Encontro inesperado ou A amiga
da onça
Ises A. Abrahamsohn
‒ Tenho uma surpresa pra você! segredou Olga assim que me abriu a porta. E
mais não disse, mesmo quando insisti.
Na sala vi que
conhecia todos os convidados. A conversa girou sobre os assuntos de sempre:
política, filmes, os últimos desastres e algumas fofocas inocentes. Estava meio
alheia, pensando no que minha amiga de muitos anos teria preparado.
Íamos nos
servir do caprichado almoço quando a campainha tocou. Um convidado atrasado. Quando
o vi fiquei paralisada. Uma sensação estranha de aperto no estômago me subia
pela garganta. Não quero que ele me
veja assim perturbada meu Deus, preciso me controlar por que Olga enche as paredes
com esses quadros escuros? lá está ela, sorrindo por que o convidou? como
estou? este vestido me cai bem azul, combina com meus olhos poderia ser mais
justo que bobagem para que?
Ele me viu. Vem para cá. Me reconheceu coragem Lia ombros para trás
mamãe dizia porte de princesa vem sorrindo, o mesmo sorriso cativante de há
trinta anos tenho que controlar
o meu nervosismo. Ele me estende
a mão. Não vou deixar que me dê
os beijinhos de praxe...
— Olá Renato, há quanto tempo... Consigo dizer com voz normal enquanto
aperto-lhe a mão de modo eficiente e burocrático. Não sabia que estava de volta
ao Brasil.
Olhou-me nos
olhos e retrucou:
— Vim para ficar, chega de me sentir exilado, tenho saudades de tudo aqui
inclusive de você. Conto-lhe tudo durante o almoço, disse o sedutor enquanto me
segurava o braço na tentativa de me guiar para uma mesa no terraço.
Eu não esperava
um ataque tão rápido. Conhecia as táticas. O olhar insinuante, a intimidade invasiva,
o movimento das mãos... Ainda era atraente aos cinquenta anos. Me esquivei com
a desculpa de lavar as mãos.
No lavabo
recuperei o controle. Ele ainda me perturbava, mas não como antes. Eu o
adorava, íamos nos casar em três meses e estudar na França. Me lembro bem do
bilhete covarde que deixou. Dizia apenas: “Desculpe, Lia. Embarco hoje para a
Austrália com a Marion. Foi bom enquanto durou”.
Olga estava
ocupada com os convidados. Uma das copeiras me abriu a porta. Andei rápido até
o carro.
Meu marido
estranhou:
— Voltou tão cedo...
— Não me senti bem, acho que foi o vinho. Demorou demais. Nem comi nada.
Depois ligo para a Olga.
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