NÃO VIU O QUE VIU
Jeremias Moreira
Súbito,
um possante ruído de motor, que crescia a uma velocidade espantosa, quebrou o
silêncio da noite. Da curva próxima surgiram dois fortes faróis que iluminaram
a estrada com tamanha intensidade. O BMW passou como um bólido. Logo mais à
frente, ouviu-se o ruído desesperado de uma freada... o guincho da derrapagem,
e... sclatchbum... bum... tchbum... a espetacular capotada. O carro rodou pela
ribanceira sobre seu próprio eixo longitudinal antes de explodir e
transformar-se num inferno de chamas.
Bel
conhecia a fama de irresponsável de Bebeto. Mesmo assim, contrariou os
conselhos do pai e foi até o fim com o casamento.
No
dia que entrou na igreja, toda de branco, com um séquito de damas de honra, acreditou
ser aquele o grandioso momento de sua vida. Nunca imaginou o viria pela frente.
Já
na estrada, a caminho da lua de mel, dirigindo o BMW que o pai emprestara, teve
que repreender Bebeto, diversas vezes, por se drogar sem parar. Sentia um amor
obsessivo por ele e desculpava suas loucuras que atribuía à falta de
maturidade. Achava que ele fora excessivamente mimado pelos pais. Acreditava
conseguir colocá-lo na linha. No entanto, não se dava conta de que repetia exatamente
o mesmo erro.
Mais
tarde, na chegada ao Hotel, aborreceu-se ao se deparar com os casais Duda e
Lilica, Zeca e Tininha, amigos de Bebeto, dos quais ela não gostava.
Possessa,
contrariou seu temperamento e soltou os cachorros.
Cabeça
fresca, com Bebeto bronca e nada é a mesma coisa. Ele não esquenta com nada.
−
Take easy baby! Eles vieram curtir
nossa felicidade com a gente, amoreco!
Os
dias seguintes foram infernais. Mal humorada, Bel discutia o tempo todo com ele
e manteve-se ríspida com os amigos. Quase sempre saia sozinha, pois os cinco se
drogavam o tempo todo.
No
terceiro dia, à tarde, Bel foi à piscina, na volta não encontrou o marido. Esperou até tarde e nada! Então, desceu para
jantar sozinha.
Retornou
e nada do Bebeto. Ele havia evaporado!
Da
suíte dos amigos, ao lado, vinha o som de um rock pauleira em alto volume. Bel
foi até lá, tocou a capainha, ninguém atendeu. Tentou a maçaneta e a porta
abriu.
Chocada,
se deparou com uma cena que a estarreceu. Um emaranhado de corpos entregues a
uma fantástica orgia, de dar inveja a Dolmancé e Madame
de Saint´Ange.
Sentiu
náuseas. Com o juízo fervendo, completamente atordoada, saiu dali. Quando deu por
si estava ao volante do BMW.
“Como
sou cretina! Como fui acreditar que salvaria Bebeto da sua loucura? Quero sumir... voltar... vou para casa dos meus pais... Por
que não ouvi meu pai? Vou anular esse casamento! Por que não ouvi meu pai?”
Uma
densa neblina assentava sobre a região.
Cega
de ódio, olhos marejados, sem se dar conta imprimia velocidade ao carro. Chegou
à estrada e tomou o rumo de casa. Logo à frente o trecho sinuoso. Dirigia agora a uma velocidade
espantosa. Entrou na primeira curva e
sentiu o carro pender para esquerda. Tratou de corrigir, mas logo em seguida,
nova curva. Tentou frear e o carro lhe escapou. Cometeu o erro de frear mais
forte. As rodas travaram, o BMW derrapou, bateu na mureta e saltou espetacularmente.
Entrou em parafuso girando sobre o próprio eixo. Tocou no solo e girou mais
vezes barranco abaixo até parar, emborcado com as rodas para cima.
Logo
depois a explosão e a seguir, o som ardido das chamas que consumiram o carro.
Enquanto
isso, na suíte nupcial, escondido dentro do closet, onde se metera em plena
crise alucinógena, Bebeto despertou do estupor, abriu a porta e chamou por Bel.
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