O PECADO DA COBIÇA - Maria Luiza Malina



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O PECADO DA COBIÇA
Maria Luiza Malina

Moro no vale da Vila Madalena. Da noite para o dia mais e mais prédios surgem. O trânsito cada vez mais caótico. Resolvi que venderia minha casa, e junto é claro, o meu jardim dos beija flores. Plantei flores específicas para eles.
Tudo bem. Passei a observar a vida dos que moram no alto das montanhas, uma luz que pisca outra que apaga, depois mais tarde tudo se torna um breu. Todos dormem e eu o único a fazer hora tomando a fresca no jardim noturno ouvindo música com poucas luzes esverdeadas clareando a vegetação – amo tudo isso, repetia para mesmo – e o que fui fazer no dia seguinte? Oras!  Que se me tivessem quebrado as pernas, ou ser atropelado, nunca poderia ter feito uma coisa destas.
Fui visitar os apartamentos que estavam à venda, enlouqueci com as alturas de cada um. Podia admirar a vida lá de cima, assim como os vizinhos deveriam fazer em cima do meu jardim – o pecado da cobiça, inveja, sei lá mais o quê, mas que eu queria morar lá, isso eu queria, afinal, tudo moderno “uma vida clean” como sugeria a vendedora. Não tive dúvidas, lá fui eu tratar com a incorporadora.
Em uma semana de correria lá estava eu instalado entre quatro paredes do mais alto do prédio – era a cobertura master – acho que foi a palavra master, a vilã que me assediou. Olhava para baixo e via meu jardim com as folhas amareladas, a grama enorme, os passarinhos cruzavam de um canto ao outro e, as folhas caindo num amontoado a me chamar; justo era outono. Comecei a ficar ansioso, poderia ter comprado em outro local, mas eu queria ainda olhar o jardim como se fosse meu. Ninguém aparecia para limpá-lo. A sensação de abandono tomou conta de mim como uma bofetada. A sacada do apartamento tornou-se menos ampla e eu a cada dia menos e mais menos. Suspirei no inverno, me debati na primavera, chorei no verão.
Resolvi viajar. As águas de março estavam por quase todo o país fertilizando a terra. Estava na Europa e as notícias de inundações chegavam a cada instante. Fiquei desesperado! Como estaria meu jardim? Será que venderam a casa. Voltei. Quase um ano depois lá estava o matagal, ninguém havia entrado; será que esqueceram do investimento? Fui atrás disso aí.
Fui recebido com um grande abraço e uma pergunta:
— Quer destroçar a cobertura pela casa?
Respondi com um longo abraço de obrigado.


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