Inspiração - Verônica Azevedo


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         Inspiração e autoconfiança
                                   Maria Verônica Azevedo

            Ela chegou na maior animação, como sempre. As mechas do cabelo reluziam com um brilho quente e acobreado emoldurando um sorriso doce que espalhou alegria por todo o seu rosto.

            Não tinha nenhum motivo especial para tal animação. Ela é assim mesmo o tempo todo.

            Naquele momento ela interrompia a aula com a sua luminosa exuberância.

            - O que vocês estão fazendo? Ah! Pintando? Oi João posso ver o seu trabalho?
            - Claro! Pode olhar.

            - Nossa! Que legal! Quando você for grande como o meu pai, vai ser artista profissional?

            O João parou empunhando o pincel suspenso no ar e sorriu satisfeito observando a expressão doce no rosto dela.

            Depois de um instante, retomou o áspero trabalho. Difícil para um principiante. Voltou a se concentrar na ácida tarefa de dar textura à imagem daquele muro de pedra que se propunha a pintar. Não era fácil.

            Mas ele não desiste nunca.

            Ela se sentou ao lado do João e em silêncio, com a suavidade rosa de seus seis anos, ficou observando o empenho dele.

            Parecia que ela estava pintando com os olhinhos.

            Ficou curiosa porque ele estava usando só quatro potes de tinta acrílica. Observando a palheta que ele manuseava, reparou as várias cores que lá estavam. Essas mesmas cores ela reconheceu no quadro que estava sendo pintado. João buscava os tons perfeitos através de várias misturas: ora mais um pouco de azul, ora acrescentando vermelho e sempre que queria um tom mais claro recorria ao branco. Com o amarelo obtinha mais luminosidade. Ele ia fazendo as misturas, sempre anunciando em voz alta em busca de aprovação.

            Às vezes tinha dúvidas sobre os efeitos de sombra em forma e cor. O que poderia parecer complicado para uma criança da idade dela, ativava a sua curiosidade. Ela participava ativamente do diálogo inerente à situação de aprendizagem do João. Em dado momento ela citou algo que tinha aprendido na escola sobre e composição das cores secundárias.

            Uma hora depois ouviram o som estridente da campainha.

            - É o meu avô. Tenho que ir. Que pena. Eu queria ficar mais.

            João largou os pincéis com uma expressão fria e desanimada e correu para o portão.

            Ela ficou olhando ele sair com uma batida seca do portão, mas continuou parada em frente à tela inacabada.

            - Eu também quero pintar como ele...

            Dois dias depois ela voltou e encontrou uma tela em branco esperando por ela sobre a mesa de pintura. E ali estavam quatro potes de tinta guache nas mesmas cores com que o João trabalhara e uma palheta nova ao lado de pincéis e de um trapo de tecido.

            - É para eu pintar? Oba! Preciso de um pote vazio. Esse aqui serve. Vou buscar água... E saiu bem animada para pegar água na pia.

            O entusiasmo e o empenho dela resultaram num quadro, feito de imaginação. Representa um cachorro amarelo deitado na grama do jardim com as patas dianteiras esticadas para frente. A tela foi pintada com muita delicadeza e atenção a vários detalhes.

            - Pronto! Acabei.

            - Você quer levar para a sua casa?

            - Não. Vou deixar aqui para você mandar para o concurso. Eu vou ganhar um prêmio!


            

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