A PROCURA DA
SABEDORIA
Carlos
Cedano
Após
mais de quarenta anos longe de Taife sua
cidade, Abdul Samir voltava pra ela. Sentia-se feliz, mas algo ainda estava
faltando. Uma breve retrospectiva de sua vida durante esses quarenta anos de
exilio voluntário, tinha-lhe dado certeza de ter encontrado algumas respostas para
o que tinha sido a meta principal dessa longa peregrinação. Pensando bem - disse pra sim mesmo - talvez as respostas estivessem mais perto
do que imaginava.
Abdul
conheceu uma grande parte do Império Islâmico do Século X, também a conturbada
Palestina, o Egito, a Mesopotâmia e lugares históricos como a antiga Babilónia
e Nínive entre outras. Parte da caminhada fez pelos desertos do Saara e da Península
Arábica. Atravessou rios e conheceu lugares dos quais nunca tinha escutado
falar. Pode observar e comparar particularidades dos diferentes povos e
raças que coexistiam nesse lado do mundo. Sabia que estava acumulando vasto
conhecimento, rico e variado, e sentia que isso preenchia parte de seu desejo
principal.
As
experiências mais impactantes foram os inúmeros contatos com pessoas de
diferentes níveis de educação, de posses, de posição social e política e, principalmente
com pessoas religiosas. Entretanto os mais fascinantes de seus encontros foram
com os ermitões considerados santos, com os quais conversou muito. Foi através
deles que Abdul conseguiu perceber aspectos desconhecidos da natureza humana, isto
é, de sua própria natureza.
Todas
as conversas de Abdul tinham como foco seu grande objetivo: Sabedoria: Como
atingi-la, e como transmiti-la. À
medida que o tempo ia passando, reparou que suas indagações começavam a
configurar um caminho para atingi-la. Mas, algo faltava ainda. Algo não estava
claro.
Chegando
a Taife constatou que, assim como a Meca e Latibe, ela continuava sendo um
centro poderoso, pois as três estavam situadas na rota de passagem das
caravanas que se dirigiam para os principais centros de comercio do
Mediterrâneo e do Egito.
Na
sua cidade, como já imaginava, não foi reconhecido por ninguém. Logo saiu a procura
de um lugar afastado da cidade e não muito longe das rotas de comercio que se
dirigiam ou passavam por Taife.
Encontrou
uma pequena colina com uma caverna de calcário, abandonada, que
atendia suas necessidades. Ali se instalou. Aos poucos curiosos foram se
achegando para saber quem era e qual seu ofício, e se não tinha medo de sua vida
solitária. Respondia a todos com simplicidade e simpatia. Aproveitava esses
encontros pra trocar conhecimentos e opiniões sobre diversos assuntos. Porem, o
que verdadeiramente entusiasmava as pessoas era escuta-lo falar sobre os segredos
da vida e do destino. Aos poucos foi sendo conhecido por maior número de
pessoas e começaram a chama-lo do sábio
da colina. Não aceitava dinheiro nem presentes apenas o necessário para uma
alimentação frugal.
Passou
mais de um ano e os comentários sobre sua pessoa chegaram cada vez mais perto
dos ouvidos das autoridades religiosas. Por isso, Abdul não se surpreendeu
quando um dia apareceram em sua caverna três Mulás considerados os mais
versados na religião islâmica.
Os três religiosos educadamente interrogaram Abdul
sobre seu conhecimento do Corão. Ele respondeu todas as perguntas surpreendendo
os Mulás pela precisão de detalhes das respostas. Aos poucos o ambiente, que
nunca deixou de ser respeitoso, foi se descontraindo e até certa familiaridade
se instalou entre eles. Passaram-se algumas horas e quando os religiosos se
dispunham a partir Abdul lançou uma pergunta:
- Os senhores poderiam dizer-me o que
caracteriza um homem sábio?
A
pergunta além de surpreendê-los, os desorientou. Entreolharam-se e um deles
tratou de elaborar uma resposta:
- Ah! Trata-se de pessoa que por seus
estudos possui conhecimentos profundos sobre alguma coisa ou tema.
- E a experiência e a sensibilidade não
contam? Instigou-os Abdul com um suave
sorriso.
- A experiência como? Perguntou o
segundo Mulá.
- A experiência é conhecimento acumulado
e refletido ao longo dos anos de vida. Por isso, a qualidade do conhecimento
dos mais velhos é mais nuançada e integrada. Este caminho leva tempo até que a
pessoa chegue a conclusões e pontos de vista adequados com base a seu
conhecimento adquirido. É um processo continuo de reflexão.
- E quanto à sensibilidade? Completou o terceiro Mulá.
- É uma característica intrínseca da
sabedoria mais precisa desabrochar. Somente atingimos a sabedoria plena quando usamos
nossa experiência para entender e ajudar os outros. A sabedoria permite diminuir
o caráter autocentrado das pessoas e lhes permite olhar para o próximo.
Se
me permitem concluir, pode-se dizer que a sabedoria tem três aspectos que
tendem a convergir ao longo da vida: conhecimento, reflexão e compaixão.
O Mulá mais velho disse:
— Na Pérsia é venerada a deusa Kitsa
deusa da sabedoria, ela no diz que Sabedoria está dentro de todo ser humano, mais
que é necessário faze-la emergir.
- Certo! - disse Abdul.
Os
Mulás agradeceram efusivamente a conversa e manifestaram que desejavam
continuar o diálogo. Pareciam sinceros e felizes com a possibilidade de novos
encontros. E foram muitos e frutíferos, com o tempo os quatro já estavam no
caminho que leva à Sabedoria.
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