SIMPLES INFÂNCIA - Maria Luiza C. Malina


SIMPLES INFÂNCIA
Maria Luiza C. Malina

Um Benedito e três Marias cresciam brincando no imenso e florido jardim que tinha ao fundo da casa, uma apetitosa horta de morangos e verduras, ladeada por um alto barranco.

Brincávamos naquele barranco fazendo buracos, que representavam tocas e estradinhas de acesso, o Benedito com seus caminhõezinhos e as 3 Marias com suas bonecas, que eram intercaladas de brincadeiras de pega-pega, esconde-esconde,  pular corda, peteca, bicicleta, e assim o dia passava num doce assobiar, entremeados de morangos colhidos às escondidas.

Num desses cansaços infantis, um regador solitário estava no meio do jardim, e sem qualquer dúvida bebemos a água o mais rápido possível para continuarmos nas brincadeiras, e o jardineiro, em posição patética de espantalho, nos observava incrédulo, pois sabia que havia colocado um tipo de fertilizante naquela água.

Sem entender aquela correria atrás de nós, jardineiro, empregada e mãe, ríamos porque acreditávamos que finalmente tínhamos mais companheiros para a brincadeira, quando num determinado momento, entra pelo jardim a ambulância com sua fantástica sirene, uma enfermeira desce com alguma coisa na mão e o nosso pai, com sua roupa branca roupa de médico com as mãos na cintura em posição de “o que foi que vocês aprontaram desta vez”! e minha mãe, se debulhando em lágrimas, imaginando certamente um velório, percebemos que alguma coisa estava errada, uma vez que o jardineiro tirava as mãos de dentro dos imensos bolsos de seu avental, levando-as ao rosto,  ao lado do velho regador de lata.

Sem pestanejar lá fomos nós. O motorista dirigia a toda velocidade com a sirene ligada cortando as ruas passando pelos semáforos vermelhos, vomitávamos todos os nossos pensamentos, e pela primeira vez nosso medo por um puxão de orelha, havia sido substituído pela lembrança de um corre-corre sem fim e de um tão esperado passeio de ambulância.

Até a próxima Dr. Camargo!

Sim! Houve a próxima. Anos mais tarde, fomos surpreendidas com o mesmo barulho da sirene da ambulância, andando de bicicleta pelas estreitas e perigosas ruas da cidade de Blumenau.

O motorista desceu e nos ajudou a colocar as bicicletas dentro.

Nunca mais houve a próxima!


Um comentário:

  1. Maria Luiza

    Que história tão boa e tão bem contada... Você tem um jeitinho peculiar de escrever... Simples e refinado ao mesmo tempo. Parabéns, Suzana

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