PEDACINHOS COLORIDOS DE SAUDADE - Ledice Pereira



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PEDACINHOS COLORIDOS DE SAUDADE
Ledice Pereira

Ao constatar que o Carnaval se aproximava, Natália sentiu-se triste e nostálgica.
Quantos teriam sido os carnavais em que rasgara a fantasia?

Dez, vinte, quem sabe mais.

Fora uma foliona incansável. E isso começou ainda quando criança nos bailinhos do clube, acompanhada dos pais, dos tios e da cidade inteira. Àquela época, morava em Paranapiacaba, cidadezinha colonizada por ingleses, responsáveis pela construção da ferrovia São Paulo Railway, que ligava a cidade de Santos a Jundiaí. A maioria da população trabalhava na Estrada de Ferro e morava nas casas construídas também pelos ingleses numa arquitetura diferenciada.

O ponto alto era o clube União Lira Serrana, palco das festividades de carnaval, réveillon e domingueiras que reunia toda a comunidade.

Quantas recordações povoavam a cabeça grisalha de Natália.

Quantas ilusões vividas sob o batuque das bandinhas musicais que animavam os bailinhos de então.

Promessas de amor que duravam apenas aquelas noites de carnaval e que depois se perdiam durante a quaresma para nunca mais ouvir falar.

É verdade que a esperança a alimentava durante alguns meses para depois aceitar a desilusão.

Ao mudar-se da cidade para São Paulo, já com idade de frequentar os bailes e corsos carnavalescos, Natália continuou com sua fascinação pelas festividades de Momo.

Não perdia um ensaio de Escola de Samba e até passou a frequentar uma quadra da Mocidade Alegre, que ficava perto de sua casa. Lá, conseguiu seu primeiro emprego aos dezoito anos. Costureira de mão cheia, arte que aprendera com a mãe, foi contratada para confeccionar as fantasias que seriam usadas no próximo desfile.

Dedicou-se tanto que foi convidada a desfilar pela escola como destaque, cuja fantasia teria que produzir.

Ao atravessar a passarela, Natália mal podia acreditar que estava ali naquele momento mágico, participando de toda aquela alegria festiva, ao ritmo contagiante da bateria.

Lá, encontrou aquele que foi o amor de sua vida, Mestre-Sala Fernandinho.

Durante doze anos, viveu aquele sonho de amor. Mas o sonho acabou e Fernandinho apaixonou-se perdidamente pela porta-bandeira da escola, uma linda jovem de vinte anos.

Para Natália ficou apenas a lembrança de momentos maravilhosos vividos. A proximidade do casal, entretanto, obrigou-a a afastar-se dali.

Continuou costurando para sobreviver, mas nunca mais seus olhos brilharam como dois faroletes. Tornaram-se opacos e tristes, o que não a impediram de, a cada ano, reviver os carnavais passados.

Hoje, só lhe resta ligar a TV e acompanhar os desfiles, até que o sono implacável venha cerrar-lhe os olhos e, quem sabe, levá-la a sonhos inimagináveis repletos de pedacinhos coloridos de confetes.


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