Conversa x Desconversa - José Vicente J. Camargo


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Conversa  x Desconversa
José Vicente J. Camargo



Oh Compadre! Você que é pessoa viajada, aproxima que quero te contar algo:

Estava ontem no bar do Luiz e ouvi uma conversa entre dois sujeitos de fora, arrogantes, que não consegui compreender tal a quantidade de palavras que fugiam do meu conhecimento. Me pus a indagar se não falavam portunhol, o idioma dos “hermanos” misturado com o nosso. Curioso em saber se não tramavam algo suspeito, de polícia – até que seria prazeroso pegá-los em flagra dado o ar presunçoso que tinham daqueles que comem sardinha e arrotam garoupa − puxei do bolso meu caderninho de anotações e disfarçadamente fui escrevendo o diálogo entre eles, que aqui está:

“Para mim a Matilde foi culpada, o provocou! A vi naquela noite saindo da estau e a segui porque bem sabes que tenho um apetite pela rapariga. Entrou na ovençal do Manuel e por uma das janelas aberta pude vê-lo dando um bíbulo e tanto de gargalho enquanto olhava Matilde. Em seguida fez um reunido e deu uma baita esputação. Depois, agarrando seu braço com força, apontou para o sable no brasão da família pendurado entre as estantes repletas de garrafas com o segredo familiar do qual ele tanto se orgulhava.

Mas então ele estava numa carraspana? É uma pena para quem veio de antepassados tão otimates. E depois, o que se passou?

Tentei me aproximar da janela para ver e ouvir melhor, mas, dado a chuva da tarde, escorreguei num lamaçal humifuso e, pra não cair, me agarrei numa lata de lixo que, não aguentando o peso, rolou rua abaixo. Com o barulho, Manuel, sem me ver na penumbra da noite, fechou a janela. Levantei, procurei uma nova brecha na janela e minutos depois deu-se o tiro”...

Justo nessa hora, continua o narrador, um deles atende o celular, paga a conta e ambos saem do bar me deixando com o final da estória a ver navios...

Aconselho que consultes um dicionário português para palavras em desuso e compreenderas o texto, responde o Compadre. Mas te adianto que não é portunhol e não há nada de comprobatório, já que não temos o final da cena. Caso encontres os dois sujeitos novamente no bar, tente puxar conversa e “joga verde pra colher maduro”, isto é: se não conhecem certa Matilde que recebeu uma esputação de um tal Manoel que estava numa carraspana danada no ovençal deste, etc, etc...

 Mas cuidado! Se te oferecerem um bíbulo, faça um renuído, desconversa e saia de mansinho, pois, pode ser que o “apetitoso” da Matilde foi quem deu o tiro e com certeza não vai querer testemunhas...





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