Ela
tinha tudo para dar certo!
Fernando
Braga
Um primo,
após se formar, fazer Residência, foi se estabelecer como cardiologista em bela
e progressista cidade do interior. Ele casou-se e Célia era sua cunhada.
Eu, nascera
na mesma cidade e, frequentemente lá ia, para visitar familiares.
Em uma
ocasião, conheci Celia, uma balzaquiana de 35 anos, bem bonita, prendada,
conhecida nas rodas sociais da cidade. Frequentava o clube mais importante e nos
bailes lá estava ela sempre presente, abafando nos carnavais, com suas
diferentes e ousadas fantasias. Além do formoso rosto, tinha dentes alvos, sem
falhas e o que chamava a atenção de qualquer um, era o sorriso aberto, de
felicidade, expondo o par de covinhas nas maçãs do rosto. Seu corpo moreno, bem
proporcionado fazia parte do conjunto. Tinha um bando de amigas, que se reuniam
para jogar tranca e fofocar. Teve inúmeros namorados e ninguém explicava porque,
ainda não havia se casado. Seguramente, tinha casos.
Com o
tempo adquiriu uma Mercedes prata com a qual rodava toda empostada, cabelos soltos, sorrisos para todos os
lados. Tinha um emprego na câmara municipal onde se tornara figura importante,
responsável pela organização das sessões políticas e, onde, até os vereadores
muito a respeitavam.
Entretanto,
um dia, começou a correr, à boca pequena, que ela era amante do prefeito, e que
este, inclusive, havia lhe presenteado sua bela máquina. Comentavam também de
sua relação “política” com o presidente da câmara. Na realidade, todos queriam
ter certa aproximação com Célia.
Certo
dia, correu à “boca grande” pela cidade, que a mulher do prefeito e a do
presidente da câmara, juntas, foram à prefeitura e após desaforados ameaços,
exigiram que ela fosse posta para fora, perdendo todas funções. Assim se deu.
Havia
um deputado estadual, eleito pela região, que sabendo do ocorrido,
compadeceu-se e convidou-a vir para São Paulo como sua assessora na câmara,
junto ao Ibirapuera. Ela aceitou e mudou-se para São Paulo.
Frequentemente
voltava à sua cidade, mostrando continuar por cima e ainda muito bonita. Para todos,
dizia ser inocente de toda maledicência, que a vida dava voltas e que era
superior a todos os disque-disques.
Quando
este deputado vinha para a sua região eleitoral, ela sempre estava presente.
Todos desconfiavam que eles tinham caso!
O
tempo passou e agora cinquentona, apresentava pés de galinha, havia engordado um pouco, os dentes não estavam mais alvos, mas
conservava as duas covinhas. Célia, quando se olhava no espelho não gostava da
flacidez de suas pálpebras inferiores, das bolsas de gordura formadas debaixo
das mesmas, o que lhe dava aparência de cansaço e mais idade. Também detestava
algumas pregas na pele do rosto e de ambos os lados do pescoço. Quando puxava
um pouco sua pele, sentia que necessitava de uma pequena plástica no rosto. Fez
um clareamento dentário, que ficou razoavelmente bom.
Nesta
ocasião, morando em São Paulo, marcou consulta comigo, neurocirurgião.
Queixava-se de dores de cabeça, que percebi, após ter feito exames, inclusive de
imagem, que seria de origem tensional. Notei que já não era aquela gata, mas
que ainda não estava para se jogar fora, principalmente com toda a experiência
que devia ter. Concordei com ela que, uma blefaroplastia e ligeira cirurgia
facial poderiam devolver-lhe alguns anos.
Tempos
após, em sua cidade, procurou um cirurgião plástico, que dizia a todos, ter
feito seu aprendizado com o próprio Ivo Pitangui, no Rio.
Após
uns dois anos, voltando a meu consultório, quando entrou, quase não a
reconheci. Foi logo dizendo: - Doutor, veja o que aprontaram comigo!
Contou
que havia sido submetida a três cirurgias na face. Na primeira, o médico de sua
cidade havia tirado suas bolsas gordurosas das pálpebras, mas tirara tanta
pálpebra que não conseguia fechar completamente os olhos, que ressecavam muito
quando dormia, ficando irritados, avermelhados. Ao mesmo tempo, ao esticar a
pele do rosto e do pescoço, também havia exagerado. Na segunda cirurgia tentara
corrigir, mas não ficara boa. Teve que vir a São Paulo procurar um outro
plástico, que tentou melhorar a estética em seus olhos e rosto.
Quando
a olhei, como disse, não a reconheci. Estava horrivelmente deformada, com a
cara diferente, feia, não fechava completamente os olhos, não conseguia fazer
um bico na boca, de tão esticada que estava.
Havia emagrecido, pernas finas, barriga proeminente e ainda, mantinha
sua cefaleia. Enfim, era outra pessoa. E agora, bem neurótica. E, sem as belas
covinhas no rosto!
Havia
retornado para morar na cidade do interior, em um pequeno quartinho da casa de
sua irmã, que passou a sustentá-la.
Quando
era jovem e bonita, não precisava de ninguém, era bem autossuficiente!
Morreu
aos 60 anos, segundo meu primo, de tristeza! Disse que ultimamente vivia
cantando:
-
Tristeza, não tem fim! Felicidade, sim!
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