A
MULA QUE NÃO ERA BURRA
Oswaldo Romano
Depois
da jornada na lavoura de algodão do pai, eu tomava o rumo de casa.
Preparava
o animal para regressar à cidade. Montava a Rola, a mais bonita e uma das mais
inteligentes mulas que já tivemos.
Nesse
dia foram duas surpresas. Hoje conto uma.
Quando
saía da casa da colônia, casa de pau a pique, que ficava praticamente no meio
da plantação do algodão a mula titubeou seguir. Dava alguns passos e estancava.
Ai
quem parou para pensar fui eu: o que fiz de errado, o que está faltando? Ela
não é disso! Fiquei aí, pensando, vendido. Estaria ofendida comigo...
O
tio Artur, administrador da plantação, aguardando a saída, me olhava e dava de
ombros. Por duas vezes. Também não entendia.
Fazer
o que? - Desmontei do robusto animal. A acariciei como sempre fazia, roçando
minha face em seu rosto, dando-lhe duas três palmadinhas.
Imagina se cutucasse com as
esporas, e ela burra não entendesse a mensagem. Podia, revoltada, empinar e me
jogar no chão. Ainda, limpando a área, soltaria o costumeiro estampido e o coice.
Difícil de acontecer porque somos amigos, mas tudo tem a primeira vez, imagine
com burros.
De
novo, sem falar nada, pensei: está tudo em ordem... aí lembrei, a barrigueira,
é isso!
—Tio,
folgue as barrigueiras, veja se alguma coisa a incomoda, talvez debaixo das
selas.
O tio soltou as fivelas e foi dizendo:
—Wado,
tá tudo em ordem.
—Tio,
o que será que está acontecendo. Vamos esfriar a cabeça, enquanto isso por
favor, tô com sede, pegue um caneco d’água.
Quando eu tomava água a Rola, num
esforço, virando o pescoço olhou para mim, seus olhos brilhavam de vontade.
Mesmo com dificuldade pois, o tapa olho atrapalhava.
Na hora o tio matou a
charada. Voltou-se rápido, alcançou e encheu um balde de água.
Enquanto isso, tirei o freio, livrando
sua boca.
Quando chegou a água, com três quatro
sugadas o deixou vazio.
A
tia Áliche, com seu vestidinho de chita quase roçando o chão, aparecendo o pé
descalço, assistia. Assistia impávida a
tudo, enquanto via eu partir. Virou-se para o tio:
—
Mama mia. Porque deu minha água da manhã pra coitada. Era pra lavar a louça com
ela. Podia pegar uma fresquinha...
—
Tá bene. Vou no poço, te puxo outra!
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