VOAR?
É TRANQUILO.
Mario Augusto
Machado Pinto
Os passageiros sofriam com a pressurização.
Os ouvidos zuniam. De súbito a aeronave subia e descia, provocando fortes
solavancos. Uns aflitos apertavam de maneira insistente o botão de chamada da
comissária. Outros rezavam, parecia. Mas, ele gargalhava.
Era cômico e ao mesmo tempo trágico ver e
participar desse momento que mesmo os mais experientes em viagens aéreas
imaginavam ter sério perigo à vista.
Um passageiro imóvel em sua poltrona fazia
sinais como quem perguntava: que passa,
que há de tão engraçado? O outro respondia fazendo o gesto de positivo com
o polegar.
Quando se ajustava aos solavancos seu
jeitão parecia o dos peões de boiadeiro. Com uma das mãos segurava-se na poltrona
qual carrapato e girando o outro braço no ar, gritava: “aiô brinco, aiô” e ria-
se convulsivamente.
Largou-se da poltrona, jogou-se sobre um
homem caído que na hora deu-lhe um safanão: Sai
pra lá; tá pensando o que?
Malas caiam sobre os passageiros. Sanduíches
voavam por toda parte jogando fatias de queijo e salames nas suas faces. Marmitas
saiam das gavetas do carrinho esparramando o molho do peixe a Saint Peter.
Formava-se o caos.
Uma mulher gritava:
Tira
a mão daí, sai pra lá, não empurra.
Quero
pegar minha peruca!
No meio dessa confusão aquele senhor estava
estático, feições amareladas, mãos trêmulas, olhos piscando sem parar dizendo:
Vou
fazer, vou fazer!
E o do lado gritava: Não, não, agora não; espera mais um pouco!
Não é
nada disso, sua besta! Faço anos amanhã e tenho festa marcada! Pelo visto não
vou comer o bolo!
Nesse instante a coisa piorou: um garoto
chutava bola de futebol no corredor e gritava à moda de locutor esportivo:
— 7 a 2! Gol! 7 a 3! Gol!
Não sei como o menino arrumou a bola nessa
fuzarca toda.
A bola rebateu no teto e ao cair deu com
violência no traseiro de uma comissária que virou e caiu com as pernas para o ar.
E ai entendi porque todas têm bum-bum igual. Elas vestem cinta calça até os
joelhos.
O menino, de tanto rir rolou no chão. E o
boiadeiro batendo palmas, continuou gargalhando, mais ainda. A comissária
levantou-se bamboleante, quebrou o salto do sapato e andando feito pato manco,
sumiu da cabine.
Um senhor saiu do banheiro. Como conseguiu
ficar lá? Foi gingando pelo corredor, caiu
de cara nas pernas de uma jovem: Seu tarado!
Sai pra lá! E o coitado foi caindo, caindo até que resolveu se deitar no
corredor e ali ficou.
O avião deu uma virada pra esquerda,
mergulhou de bico, deu pra ver o chão meio cor de cenoura do deserto.
Nesse instante uma senhora com um terço na
mão gritou: Quero um padre, um padre pra me
confessar. Dulcídio, meu querido, Você perdoa meu namoro com o Chagas? Naquela barulheira toda ainda deu para ouvir o
estalo da bofetada e a resposta: Com a
sua dentadura Você vai ter que comer milho cozido na espiga! O Dulcídio até
que foi bem-educado; podia ter dito outra coisa.
Aqueles namorados, abraçados, indiferentes
a tudo que acontecia ainda se beijavam. Ah, o amor, o amor...
Aí o piloto conseguiu nivelar o avião que
imediatamente deixou de chacoalhar. A cabine era um caos, tinha coisa espalhada
pra todo lado, tinha até uma taça com sorvete!
Pouso em Vegas. Os passageiros saindo de
mansinho, o garoto chutando a bola pra longe lá na pista.
Aquele passageiro ainda gargalhava, agora
dizendo: Olha, olha, eu molhei as
calças!!!
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