Alma Minha Gentil, Que Te Partiste - Soneto de Luís Vaz de Camões

 

ALMA MINHA GENTIL, QUE TE PARTISTE
Luíz Vaz de Camões





Alma minha gentil, que te partiste
tão cedo desta vida descontente,
repousa lá no Céu eternamente,
e viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
memória desta vida se consente,
não te esqueças daquele amor ardente
que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer te
algüa causa a dor que me ficou
da mágoa, sem remédio, de perder te,

roga a Deus, que teus anos encurtou,
que tão cedo de cá me leve a ver te,
quão cedo de meus olhos te levou.



Soneto dedicado a sua amada, a chinesa chamada Dinamene. Camões, segundo a lenda, estava de viagem a Macau, na China, quando seu navio naufragou. Indeciso, sem saber se salvaria a noiva ou a obra épica “Os Lusíadas”, o jovem poeta optou pela narrativa clássica. Com remorso, escreveu este soneto com base antitética: ela, um anjo celestial; ele, um homem ímpio, vivendo encarnado, só. Outra vez vê-se a temática neoplatônica: o homem é impuro e a mulher perfeita. Por fim, ele pede que ela interceda junto a Deus, para que este o leve a vê-la, dada a extensão de seu amor.


Veja este e outros tantos sonetos de Camões.


Abaixo temos o soneto cantado lindamente  em ritmo de fado.



Biografia de Luís de Camões

Luís de Camões (1524-1580) foi um poeta português. Autor do poema Os Lusíadas, uma das obras mais importantes da literatura portuguesa, que celebra os feitos marítimos e guerreiros de Portugal. É o maior representante do Classicismo Português.

Nascimento e Juventude

Luís Vaz de Camões nasceu em Lisboa, Portugal, por volta de 1524. Era filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá e Macedo, aparentada com a casa de Vimioso, da alta nobreza portuguesa, e sobrinho de D. Bento de Camões, cônego da Igreja de Santa Cruz de Coimbra.

Em 1527, durante uma epidemia de Peste, em Lisboa, D. João III e a corte transferiram-se para Coimbra, e Simão, a mulher e o filho, com apenas três anos, acompanharam o rei.

Luís de Camões viveu sua infância na época das grandes descobertas marítimas e também no início do Classicismo em Portugal. Foi aluno do colégio do convento de Santa Maria. Tornando-se um profundo conhecedor de história, geografia e literatura.

Em 1537, D. João III transferiu a Universidade de Lisboa para Coimbra. Camões iniciou o curso de Teologia, mas levava uma vida irrequieta, desordeira, além da fama de conquistador, mostrando pouca vocação para a Igreja.

O Poeta e o Soldado

Em 1544, com 20 anos, deixou as aulas de teologia e ingressou no curso de filosofia. Já era conhecido como poeta. Nessa época, compôs uma elegia à Paixão de Cristo, que ofereceu a seu tio. Seus versos revelam que ele estudou os clássicos da Antiguidade e os humanistas italianos.

Em 1544, com 20 anos, encontra-se com D. Catarina de Ataíde, dama da rainha D. Catarina da Áustria, esposa de D. João III e, desse encontro nasce uma ardente paixão, mais tarde imortalizada pelo poeta, que se referia à dama do paço, com o anagrama “Natércia”.

Nessa época, a intelectualidade nacional era incentivada, sobressaindo-se escritores, pensadores e poetas, como Sá de Miranda e o próprio Camões.

Em um sarau, seguido de um torneio poético, o espanhol Juan Ramon, sobrinho de um professor da Universidade, sentiu-se ofendido por causa dos versos de Camões.

Seguiu-se um duelo e o espanhol saiu ferido, o que terminou na prisão do poeta, sob o protesto dos estudantes. No final de muitas discussões, Camões é perdoado, com a condição de ser desterrado durante um ano em Lisboa.

Na capital, os versos do poeta eram apreciados pelas damas da corte. Era perseguido por outros poetas, sendo vítima de muitas intrigas para desprestigiá-lo e afastá-lo da corte. Para fugir das perseguições, em 1547, Camões resolve embarcar, como soldado, para a África. Serviu dois anos em Ceuta. Combateu contra os mouros e durante uma briga perdeu o olho direito.

Em 1549, Luís de Camões retorna para Lisboa e entrega-se a uma vida desregrada. Em 1553, envolve-se em novo incidente, ferindo um empregado do paço. Foi preso e permaneceu um ano encarcerado.

Nessa época, inspirado nas conquistas ultramarinas, nas viagens por mares desconhecidos, na descoberta de novas terras e no encontro com costumes diferentes, escreve o primeiro canto de sua imortal poesia épica, Os Lusíadas.

Posto em Liberdade, em 1554, Camões embarca para as Índias. Esteve em Goa, e toma parte de várias outras expedições militares.

Camões
Camões - Retrato pintado em Goa (1581)

É nomeado provedor em Macau, na China e durante sua estada aí, escreveu mais 6 contos de seu poema épico. Em 1556, parte novamente para Goa, mas sua embarcação naufraga na foz do rio Nekong.

Camões consegue se salvar nadando, levando consigo os originais dos Lusíadas. Chegando a Goa, é preso novamente em consequência de novas intrigas. Ali recebeu a notícia da morte prematura de D. Catarina de Ataíde.

Os Lusíadas

Em 1569, Camões resolve voltar para Portugal e embarca na nau Santa Fé, levando consigo um escravo, que lhe acompanhou até seus últimos dias. Chega a Cascais em 7 de abril de 1570. Depois de 16 anos, estava de volta à sua pátria. Em 1572, publica seu poema Os Lusíadas. Que celebra os feitos marítimos e guerreiros de Portugal.

Camões faz do navegador uma espécie de símbolo da coletividade lusitana e exalta a glória das conquistas, os novos reinos formados e o ideal de expansão da fé católica pelo mundo. O poema é composto de dez cantos, cada canto é formado por estrofes de oito versos. Com o sucesso, Camões recebe do rei D. Sebastião uma pensão anual, que mesmo assim não o livrou da extrema pobreza em que vivia.

Inspirado em A Eneida, de Virgílio, Camões narra fatos heroicos da história de Portugal, em particular a descoberta do caminho marítimo para as Índias por Vasco da Gama. No poema, Camões mescla fatos da História Portuguesa a intrigas dos deuses gregos, que procuram ajudar ou atrapalhar o navegador.

Um aspecto que diferencia Os Lusíadas das antigas epopeias clássicas é a presença de episódios líricos, sem nenhuma relação com o tema central que é a viagem de Vasco da Gama. Entre os episódios, destaca-se o canto III que relata o assassinato de Inês de Castro, em 1355, pelos ministros do rei D. Afonso IV de Borgonha, pai de D. Pedro, seu amante:

Canto III

Passada esta tão próspera vitória,
Tornado Afonso à Lusitana Terra,
A se lograr da paz com tanta glória
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste e digno da memória,
Que do sepulcro os homens desenterra,
Aconteceu da mísera e mesquinha
Que depois de ser morta foi Rainha.

Tu, só tu, puro amor, com força crua,
Que os corações humanos tanto obriga,
Deste causa a molesta morte sua,
Como se fora pérfida inimiga.
Se dizem, fero Amor, que a sede tua
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.

Estavas linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a fortuna não deixa durar muito,
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus formosos olhos nunca enxuto,
Aos montes ensinando e às ervinhas
O nome que no peito escrito tinhas.

 

Um Poeta Múltiplo

Camões foi um poeta sofisticado e popular. o poeta erudito do Renascimento, mas às vezes, se inspirava em canções ou trovas populares e escreveu poesias que lembram as velhas cantigas medievais. Além de Os Lusíadas, Camões escreveu poemas líricos, versos bucólicos, as comédias El-rei SeleucoFilodemo e Anfitriões e uma coleção de sonetos de amor, entre eles o mais famoso O Amor é fogo que arde sem se ver:

Amor é fogo que arde sem se ver,
É ferida que dói, e não se sente,
É um contentamento descontente,
É dor que desatina sem doer,

É um não querer mais que bem querer,
É um andar solitário por entre a gente,
É nunca contentar-se de contente,
É cuidar que se ganha em se perder,

É querer estar preso por vontade,
É servir a quem vence, o vencedor,
É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Morte

Luís de Camões morreu em Lisboa, Portugal, no dia 10 de junho 1580, em absoluta pobreza. Segundo alguns biógrafos, Camões não tinha sequer um lençol para lhe servir de mortalha. Teria sido enterrado em cova rasa. Mais tarde, em 1594, Dom Gonçalo Coutinho, mandou esculpir uma lápide com os dizeres: "Aqui jaz Luís de Camões, Príncipe dos Poetas do seu tempo. Viveu pobre e assim morreu"

(origem: e-biografia)

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