Sonho e realidade - Adriana Frosoni

 

 


Sonho e realidade

Adriana Frosoni


Havia uma trilha muito arborizada, com pequenas aberturas pelas quais o sol iluminava o solo extremamente úmido, de onde foi subindo um cheiro de grama misturado com terra. A umidade do ar facilitava a respiração e os pequenos troncos, colocados cuidadosamente pelo caminho, ajudavam na subida.  Mas tudo isso se esvaía ao final da trilha, pois as árvores se abriam como uma cortina e davam espaço a uma cachoeira, de tamanha exuberância que parecia uma porta para o céu.

De chofre eu acordei e, de tão embrenhado naquele sonho, continuei a sentir o perfume da natureza com a memória.  Soquei a cabeça sob o travesseiro, num ato desesperado, com esperança de voltar a sonhar, mas não funcionou. O despertador tocou para me jogar de volta à realidade.

Mais uma semana igual: consumidora de sonhos, tempo e energia. Estava ficando psicologicamente inviável, mas não tendo ninguém interessado nisso para dar-me o sinal de alerta, eu segui de forma insustentável mesmo.

No final do dia, nada de pôr do sol, céu estrelado, nem ar puro. Só concreto em frente à janela e as estrelas todas apagadas pelas luzes da cidade. Deixei para lamentar depois e, acredite, lamentei mesmo. Não por ter seguido em frente, mas pela forma que o   fiz: teimosamente, atropelando os sinais do corpo. Feridas invisíveis foram criadas, e futuramente elas precisariam ser revisitadas, reabertas e tratadas.

Quando o trabalho começou realmente a dar certo e todo o resto da minha vida, errado, tomei a decisão mais fácil: passei a trabalhar ainda mais. Reação óbvia para quem não percebe que já está enterrado até o pescoço e vai acabar submerso. Mas novamente faltou alguém para abrir meus olhos, então cerrei-os com mais força e segui como pude.

Ao final de alguns anos, o naufrágio anunciado há tempos, aconteceu. Dores, tensões e desânimos brotavam. Mas o problema mesmo foi quando começaram as enxaquecas, as labirintites e finalmente a mudança de percepção do mundo ­– os medos infundados. Sucumbi...

 

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