MOMENTO
QUE ANTECEDEU A FAMA.
Mario Augusto Machado Pinto
Examinava os mínimos detalhes da cena
que havia terminado de pintar há alguns dias, agora exposta nessa vernissage em
Etienne.
As pessoas ao redor olharam surpresas
quando ele exclamou em alto e bom som: Merde,
alors c’est finie!
Elas não entendiam, mas ele sim, ahn,
e como!
Olhando fixamente a tela durante algum
tempo sentia que faltava alguma coisa. Logo percebeu o que era.
Veremos,
veremos. Ainda pode esperar, pensou.
E lembrou-se quando tudo começou:
estava posando nua no atelier de esculturas do amigo Terence. Seu corpo começou
a se mexer como que o chamando para ficar ao seu lado na bergére. O desejo de
ambos ficou tão evidente que Terence gritou:
Não,
Não. Agora não. Mais tarde? Talvez.
Desse dia em diante ficaram amigos e
amantes, além de artista e modelo.
Algo o desagradava: a impontualidade
crônica. Combinavam dia e hora para trabalhar e ela, com muita frequência, enviava
seu criado jamaicano avisar que não viria. O pior é que o aviso geralmente era
dado no dia seguinte, mas os passeios pelos seus Alpes e Canyons compensavam a
espera.
Certo dia chegou no horário e pediu
para posar com um vestido novo, no seu dizer, maravilhoso, de seda, de um
verde-azul brilhante que ela trazia numa caixa enorme. Queria muito a companhia
de um casal amigo pintado junto com ela na tela, o da foto.
Deixo
aqui. É para não andar com essa caixa toda vez que vier posar. Tchau, amore!
Veio algumas vezes no horário
combinado, mas faltava tanto que perdendo a paciência, Terence disse que ela
não precisava mais vir. O vestido estaria lá. Mais alguns dias e terminaria a
pintura. Podia vir no próximo domingo.
Não veio e avisou que iria viajar e,
na volta, passaria para comemorar o término do quadro. Isso o deixou aborrecidíssimo.
Resolveu
pintar outra cena: um casal de idade olhando para fora da tela e ela à frente
deles, conversando, pintada a parte detrás do vestido, um chapéu alto e o
rosto, de perfil, voltado à esquerda para um salão lotado. É a hora do chá. A
impressão é a de alguém procurando uma pessoa, ele o próprio, rosto pintado em
cores no meio da multidão.
Ela
não apareceu.
Ai resolveu
tomar uma atitude: mudar o titulo do quadro.
Assim
pensado, assim feito na calada da noite da véspera da premiação. Contou com a ajuda
do porteiro.
Até
hoje não sabe se ganhou Menção Honrosa pela pintura ou pelo titulo diferente da
obra:"Você viu esta mulher? Não me avise".
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