AMAVA OS CACHORROS! JÁ OS HOMENS...- Jeremias Moreira


AMAVA OS CACHORROS! JÁ OS HOMENS...
Jeremias Moreira

O catalão Ramón Mercarder assassinou Leon Trotski!
O belga Jacques Mornard assassinou Leon Trotski!
O canadense Frank Jacson assassinou Leon Trotski!
Então, os três assassinaram Leon Trotski?

Não, apenas Ramón Mercader! Os outros eram identidades que Ramón adotou para sair da Europa logo que estourou a segunda guerra mundial e, via Estados Unidos, entrar no México e se aproximar de Trotski.

Esta terrível história é brilhantemente contada por Leonardo Paduro no romance “O homem que amava os cachorros”.

Através de um narrador fictício, o livro decorre em três momentos: o primeiro se concentra no exílio de Trotski e sua peregrinação pela Turquia, Noruega e México após ser expulso da União Soviética; o segundo conta o engajamento de Ramón Mercarder na luta contra Franco, durante a guerra civil espanhola; o seu recrutamento pelo NKVD, o serviço de espionagem soviético; o seu treinamento e preparação para a investida contra Trotski; e a consumação do fato, no México, em 1940; e o terceiro, o encontro, em Cuba, da época da guerra fria, entre o personagem fictício, escritor cubano Ivan Cardenas, o narrador, com o enigmático espanhol Jaime Lopez, que depois saberemos tratar-se de mais um codinome de Ramon Mercader, já na velhice.

É através dos relatos de Jaime que Ivan se embrenha na história e, mais tarde, a narra.

Trotski e Lenin foram as figuras proeminentes da Revolução Bolchevista de 1917. Mas,  é Stalin quem ascende ao poder, em meio a uma acirrada disputa, após a morte de Lenin, e dá início a uma era de terror. Persegue e elimina muitos dos seus antigos companheiros. Desterra Trotski e o declara o inimigo numero um da Revolução do Povo. Usa esse bordão para inflamar e incutir a aversão dos soviéticos por ele. Nesse clima de extremo ódio à Trotski que se dá o treinamento de Mercader.

A essa altura, Moscou já decretara a sentença de morte do proscrito, mas não deveria sujar as mãos. Nada melhor que um militante estrangeiro que, em último caso, poderia se passar por um fanático agindo isoladamente.

Como Jaques Mornard, Ramón consegue a amizade de Sylvia Agelof, secretária de Trotski, e através dela se encontra com ele sob o pretexto de ser um patrocinador canadense de suas ideias.

No dia 20 de agosto de 1940, no escritório da sua casa, Mercader feriu Trotski mortalmente na cabeça com um piolet (pequena picareta de alpinismo).

Trotsky, antes de morrer, impediu que seus seguranças matassem Ramón:

Não o matem! Este homem tem uma história a contar. − teria dito.
Mercader foi preso e, mesmo sob tortura, nunca revelou sua real identidade e manteve-se fiel a Moscou. Foi condenado por assassinato e sentenciado a cumprir 20 anos de prisão no presídio Lecumberri, na Cidade do México.

Solto, em maio de 1960, mudou-se para Havana, onde foi acolhido por Fidel Castro.

Sob a identidade de Jaime Lopes, num de seus passeios com seus cães Dax e Ix, numa praia de Havana, encontra-se casualmente com Ivan Cardenas, que também gostava de cachorros. São nesses encontros que Jaime conta a história de Ramón Mercader. A certa altura dos relatos, Ivan percebe que, para Jaime saber tantos detalhes sobre a  vida de Ramón, eles só poderiam ser a mesma pessoa.  

E, através de Ivan, Pagura nos leva a relatos inquietantes de episódios críticos da historia mundial. Episódios onde ruiram sonhos e abundaram atrocidades. Ao fim e ao cabo, Ramón Mercader foi algoz de Trotski e, ao mesmo tempo, vítima de um regime de terror e de mentiras que o fez acreditar que lutava por uma sociedade mais justa.

Se pensarmos bem, a história teima em se repetir. Nos dias de hoje qual governo  não espalha mentiras, a torto e a direito, com a promessa de um mundo melhor? 



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