NASRA e NANÁ. - MÁRIO AUSTO MACHADO PINTO.

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NASRA e NANÁ.
MÁRIO AUSTO MACHADO PINTO.

Vida tranquila com tudo que é necessário para tanto, Nasra - é meu nome - estou cada vez mais irrequieta, respondona e ranzinza. Apesar de pensar no que estou me transformando – numa chata - não consigo encontrar a causa. Enquanto penso nisso ouço meu nome ser chamado. É a minha mãe que não é minha mãe. Eu sei, mas ela não sabe que eu sei. Talvez isso seja o porquê dessa inquietação que me consome. Essa coisa de ficar escondendo... Até quando? Se falar sei que vão dizer que é loucura, coisa ouvida na escola, dita por pessoas más só por ter cor diferente de pele, clara, mas manchada. Não é. Basta me olhar no espelho e comparar o meu com o rosto deles. Devido meus sete anos (conta de mentiroso) acham que eu ainda não faço isso: pensar, comparar, preferir. Meu bolo preferido é de chocolate. Situação difícil. Ás vezes sinto só eu, ninguém mais, gozado, né? Tomo consciência de uma fala - Nasra, Nasra filha querida, venha, vamos dar um volta até o parque. Aí você poderá conhecer e brincar com outras crianças, rever suas coleguinhas da escola. Vamos, vá, não seja turrona. Ela tem esse jeito de dizer as coisas.

Aceito o convite apesar de não ser dos melhores; vou me distrair, ver e pensar coisas diferentes, nada a ver com os locais e ambientes de nossa casa. Não aguento mais ficar naquele espaço limitado, quero correr, ver outras coisas, brincar de cheirar, cheirar, é, cheirar, aumentar minha coleção de cheiros. É tão gostoso...É coleciono cheiros, e daí?

Hoje o parque está limpo, pintaram as cercas, cheira bem bom, mas tem sempre as mesmas galinhas, passarinhos, coelhinhos. Aqueles bichos que sobem nas arvores como chamam mesmo? Sinto um cheiro diferente, é por aqui, por aqui – Nasra, não precisa correr. Os bichos não vão fugir - diz minha mãe. Ela não sente, por isso não sabe. Eu conheço esse cheiro; é novo, mas conheço ele, despertou no meu nariz, arrepia minha pele, muda meu jeito de correr.

É aqui, aqui. Não tem...apareceu. É um cachorro, não, cachorra, olha os 3 filhotinhos. Chegam perto da grade com tela. Estico meu braço e toco na cabeça da cachorra e esfrego devagar, de leve, ela ronrona. Minha cabeça diz que ela fala que me conhece desde quando era bebê e brincávamos rolando na terra, correndo, mordendo, latindo; ela era minha preferida, eu falava com ela, nos entendíamos. – Por que foi embora? Pergunta olhando pra mim.  Falo, rosnando, que me levaram; agora estou aqui e você quando chegou? Nossa! estou rosnando e sabendo o que falo? É isso? Santo deus! – Antes de parir, responde. E rosnamos, rosnamos baixinho.

As pessoas passam e me veem passando a mão no pescoço dela; ouvindo nosso rosnado baixinho, comentam – Filho, olha ela como faz com a cachorrinha, viu? Ela não tem medo, e sorriem pra mim.

— Vou dar leite pros meus filhos diz ela e já volto. – Espera, qual mesmo seu nome? Esquecí. – Me chamam de Naná. O seu eu lembro: Nara.  Ai digo que é Nasra e ela responde que sabe. É que tem dificuldade em dizer os “esses”. Até. – Até. Nos veremos, e lá se foi ela. Estou tão contente. Agora tenho minha amiga de volta. Virei mais vezes ao parque.

— Nasra, está na hora de voltarmos. Vi que Você brincou com a cachorra bastante tempo. Gostou? Pergunta a “mami”.

— Sim, gostei mais da cachorra. Ela se chama Naná.

— Essas crianças! Como sabe?


— Ela me disse.              

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