisa chorar não.  Minha mãe disse que o vô foi para o céu.

— Eu sei, meu menino, mas o céu é tão longe, não é? Eu queria tanto conversar um pouquinho com ele, saber como ele está...


— Ah, mas isso a gente sabe, vó.  Mamãe disse que ele está melhor do que a gente aqui. O céu é um lugar bonito, você vai ver quando for para lá.


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