CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - Pesquisado por Ledice Pereira

 


Carlos Drummond de Andrade

Pesquisa por Ledice Pereira


 

No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

tinha uma pedra

no meio do caminho tinha uma pedra.

 

Nunca me esquecerei desse acontecimento

na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

no meio do caminho tinha uma pedra.

 

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, Minas Gerais, no dia 31 de outubro de 1902. 

Foi um dos maiores poetas brasileiros do século XX. Nono filho de Carlos de Paula Andrade e Julieta Augusta Drummond, desde jovem demonstrou interesse pela literatura. Em 1919 foi expulso do Colégio Anchieta, em Nova Friburgo, devido a "insubordinação mental". Em 1925, formou-se em Farmácia pela Escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte, mas nunca exerceu a profissão, optando por seguir a carreira literária. 

Iniciou sua trajetória literária, publicando artigos no Diário de Minas e, em 1928, ganhou notoriedade com seu poema "No Meio do Caminho", que escandalizou a crítica. Lançou sua obra de estreia, "Alguma Poesia", em 1930, e rapidamente se consolidou como uma figura central no modernismo brasileiro. Durante sua carreira, Drummond explorou temas como a solidão, o amor, a injustiça social e a identidade. Sua escrita era marcada por uma ironia sutil e um lirismo profundo. 

É conhecido por sua poesia que mistura reflexões individuais e críticas sociais, utilizando um verso livre predominante. Seu estilo reflete uma preocupação com o cotidiano e com a condição humana, frequentemente abordando questões existenciais. Além da poesia, ele também escreveu contos e crônicas, contribuindo amplamente para a literatura brasileira. Entre seus livros mais importantes estão "A Rosa do Povo" (1945) e "Sentimento do Mundo" (1940), que capturam o espírito de sua época e suas preocupações sociais. 

Destacou-se também como tradutor, trazendo clássicos da literatura mundial para o português e estabelecendo-se como uma voz influente na cultura brasileira. Seu trabalho é essencial para entender a literatura contemporânea do Brasil.

Em 1925, casou-se com Dolores Dutra de Morais e teve dois filhos, Maria Julieta e Carlos Flávio que viveu apenas meia hora (e a quem é dedicado o poema "O que viveu meia hora"). Carlos Drummond de Andrade faleceu no Rio de Janeiro em 17 de agosto de 1987, apenas dez dias após a morte de sua única filha, a escritora Maria Julieta Drummond de Andrade, uma perda que deixou marcas profundas.  deixando uma obra literária com mais de 40 títulos, sendo reverenciado até hoje, com várias estátuas em sua homenagem, incluindo a famosa "O Pensador" em Copacabana.                 

Poeta da Segunda Geração Modernista, ou a maior figura da “Geração de 30”, embora tenha escrito ótimos contos e crônicas, Carlos Drummond se destacou como poeta.

A poesia publicada durante a Segunda Geração Modernista foi essencialmente uma poesia de questionamento em torno da existência humana, do sentimento de estar no mundo, das inquietações sociais, religiosa, filosófica e amorosa. Drummond é o poeta que melhor representa essa geração.

Seu estilo poético é permeado por traços de ironia, observações do cotidiano, de pessimismo diante da vida e de humor. Drummond fazia verdadeiros "retratos existenciais" e os transformava em poemas com maestria.                                                                                  

Alguns poemas conhecidos

E agora, José? 

A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, 

e agora, José?

(Expressa a angústia existencial e a solidão)

 

Eu te amo porque te amo. 

Amor é estado de graça 

e com amor não se paga.

(É um dos poemas mais delicados e profundos sobre o sentimento amoroso)

 

 

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo

que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,

que não amava ninguém.

João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,

Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,

Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes

que não tinha entrado na história.

 

Na obra Lição de Coisas (1962), o poeta é tomado pela poesia nominal, muito próxima da filosófica, em cuja linguagem, o verso e a palavra são desintegrados com o uso constante de neologismos, alienações e rupturas sintáticas que se aproximam do Concretismo, embora o poeta não tenha admitido. Os versos a seguir mostram essa orientação:

 

O árvore a mar
o doce de pássaro
a passa de pêsame
o cio da poesia
a força do destino

A pátria a saciedade
o cudelume Ulalume
o zumzum de Zeus
o bômbix
o ptys

 

Obras de Carlos Drummond

Poesias

  • Alguma Poesia (1930)
  • Brejo das Almas (1934)
  • Sentimento do Mundo (1940)
  • Poesias (1942)
  • A Rosa do Povo (1945)
  • Poesia até Agora (1948)
  • Claro Enigma (1951)
  • Viola de Bolso (1952)
  • Fazendeiro do Ar & Poesia Até Agora (1953)
  • Poemas (1959)
  • A Vida Passada a Limpo (1959)
  • Lições de Coisas (1962)
  • Boitempo (1968)
  • Menino Antigo (1973)
  • As Impurezas do Branco (1973)
  • Discurso da Primavera e Outras Sombras (1978)
  • O Corpo (1984)
  • Amar se Aprende Amando (1985)

Prosas

  • Confissões de Minas (1942)
  • Contos de Aprendiz (1951)
  • Passeios na Ilha (1952)
  • Cadeira de Balanço (1970)
  • Moça Deitada na Grama (1987)

 

De trens e Trilhos - Ises de Almeida Abrahamsohn

 




De trens e Trilhos
Ises de Almeida Abrahamsohn 

 

Adoro viajar de trem. Podem ser os trens-bala, devorando paisagens a 300 km/hora, com nossos olhos captando imagens fugidias como num filme acelerado. São os campeões, orgulhosos de seus nomes próprios: Shinkansen, TGV, Eurostar, Railjet. Lembram enormes torpedos deslizando sobre trilhos.

Porém, não me incomodo e até prefiro viajar naqueles mais lentos, regionais, de paradas frequentes. Como turista, me permitem observar os campos, os animais nas pastagens e as pessoas que entram ou saem nas estações. São os frequentados pelas famílias que repartem as merendas de sanduíches econômicos trazidos de casa e as garrafas térmicas.

Enfim, tenho atração nostálgica por esses trens anônimos que me permitem a ilusão de um tempo a se desenrolar mais vagaroso antes de chegar ao destino.

Estava sentada à janela do comboio Porto-Lisboa. Não era o mais rápido, quatro horas, mas não me importava. Queria aproveitar ao máximo o final das férias antes do longo voo de volta ao meu país. Na tarde ensolarada de maio, me encantavam os quintais das casas ao longo da via férrea com suas pequenas hortas e aglomerados de flores: rosas de todos os tons, dálias, margaridas e jasmins avançando pelas paredes e telhados. De quando em quando, um túnel sob árvores dava vez a campos de cereais ainda a crescer.

Faltava ainda cerca de uma hora até a estação de Santa Apolónia. Ouviu-se o trem subitamente desacelerar com rangidos de freios e parar. Ao lado, um campo verde a perder de vista. Os passageiros se agitavam. As pessoas perguntavam umas às outras a causa da parada; outras, mais preocupadas com o possível atraso, reclamavam da falta de informação. E ainda outras, habituadas ao trajeto, filosoficamente informavam que avarias no sistema elétrico não eram raras naquela linha. Passados uns vinte minutos, ainda não tínhamos nenhuma informação. Ouviam-se conversas aos celulares avisando do atraso na chegada. Até que um passageiro, mais irritado, resolveu sair do trem para investigar o problema técnico informado. O funcionário tentou barrar-lhe a saída, o que apenas serviu para dois jovens também descerem para os trilhos. Após uns minutos, um dos jovens, visivelmente perturbado e pálido, anunciou:

  Foi um suicídio. Estão a esperar a perícia para remover o corpo.
E ali ficamos a esperar, ouvindo as notícias fragmentadas que um ou outro que descia aos trilhos trazia.

Era jovem. Um rapaz, segundo informou o policial, não lhe vi o rosto. Não aguentaria.
Parece que este trecho é o preferido dos suicidas — disse outro.
— Parte das pernas e um bra
ço ficaram presos nas rodas traseiras. A perícia tem que recolher todos os fragmentos, informou outro, logo rechaçado com várias exclamações do tipo: “Cale-se, homem, não precisamos desses detalhes escabrosos.”
E ali ficamos cerca de três horas até os carros de polícia e ambulâncias se afastarem e o trem retomar o percurso.

Ainda gosto muito de viajar de trem. Agora, quando olho os trilhos correndo ao lado, lembro do jovem suicida. Que grau de desespero o levou a esse gesto? É a mesma pergunta que se faz ao saber sobre um suicídio, não importam as circunstâncias.

 

Caminhos e Descaminhos - Yara Mourão






Caminhos e Descaminhos

Yara Mourão



Eu já era encantada com meu professor de literatura.

Mas quando ele mostrou as duas gravuras para nosso trabalho, falando baixo com sua voz aveludada e profunda, eu acabei por me apaixonar de vez…

São duas estradas, dizia ele, que divergem na partida; escolher uma ou outra terá causado ao viajante toda a diferença, ainda que levem ao mesmo destino”.

As gravuras na parede me entravam pelos olhos e se abrigavam no meu peito. Eu contemplava a linha do trem cortando a mata na penumbra, enquanto me embalava nos sussurros que o professor entoava, à guisa de um vento que zunisse por entre as árvores do caminho.

Ele tinha os gestos de um patriarca, pausados e longos, que envolviam o olhar e o pensamento de todos, levando nossa imaginação a se perder por cenários imaginários.

Distraído e imprevisto, nos levava a admirar a correnteza do rio ao largo da linha do trem. Ele assinalava essa beleza dizendo: “A correnteza do rio é como o amante insensível que inverte o rumo das águas e chicoteia suas margens frágeis como se elas fossem suas tristes amadas…” E nessas metáforas inusitadas eu me perdia…

Pelo que conheço de instabilidades, achei melhor escolher a linha do trem. É mais sólida e previsível. Como um casamento. E sempre há uma parada no meio do caminho. Just in case. Porém, se eu fosse mais ousada, escolheria o rio, porque as águas, poderosas e ruidosas, têm a essência da paixão que corre sem que nada a segure.

Continuando, o professor dizia que na largura e profundidade dos rios as águas se moldavam ao leito e seguiam continuamente sem chance de retorno.

Ah! Os caminhos!

Seguiam-se os minutos, na parede, o trem não passava e o rio não fluía. E o meu trabalho não saía. Mas meu coração pulsava, meus olhos se perdiam pelo rosto, pelas mãos do professor, para sempre uma inspiração feliz e uma paixão adormecida pelos descaminhos de nossa vida literária…


AMOR DE MENTIRA - Antonia Marchesin Gonçalves

 



AMOR DE MENTIRA

Antonia Marchesin Gonçalves

 

             Rafael, CEO de uma grande empresa multinacional, sério e muito competente, sendo bem-conceituado, solicitou para a gerente do RH que selecionasse alguém, precisava de uma ajuda no comando. Feita a seleção, após quinze dias, foi apresentado para a Mariana, que, segundo o gerente, preenchia todos os requisitos para o cargo.

             Durante o primeiro mês, Rafael se surpreendeu com a competência e presteza dela, assumindo o seu lugar e com boa vontade fazia tudo que lhes solicitavam e logo alguns meses depois tomava a frente sozinha, assim menos trabalho para ele. A partir daí, a cumplicidade profissional era evidente, tudo decidido em parceria, as responsabilidades tinham tamanha afinidade e com isso melhoravam o conceito na empresa. Sai ganhando com a aquisição, pensava Rafael.

             Com isso, passavam muitas horas juntos, até ouvia muita reclamação da esposa de que ele estava casado com a empresa e não tinha tempo para a família, gerando brigas entre o casal. Ele não se deu conta de que não era só o trabalho que o fazia ficar até tarde na empresa e sim porque gostava da companhia de Mariana. Ela, por sua vez, já percebendo que o caminho estava indo para o sentimento pessoal, começou a jogar o seu charme, tinha consciência de que ele já estava em suas mãos.

             Jogou o laço bem laçado e começaram a se encontrar fora da empresa. Sabia ela mais uma coisa, era norma de empresa a proibição de relacionamentos entre funcionários, principalmente cargos de chefia. Com isso, Rafael, já apaixonado, entrou com o pedido de divórcio, confiando na reciprocidade de sentimento por parte de Mariana. Mal sabia ele que o interesse era se tornar a CEO da empresa no lugar dele e subir na carreira mais que ele, o achando sem ambição, um banana. Era assim que o considerava.

             Montou uma estratégia para que a Diretoria do Conselho Superior ficasse sabendo que ela sofria assédio dele e se sentia pressionada. Como ele confiava nela, foi deixando tudo sob o seu controle, ela usou isso para mostrar que tinha a total competência para o cargo. Certo dia, numa reunião de diretoria, o presidente, para a surpresa de Rafael, agradeceu pelos anos de dedicação dele pela empresa e ele estava dispensado, e Mariana assumiria o seu lugar. O mundo caiu sobre ele. Saiu da sala numa total confusão mental. Esperou se recuperar e foi à sala dela pedir uma explicação. Encontrou-a arrumando suas coisas para se transferir para a sala dele, nem esperou que ele tirasse suas coisas, o olhou com o olhar não de amor como sempre, mas sim um olhar de desprezo e falou: a fila anda, querido. 

Saiu batendo a porta. 

ROMA NÃO FOI FEITA EM UM DIA - Sergio Dalla Vecchia



           


   

ROMA NÃO FOI FEITA EM UM DIA

Sergio Dalla Vecchia

 

A cliente do engenheiro contratou-o para construir uma mansão em um condomínio badalado no interior de São Paulo.

O engenheiro, feliz pelo bom contrato, com entusiasmo deu início às obras. Plantas em mãos, cronograma a cumprir e mãos à obra!

Acontece que, no decorrer da construção, a cliente, do nada, mudava a concepção do projeto. Derruba aqui, acrescenta ali, eu quero assim, sou a dona e pronto! Não me importo com seus argumentos, dizia para o engenheiro. No entanto, todas essas alterações influenciaram no cronograma, fazendo com que ele não pudesse ser cumprido como o esperado.

Mesmo assim, o resignado profissional foi levando a convivência até o limite de sua ética. Até que certo dia, ao ser cobrado pelo atraso do cronograma pelas tantas modificações, perdeu a paciência e convicto, retrucou para a cliente:

— Senhora, até Roma não foi construída em um dia e o dono da obra era nada mais nada menos do que o imperador. E a senhora, quem pensa que é?

Virou as costas e saiu deixando um enganoso bom negócio para trás.

Virão outros melhores, pensou com seus botões.

 


CIO DA POESIA - Sergio Dalla Vecchia

 



 CIO DA POESIA

(Homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade)

 

Ao ar letras flutuam

Palavras as atraem

Versos se alinham

 

Rimas encandecem

Pipocam hormônios

Estrofes   florescem

 

Fecundada a poesia

Gestação com amor

Nasce um trovador!

 

 

Sergio Dalla Vecchia

ÓCIO - Sergio Dalla Vecchia

  



ÓCIO

Sergio Dalla Vecchia

 

Certo domingo acinzentado, vez ou outra soprava um vento frio que ratificava o final de outono.

Desfrutando um lapso de individualidade, lá estava eu acomodado na cadeira de praia, sem nenhum dos familiares fugidos dos vinte e dois graus Celsius.

As ondas assediadas pelo vento explodiam uma após outra bem à minha frente, separadas somente por uma pequena faixa de areia. Não eram grandes, mas suficientes para abraçarem minha ociosidade.

Empolgado pela coreografia das pessoas que desfilavam pela pequena faixa de praia, invoquei abracadabra e me transformei em uma câmera fotográfica.

Ajustei-me na posição automática de velocidade, diafragma, luz, etc.

O primeiro clic registrou a adolescência na forma de três biquínis coloridos andando descontraídos em risadinhas e trejeitos típicos.

O segundo disparo marcou um casal, ela aquecendo-se envolvida pelos próprios braços e ele com as mãos para trás, pensando já na segunda-feira.

O terceiro notou duas senhoras em prosa tão animada que não estavam nem aí com a temperatura, o assunto era quente.

O quarto se compadeceu da expressão desolada do vendedor de sorvetes, empurrando o carrinho pesado de mercadoria, que não seria vendida.

Continuei clicando as mais diversas impressões até que culminou com a passagem de um senhor alto e longilíneo. Desfilava em marcha batida, passos largos, braços soltos, olhar altivo e protegido com um belo chapéu panamá. Era o retrato do sucesso, resolvido e independente!

E, com o impacto da última imagem, terminei meus registros e voltei a ser eu mesmo.

Levantei-me, calcei as sandálias e parti para casa, marchando em passos largos, braços soltos, altivo e protegido pelo meu inseparável boné.

Assim, continuarei seguindo a marcha vitoriosa almejando a troca do meu querido boné por um panamá, era só o que me faltava!

 

Por aí. - Oswaldo U. Lopes

 



Por aí.

Oswaldo U. Lopes

 

         Regina estava fazendo o que mais gosta, guiando o carro, por aí, meio sem destino e ouvindo música popular brasileira antiga. Sem destino, ficava mais no inconsciente, gostava de guiar carro por aí, mesmo sabendo que ia para casa da filha. Música popular brasileira antiga era mais correta. Tinha dezenas de pendrives perfeitamente identificados que acoplava ao rádio do carro.

Um pequenino grão de areia.

Que era um pobre sonhador.

Olhou no céu, viu uma estrela.

Imaginou coisas de amor.

       Essa fazia parte do lote marcha rancho, como Bandeira Branca e tantas outras cuja história estava ligada ao Desfile das Grandes Sociedades. Tivera oportunidade de assistir a esse tipo de desfile no Rio de Janeiro, quando eles aconteciam na Av. Getúlio Vargas. Candelária numa ponta e o imponente Ministério da Guerra na outra.

       Parou de pensar por aí, ia acabar revelando a idade. Devia ser um cuidadoso ajuntamento dos dois x nos cromossomas, dava uma mistura ótima, muito bonita, mas que se recusava a entregar a idade até para a polícia. Quantas vezes dissera a idade, quando inquerida, na base dos trinta e poucos, sessenta e poucos e por aí ia.

 

Passaram anos, muitos anos.

Ela no céu, ele no mar.

Dizem que nunca o pobrezinho,

Pode com ela se encontrar.

 

Adorava essa música e conhecia os autores de cor e salteado:

Marino Pinto e Paulo Soledade.

Paulo era dado nos fichários e currículos como aviador. Ele de fato era, mas voara na PAN AIR, daí chamá-lo de comandante, no mínimo, era mais justo. Fazia parte de um grupo de boêmios que incluía Sergio Porto, o famoso Stanislaw Ponte Preta, dos FBAPA (Festival de Besteira que Assola o País), Carlos Niemeyer, Pignatari e outros que se auto chamavam “Clube dos Cafajestes”. Era difícil associar Cafajestes com Pequeno Grão de Areia, mas era como queriam ser conhecidos em Copacabana e adjacências.

Há pouco tempo descobrira que no Havaí, na universidade local, os caras calcularam quantos grãos de areia havia na terra. Esse interesse devia ser porque, em qualquer direção que você andasse, no Havaí, você encontrava areia. Bem, lá vai: haveria na terra 7,5 quintilhões de grãos de areia. Não dá nem para imaginar, isso é 7,5 × 10 ^18 zeros. E as estrelas, então, quem calculou foram os da Universidade de Cambridge e o número é ainda maior: 1 × 10 ^22 zeros.

Com tantos grãos de areia e tantas estrelas no mar, nossa história ganha outro contorno. Era difícil mesmo o grão de areia com a estrela se encontrar, mas a estrela-do-mar continua com sua origem misteriosa.

Se houve ou se não houve,

Alguma coisa entre eles dois

Ninguém soube até hoje explicar

Mas a verdade é que depois, muito depois

Apareceu a estrela-do-mar.