Sabor da infância
Ledice
Pereira
Parecia mentira que eu estivesse novamente em Águas da Prata, lugar onde
passara tantas férias.
Longos e distantes quinze anos se distanciavam da última vez que ali
estive com aquela tia tão querida. A casa ficava a quinze minutos da cidade.
A viagem custou mais tempo do que o normal, tão saudosa e eufórica eu
estava.
O cheiro da cozinha da tia Felícia foi até a porteira me encontrar. De
lá mesmo gritei: cheguei! E de imediato
pude ver os cães se alvoroçarem em minha direção esbarrando-se uns nos outros.
Logo atrás vinham as crianças em traje de banho gritando de alegria e a tia
Felícia que acenava feliz:
─ Oba, chegou na hora do almoço. Fiz rocambole de carne com legumes, que
você tanto gostava.
Ela não havia esquecido. Querida tia Felícia! Estava igual. O cabelo mais
pintado de branco e o corpo um pouco curvado. Mas o carinho e a alegria eram os
mesmos.
Abracei-a demoradamente.
─ Que saudade, tia. Há quanto tempo! Quem são essas lindas crianças?
Fiquei sabendo que eram filhos de uma vizinha. Ela cuidava deles
enquanto a mãe trabalhava dando aulas na escola municipal e, em troca, ganhava
uns trocados que completavam sua aposentadoria. Recebia também a pensão de tio
Miguel, falecido há quatro anos.
Assim ela ia tocando a vida. Cuidava da chácara, fazia doces por
encomenda. Às vezes uma torta aqui, um bolo ali, enfim.
Lavei as mãos e sentei-me à mesa já posta. As crianças grudadas em mim
não perdiam uma vírgula da nossa conversa.
O temperinho da tia Felícia era uma delícia. Relembrei dos velhos tempos
e comi além do que deveria.
Conversamos muito ali sentadas enquanto as crianças se entretinham com
um filme na TV.
Depois de saborearmos aquele café que só ela sabia fazer fomos para a
varanda onde continuamos nosso papo.
Ela queria saber tudo. Se eu estava namorando, se tinha terminado os
estudos, o que andava fazendo?
Ficou surpresa quando soube que eu estava trabalhando há mais de um ano
num escritório de advocacia. E que me formaria no próximo ano em Direito.
Aquele fim de semana foi muito proveitoso. Vi fotos antigas, soube
notícias do resto da família. Comi frutas que eu mesma colhi. Chorei
relembrando minha infância tão bem vivida.
Quando chegou a hora de voltar tive vontade de ali ficar, aninhada nos
braços de tia Felícia, mas meu trabalho me aguardava na segunda-feira.
Entretanto, prometi voltar em breve. E é isso que quero fazer mesmo. Jamais
passarei tanto tempo longe de todo aquele carinho.
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