TRAGÉDIA CAIPIRA - Carlos Cedano


TRAGÉDIA CAIPIRA 
Carlos Cedano

Naquela noite João o bagageiro, e seu capataz Remígio, foram os últimos a levantar da mesa. Dirigiram-se para seu quarto enquanto Santinha, a empregada da pousada, deixava pronta a mesa para o café da manhã. Antes de dormirem, e ainda sem muito sono aproveitaram para ter “um dedinho mais de prosa”:

         — Rapaz esquisito esse filho da dona da pousada. Ele só fica em silêncio, observando, sem nunca olhar nos olhos dos outros - disse João.

— E não tirava os olhos da bolsa de dona Lucília - completou Remígio. Falando já de outras coisas.

E aos poucos ambos dormiram.

Mas, de repente:

— Acorda, acorda Remígio! – Enquanto João sacudia seu capataz.

— Que foi? - Perguntou meio acordado e assustado.

— Escuta, meu amigo! - sussurrou João colocando o dedo nos lábios e apontando para o quarto ao lado, ocupado por Dona Lucília. Em silêncio, puderam ouvir rugidos abafados e ofegantes, davam a sensação de que alguém se debatia.

— Remígio, vai ver o que esta acontecendo - ordenou João – E leva o lampião.

Sem hesitar Remígio foi até o quarto da hospede, forçou a porta que abriu facilmente, e o que ele que viu o paralisou por alguns segundos. Refez-se, e percebeu a figura do filho da proprietária no momento em que soltava um corpo que caiu inerte pelo chão. O capataz aproximou o lampião e reconheceu o corpo da dona:

         — O quê que você fez, desgraçado?! Matou sua própria mãe! - Gritando fortemente e cheio da raiva, Remígio, que também tremia, continuou:

— Você é um assassino, filho desumano!

— Eu não quis matá-la – gritou o jovem – Algo dentro de mim foi mais forte e não pude evitar - continuou a lamentar-se o matricida pálido e trêmulo.

João, Dona Lucília e Santinha chegaram ao mesmo tempo, e contemplaram atônitos por alguns minutos,  o cenário do crime. Foi nesse momento que Dona Lucília se deu conta de que em realidade, a morta deveria ter sido ela.

— Foi um milagre ter trocado de quarto com a dona da pousada! - Gritou eufórica.

O criminoso continuava a gritar dizendo: Não fui eu! Não fui eu! Foi o demônio de dentro de mim!


Mas, nenhuma lágrima assomava em seus olhos.

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