O panda que
foi para o beleléu
Ises A. Abrahamsohn
─ Mãe! Onde está o Gino?
Foi a primeira coisa que a mãe ouviu de Laura quando
chegou do trabalho. A menina estava perturbada. Nem deu o costumeiro
beijo. No momento seguinte já puxava a
mãe pela mão com um apelo choroso:
─ Mãe! Você guardou ele em algum
lugar? Ele não está na minha cama, nem na cômoda e nem na caixa de brinquedos.
Como vou poder dormir sem ele? O Roberto disse que eu já tenho oito anos e que você ia jogar ele fora. Mas eu não
acredito. Você não ia fazer isso, né mãe
?
A mãe
ponderou a gravidade do caso.
─ Claro que não, Laura. O Roberto só
falou isso para te chatear. Nós vamos procurar o Gino juntas. Daqui a pouco.
Você já procurou no seu quarto? Procurou bem, bem mesmo?
Gino era
um urso panda de pelúcia que Laura abraçava toda noite ao dormir. Apesar de
muito sujo ainda era o preferido entre a bicharada que povoava o quarto da
menina.
A mãe
subiu a escada do sobrado até seu quarto para trocar de roupa. Estava cansada.
A vontade era se deitar e descansar, mas Laura não deu trégua. Ficou rodeando e
perguntando a cada minuto quando iriam começar a procurar o bicho.
Ouviram
a porta da frente sendo aberta. Era Roberto que chegava da escola. Após um
beijo rápido a mãe perguntou ao garoto sobre o bicho de estimação da irmã. O
adolescente riu:
─ Sei lá, mãe. Sumiu! Deve estar no beleléu. A Laura ficou me enchendo a manhã toda por causa
daquele trapo feioso e sujo. Que nojo! Vai ver que a Dona Alzira jogou ele
fora. Como eu vou saber? Por que ela não pega o coelho ou o urso marrom pra
dormir?
A garota
começou a chorar.
─ Tá vendo mãe? Olha como ele é ruim. E o Gino não é um trapo sujo.
Mãe, que lugar é o beleléu? Ele já falou hoje isso. Disse que é muito longe, de
onde ninguém volta. E se o Gino não voltar?
A mãe
suspirou.... Veio-lhe à memória o bichinho de sua infância. Era um cachorro
macio e orelhudo com o qual conversava antes de dormir. O que aconteceu com
ele? Não se lembrava mais. E junto com a
lembrança veio a empatia com a aflição
da filha.
─ Querida... Beleléu é apenas uma palavra
para a gente dizer que é um lugar longe que a gente não sabe onde fica. Nós
vamos achar o Gino.
E vistoriaram
toda a casa. Sala, armários, todos os
cômodos e até o quarto do Roberto, acusado de esconder o urso. O menino,
injuriado, emburrou.
Ainda
sobrava a lata de lixo na área externa. Por sorte estava quase vazia e lá
também não estava o Gino. Foi quando a
mãe teve aquele lampejo que só as mães que procuram coisas têm. O lixo estava
vazio porque Alzira tinha vindo trabalhar naquela manhã. A mãe olhou para cima.
Tinha chovido, e Alzira pendurara a roupa na área coberta. E.... lá estava o Gino
pendurado pelas duas orelhas no varal escondido por lençóis e camisas.
Laura pulava
de contente. O panda tinha recuperado o
branco do pelo depois da vigorosa esfregação da Alzira. Ainda úmido, o urso foi
carinhosamente abraçado e depois secado com secador de cabelo.
Na hora
do beijo de boa noite, Laura esticou o urso para a mãe beijar.
─ Agora que ele está limpinho você também
pode beijar ele, mãe, você merece!
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