O
larapio iniciante
Fernando Braga
Nós o conhecíamos desde os 8 anos. Rapaz forte agora aos 14, filho
de nosso empregado no sítio. Tinha duas irmãs mais velhas, seus pais eram
ótimos, além de excelentes empregados. Confiança extrema! Moravam em uma casa
nova, que havíamos construído para eles e que ficava a próxima à entrada do
sitio.
Após viagem demorada, sempre
que chegávamos ao nosso sítio era uma verdadeira alegria. Tudo em ordem, a “casa
antiga” um primor, a grama bem cortada, os cachorros bem cuidados, o feijão com
aquele gosto inigualável, diferente. Havíamos construído dois chalés a uns cem
metros da sede, próximo ao lago maior, onde gostávamos de dormir e sempre com
dois cachorros soltos.
Várias vezes, começamos a
notar falta de algum dinheiro, quando na viajem de volta, íamos fazendo as
contas de tudo o que havíamos gasto naqueles dias, em supermercados, açougue,
jantares, pagamento de contas, gasolina, etc.
Certo dia aconteceu um
fato que nos prendeu a atenção. Eu fui buscar as varas de pescar, que ficavam em
um canto do banheiro no chalé de cima, que estava ocupado por meu filho, e sua
família. Quando estava saindo, chegou meu filho, que voltava da pequena vila. Disse
ele:
— Pai, que estranho! Quando
fui pagar minha conta na Vila, não tinha dinheiro em minha carteira. Sumiram
uns 300 reais! Será que o dinheiro caiu em algum lugar onde que paramos?
Brinquei com ele:
— Estou saindo de seu
quarto, mas não tenho nada com isto!
— Sabe pai, isto não é a
primeira vez que acontece. Quando vim com um amigo para cá, há uns dois meses, na
volta, ele disse também, sentir falta de dinheiro, uns 250 reais.
— Você tem certeza? - perguntei
eu, e sua esposa confirmou.
— Acabei me esquecendo de
falar com o senhor. Agora, o fato se repete!
Se havia algum furto, quem poderia ser? A
empregada, seu marido? Impossível! Eram de extrema confiança. Zica, uma moça,
que quando estávamos em número maior de pessoas, vinha ajudar? Também não. Como
não tínhamos certeza de nada, esquecíamos, achando que havíamos feito gastos, os
quais não lembrávamos.
Cogitei comigo mesmo: “Vou investigar. Vou preparar uma armadilha.”
No dia seguinte, tinha que
ir à cidade vizinha, e como sempre fazia, convidei Marcelo para ir comigo. No
caminho, parei para abastecer o automóvel. Peguei a carteira, paguei em
dinheiro, mostrando que, as notas de maior valor ficavam em um compartimento
mais escondido. Ao retirar o dinheiro, ele olhava de soslaio e tive certeza de que
observara o esconderijo. Eu já suspeitava dele, e com aquele olhar tornou-se
para mim o principal, talvez o único, suspeito, Confidenciei à minha mulher:-
Na próxima vez vou apanhar o ladrãozinho.
Após duas semanas chegamos
novamente ao sítio e na manhã seguinte, contei exatamente o que continha na
carteira, incluindo no compartimento especial e fomos até a sede para tomarmos
o desjejum. Sentei-me em uma posição que dava para observar as entradas e
saídas da casa do caseiro e logo observei o menino saindo em direção ao chalé. Ele
viu que estávamos indo para a sede. Após nos alimentarmos fomos calmamente de
volta ao chalé. Peguei minha carteira e fui conferir o que restara, tinha
certeza de que o furto havia sido perpetrado. Nas divisões da carteira faltavam
apenas 20 reais, mas do compartimento mais escondido, havia sido retirados 400.
Minha mulher, que de tudo
participou, perguntou:
— E agora, o que fazemos?
— Vamos falar com o
ladrãozinho, retruquei.
Fomos até a casa do
caseiro e lá encontramos o rapaz. Chamei-o para fora e fomos os três para um
local mais distante para conversar.
— Marcelo! Primeiro você
vai devolver imediatamente o dinheiro que você roubou. Desconcertado, mas sem
negar nada, ele foi busca-lo e nos entregou. E o resto, que você vem roubando
sistematicamente, inclusive do meu filho, do amigo dele.
— Não posso devolver,
porque já gastei. - respondeu chorosamente.
— Agora, vamos comunicar o
acontecido para sua mãe e seu pai.
— Pelo amor de Deus,
doutor, tudo, menos contar para o meu pai, ele vai me matar.
Dissemos a ele:
— Você percebeu a gravidade
do ato que fez? Você, com uma besteira desta, colocou em risco o bem estar de
sua família, o emprego de seu pai, podia ser levado para prestar declarações à polícia.
Ele chorava copiosamente e dizia
— Doutor, eu juro que
nunca mais vou repetir esta besteira. Me perdoe!
Falamos com sua mãe, que
ficou passada e percebeu a fraqueza de seu filho. Pedimos a ela que não falasse
com o marido. Ela foi imediatamente falar com Marcelo e logo depois, seu pai tomava
conhecimento do fato. O que aconteceu em sua casa, não soubemos. Eles perceberam
a gravidade da situação sobre o “mau procedimento” de seu filho. Tranquilizamos
os pais, dissemos que nada iria mudar entre nós e que precisávamos arrumar um
psicanalista, para tratar do menino. Assim foi feito e decidimos, a conselho do
médico, pagar apenas a metade do tratamento, das sessões de análise, para que
Marcelo sentisse na pele ao ver seus pais, gastando aquela importância, que
sempre fazia falta, em seu tratamento.
Passados seis anos, hoje
ele é um moço bem estruturado, com emprego, com medo de errar. Todos esperamos,
ardentemente, que continue assim, longe das drogas, de companhias perniciosas,
do desejo de se apoderar do alheio, o que é bastante comum em nossos dias.
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