MONSENHOR PARAGUAÇU
Oswaldo
U. Lopes
Monsenhor Anacleto Paraguaçu já tinha
idade, não tinha era prestigio, provavelmente fora essa a razão dele ser
designado como pároco da pequena Mato Seco. Falava empolado, com citações as
mais complicadas, usando e abusando de palavras difíceis, ou mesmo inexistentes
no vocabulário, de sua livre criação.
Havia gente que o julgava parente do
famoso Odorico Paraguaçu, coronel e prefeito da linda Sucupira (criação do
insuperável Dias Gomes). De fato Monsenhor adorava criar palavras e neologismos
meio malucos, mas não o fazia a todo momento e toda hora. Era nos sermões de
domingo que ele se superava e deitava falação.
—
Estamos hoje aqui celebrando a visita dos Majestáticos e Podenentíssimos
Reiarcos, vindos do Oriente para cá, nesta bela cidatosquia que fica a oriente
de Oriente.
De fato Mato Seco ficava a leste
(oriente) da cidade de Oriente, maior e muito mais conhecida do que Gramínea
não hidratolada (era como monsenhor designava Mato Seco).
Alias tudo ajudava a confusão. Oriente,
Mato Seco deviam sua existência ao avanço das Estradas de Ferro Paulista que se
deu no fim do século XIX, inicio do século XX. Muitos da região asseguravam
que, por exemplo, o nome de Oriente, dado a cidade, advinha do fato dela estar
a leste do Rio Grande. Nisso não estava sozinha, também estavam a leste do rio,
Mato Seco, Lins, Marilia, Pompeia e todo estado de São Paulo.
Havia
os mais prosaicos, Oriente devia seu nome ao fato da Companhia Paulista de
Estradas de Ferro, nomear suas estações em ordem alfabética, e ali chegara a
vez do O. Aí os mais afoitos viam o nome de Pompéia na sequência como prova
irrefutável do afirmado. Dedução furada,
Pompéia devia seu nome à esposa do senador Rodolfo Miranda que se chamava:
Aretuza Pompeia.
Bem com este cenário, Monsenhor
Anacleto se encaixava que nem peça de quebra-cabeças nos arranjos caipiras e no
estilo típico de vangloriações que tanto caracterizam o viver nas pequenas
cidades do interior paulista.
Vai
daí que, mulieribus, pecatorium, batisterimo, crucificatorium etc. eram
palavras repetidas e respeitadas.
Tudo seguiria em paz na
pacata e progressista Gramínea Enxuta e a vida seria blulacea, riderenturi e
franconade, não fosse pela existência do Joãozinho, moleque manjado, que junto
com a Mariazinha, menina também manjada, bolou um plano espetaculosium e baixou
no iPhone um programa tipo dicionário e munido dele sentou-se embaixo do
púlpito.
Monsenhor Anselmo, ignorantibus do
planejadoviche iniciou seu típico sermão da quaresma. Só que agora depois de
cada palavra estranha que ele proferia, ouvia-se claramente uma voz potente:
— Essa
palavra não existe.
E bota potente nisso, ouvia-se até fora
da Igreja. Monsenhor começou pedindo silêncio usando algumas palavras típicas
de sua lavra e o que se ouvia, contradizendo o pedido, era o terrível:
— Essa
palavra não existe.
Monsenhor desceu do púlpito disposto a
estraçalhar o desafortunado. Joãozinho que não era boco, mandou-se para a
entrada da Igreja, com seu maldito instrumento ainda funcionando. Monsenhor
deveras injuriado correu-lhe atrás e assim corriam pela cidade, ele vociferando
e o iPhone esbravejando:
— Essa
palavra não existe.
GLOSSÁRIO
SE NECESSÁRIO (pela ordem de aparecença)
Podenentissimos
– poderosos
Reiarcos
– reis
Cidatosquia
– cidade
Hidratolada
– molhada
Mulieribus
– mulheres
Pecatorium
– pecadores
Batisterimo
– batismo
Cricificatorium
– crucificação
Blulacea
– azul
Riderenturi
– risonha
Franconade
– franca
Espetaculosium
– espetacular
Ignorantibus
– ignorante
Planejadoviche - planejado
ötimo! gostei muito, Oswaldo.
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