PRÓLOGO
Suzana
da Cunha Lima
Ficou ali olhando, como
se não entendesse nada, o corpo submerso num mar de sangue.
Ele tinha feito aquilo?
Uau! Pensou. Sentiu-se poderoso como há muito tempo não sentia. Agora eles iam
ver quem ele era realmente! Ah, iam ver mesmo!
Saiu rapidamente da
sala, tomando cuidado para não esbarrar em nada. Pensou o que iria fazer com a arma ainda em
sua mão. Limpou-a na toalha do lavatório
e aproveitou para passar uma água no rosto.
Tornou-se mais apresentável. Suas roupas
estavam inacreditavelmente limpas, apesar da sangueira lá na classe. Examinou os sapatos. Infelizmente estavam
respingados de sangue, teria que descartá-los e logo, porque sangue coagula,
fica seco e difícil de limpar. Usou papel higiênico para uma limpeza
superficial até que chegasse em casa e pudesse trocá-los. Saiu silenciosamente
pelo lado da quadra, e logo estava na calçada.. Foi caminhando evitando olhar
de um lado para o outro, para não parecer culpado. Ele não era culpado de nada!
Quem havia mandado o professor zombar dele e da sua roupa, como se fosse um
qualquer?
Agora aquela cambada ia
saber quem era Apolinario Nogueira, o cotista como chamavam. Fazia parte da quota de negros e era esta a
razão de o desprezarem. Tinha que dar um fim à arma e jogá-la no mar
pareceu-lhe a melhor solução. Subiu a
trilha do Leme e atirou-a nas ondas em ressaca. Pegou um ônibus para voltar
para casa. Chegou tranquilo, foi à cozinha comer algo. A mãe estava fazendo um bolo e perguntou-lhe
se já havia almoçado. Havia recados da escola para ele. – O professor está
pedindo que você devolva a pistola cenográfica o mais rápido possível. Tem ensaio geral da peça hoje e vão precisar.
– suspirou olhando para o filho – Ele me disse que você descarregou a pistola
inteirinha nele, quase se afoga no meio de tanta tinta.
- Tinta? Como tinta?
Não era sangue então?
Sentou-se cambaleante,
sentindo-se o último dos homens. Não
havia matado o professor, afinal. Continuava o mesmo palerma de sempre.
Muito boa a sua história. Me pegou. Grande abraço. Ledice Pereira
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