Meu
amigo e seu cão.
Fernando
Braga
Quando
morava em uma casa em bairro tranquilo, desde que assaltantes nela entraram há
uns 10 anos, adquiri um belo, forte e respeitável cão, doado por um grande
amigo. Era um filhote de Rottweiller, que criei com muito carinho, todos os
cuidados indispensáveis, necessários para sua boa saúde. Cresceu tornando um animal
enorme de 75 quilos, que me escolheu para ser o elemento da casa a quem
considerava seu dono, seu amigo. Nunca tive receio dele em relação às crianças
que frequentemente estavam em casa. Foi aí que compreendi que realmente, o cão,
bem alimentado, é o melhor amigo do homem. Foi atropelado quando partiu em
direção a um gato que viu do outro lado da calçada e morreu na hora. Enorme
desgosto.
Uns
dois anos após, entreguei minha casa para um dos filhos e mudamos para um
apartamento em local tranquilo, seguro, onde minha esposa teria menos trabalho.
Neste
condomínio, acostumei-me a caminhar diariamente uma boa distância e depois
nadar na piscina coberta e climatizada. Foi aí que conheci um de meus vizinhos,
mais jovem, muito simpático, um conhecido e respeitado, ex-técnico de futebol.
Agora rico, desistira daquele sofrimento diário e infernal, que o futebol lhe
causava todos os fins de semana.
Passamos
a nos encontrar pela manhã, quando descíamos para caminhar nas dependências do
condomínio e em um pequeno parque próximo. Pouco tempo depois, convidou-me para
um aperitivo em seu apto, ao qual logo retribui. A amizade de nossas famílias
cresceu. Quando o visitava, fiquei conhecendo Diana, uma cadela Labrador
Retriever, negra, que era dócil, amiga e não despertava qualquer receio em lhe
alisar a cabeça. Muito diferente de meu cão, ao qual ninguém ousava chegar
perto, embora confiável.
O
labrador vivia dentro de seu apto, com sua casinha no setor da lavanderia, mas
não saia do local em que as pessoas estavam, na sala de visitas ou de estar,
assistindo TV. Quando conversava com meu
amigo, Diana não saia de seu lado, deitada junto a seus pés.
Logo
percebi, que como eu, tinha devoção a cão, a quem considerava gente!
Certa
noite, tomando vinho, me deu uma aula, falando da raça de sua cadela, sua
origem, chegada ao nosso país, a raça mais popular depois de 1991. Falou de sua
educação, inteligência, da necessidade em fazer exercícios diários, caminhar,
correr, brincar. Diariamente alguém tinha que dar uma volta com ela, em geral a
empregada, mas nos fins de semana, era ele.
Aos
poucos também me acostumei e, quando ia visitá-lo, ficava passando a mão na
cabeça e no corpo de Diana, com aquele pelo sedoso.
Ha um
mês, recebi a visita do casal, cujo intuito era solicitar-nos um grande favor.
Ia para a Europa onde ficariam duas semanas e o cão, evidentemente, não os
acompanharia. Sua empregada, que morava bem longe, viria diariamente para
manter o apto limpo e arejado, mas, principalmente, para cuidar da cachorra,
dando-lhe água, ração bem medida e ainda dar uma volta com ela, pelo parque próximo.
Contudo, para ela, seria muito difícil vir nos fins de semana, pois tinha muitos
afazeres em sua casa, com sua família.
Assim,
ele me solicitou, caso possível, se nos dois fins de semanas, eu poderia tomar
conta do cão, descendo a seu apto, colocando a água e comida e depois levando-o
a passear, pelo menos uma vez ao dia, cerca de uma hora. Evidentemente, eu que
estou aposentado, me dispus a executar estas funções, tratando daquele cão, com
o qual também me afeiçoara. Fomos até seu lar e lá me mostrou o local da ração,
a vasilha d´água, a correia para conduzi-la, a escova para passar em seu pelo,
a bola para brincar com ela. Deu-me uma cópia da chave seu apto e informou à
direção do condomínio de seu afastamento e a autorização para que eu entrasse
livremente em seu nosocômio.
Tudo
ocorreu normalmente na primeira semana, trouxe o cão para ficar um pouco em
nossa casa, escovei seu pelo, e depois sai para a volta, onde exercitei-o ao
máximo, que eu podia.
Na
segunda semana, a última, pois eles chegariam na segunda feira cedo, resolvi
colocar o cão em meu carro e com minha mulher fomos andar em um parque, com
muitas árvores, pista para andar e correr, rodeado por casas bonitas, que
costumávamos frequentar quando ainda morávamos em nossa casa no Alto dos
Pinheiros. Saímos a andar, cão em uma correia, mas depois resolvemos soltá-lo
para que pudesse brincar à vontade. Ficamos com o olho nele.
Em
dado momento, sentados em um banco, conversando, vimos um carro saindo de uma
casa em frente, quando pelo portão ainda aberto, saiu em correria um enorme Pitbull
amarelo, que dirigiu-se diretamente para a nossa cadela. Com enorme ferocidade
pulou em seu pescoço, junto à sua goela, derrubando-a ao chão. Eu que sempre
carrego um bastão quando ando e saí em direção aos cães, comecei
a gritar e fortemente bater no corpo do Pitbull, mas sem resultado. O
desgraçado, não soltava as presas da porção anterior do pescoço de Diana, jogando
sua cabeça para um lado e para outro.
Algumas
pessoas, bem temerosas, vieram me ajudar, puxando o rabo do Pitbull, mas ele
não largava. Foi aí que o dono do cão, que presenciara de longe o quadro,
percebeu que era seu cachorro que havia escapado para a rua, enquanto mantinha
o portão aberto. Grudando a coleira do mesmo, gritando seu nome, conseguiu soltá-lo,
colocar a focinheira e conduzi-lo de volta à sua casa. Veio depois dar
satisfações e se dispor a levar Diana, bem machucada, imediatamente, a um
pequeno hospital veterinário. Fomos em
um carro único, Diana com a cabeça em meu colo, desacordada. Chegando logo ao hospital, fomos
imediatamente atendidos por uma veterinária, que ao examinar Diana, logo nos
falou:
- Está
morta!
- Meu
Deus! Que fatalidade! Disse eu. O cachorro não é meu e inventei de vir passear
com ele aqui! O dono do outro cão, desesperado, não tinha o que dizer, mas várias
vezes repetia baixinho:
- Vou
ter que sacrificar este desgraçado, talvez eu mesmo o faça, chegando em casa.
Ficou
sabendo que o cão morto, não era meu, mas de meu vizinho, de quem ele também,
muito ouvira falar! Apenas ele
completou:
- Vou
te dar meu telefone para entregar a ele, para me procurar.
Passei
aquele dia como se tivesse desabado o mundo sobre mim! Eu queria sumir! Mas
pensei: É a vida!! C´est la vie!
No dia
seguinte, nervosamente, na chegada do vizinho, cabisbaixo, comuniquei o fato a
eles. A empregada, que foi quem mostrou-se
desesperada, mas devem ter pensado: Aquele FDP!
-Afinal,
entre nós! Meus queridos, era um cão!
A amizade continuou a mesma, mas guardar em
meu peito a terrível sensação de que fui o culpado, é muito para a meu pobre coração,
de um velho aposentado!