Deixa passar! - Fernando Braga


Deixa passar!
Fernando Braga

      Nasceu e sempre morou na Casa Verde em São Paulo e desde pequena era apaixonada por Carnaval.

      Com 15 anos passou a frequentar o barracão, com sua mãe, onde era feito o ensaio da escola de samba Império da Casa Verde, fundada em 1994.

     Adorava sambar, mas ser bem magra e alta, por mais que caprichasse parecia desengonçada, sem malemolência, embora tendo um sorriso cativante, dentes perfeitos, rostinho iluminado. Embora fosse assídua em sua presença, ter feitos amigos, não conseguia se caracterizar como uma sambista.

     O tempo passou, tornou-se adulta e agora com 22 anos, embora mais encorpada, mantinha as mesmas características físicas e a mesma dismetria para sambar. Ficava horas e horas treinando seus passos diariamente em sua casa e, treinava na escola, tentando imitar aquelas sambistas mais desenvoltas, que tudo faziam para mostrar os seus talentos. No carnaval, o que   conseguia era desfilar fantasiada, junto com o bloco todo, colocada no meio para não aparecer muito. Ela não desistia.

      Em sua casa, dizia que chegaria um dia a ser a rainha de bateria, o título mais cobiçado por todas que queriam se projetar dentro da escola, para o enorme publico presente no Anhembi e, milhões de pessoas assistindo pela TV. Seus familiares davam uma risadinha, mas não falavam nada para não desanimá-la.

      Agora em 2016, a expectativa era enorme, uma vez que tudo se mostrava maravilhoso nos preparativos, para a diretoria, para todos os componentes da Escola e para Domingas que era o nome desta criatura maluca pela festa do Momo.

      Ela conhecia todos os figurões que faziam parte da Escola, desde seu presidente eleito, o Alexandre Furtado, o mestre Marlon e a porta bandeira Jéssica, a Silvia, madrinha de bateria,    Ises Gomes a musa de bateria, mas  sua preferida era a Valeska Reis, rainha de bateria, com aquele corpo moreno, monumental, pernas torneadas, fortes e  seu samba!

      Domingas não tinha nenhuma chance, a não ser desfilar na ala das sambistas, e colocada no meio. O grande dia de fevereiro de 2016 se aproximava...

      Na véspera, após um dia de grandes preparativos, chegou muito cansada em casa e uma hora após o jantar recebeu um telefonema de quem? Dele, o Mestre Zoinho, o diretor de harmonia da bateria, que lhe dizia:

— Prepare-se, porque todos os diretores, incluindo o presidente querem que você ocupe o lugar da Valeska, que está doente por ter pego o Virus da Chikungunya. Ela não vai poder desfilar e você tem que substituí-la.

      Preparou-se, vestiu a fantasia com as asas douradas, sapato alto, também dourado e tomou sua posição na avenida, junto com os 3000 participantes. A rainha da bateria é a própria rainha da Escola. O desfile começou e...  Deixa passar!

      Domingas desfilava elegantemente, cantando a linda melodia composta, dançando, sambando na frente da bateria da escola, que estava realmente indescritível.

     Ficou muito emocionada ao desfilar com suas asas douradas na frente da  comissão julgadora, dando tudo o que podia, com muito carisma e muito gingado.  Nunca havia sambado assim. Seus pés deslizavam no asfalto em um ritmo alucinante, cadenciado, perfeito. Sentia-se como uma deusa, certamente vista em todo Brasil.

      Foi então que sua mãe abriu a porta do quarto e acordou-a, pedindo para que parasse de gritar, de cantar alto, de fazer barulho, pois os vizinhos iriam reclamar.

     Domingas sentou-se na cama, esfregou o rosto, sorriu e disse:

— Bem que o Andy Harlow dizia que na vida, todos, sem exceção, têm pelo menos 15 minutos de sucesso!

     Pronto! Tive mais de 15! Estou feliz!

    No grande dia, desfilou em sua ala com a escola, viu a grande Valeska fazendo evoluções muito sucesso e na terça, compartilhou da grande emoção em ver sua escola,  Campeã de 2016, o  terceiro título!


    Viva a Império da Casa Verde!

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