O
PROBLEMA NÃO SOU EU...
Ledice Pereira
–
Pra mim chega! – Gritou Rodolfo, o mais alto que pôde – Quem ele pensa que é,
pra me tratar assim? Só porque é o dono da empresa acha que pode tripudiar em
cima de mim.
Amanhã, sem falta vou resolver isso de uma vez
por todas.
O
ódio estava acabando com Rodolfo. Duas e meia da manhã e não conseguia dormir.
Andava pela casa, de um lado para o outro, sentindo pulsar a veia do pescoço.
Resolveu
fazer um chá. Sentiu falta da mãe que lhe preparava a bebida quente toda vez
que ele tinha essa inquietação.
—
Que falta ela me faz – pensou – era a única pessoa que me compreendia. Fiquei
só, neste casarão. Meus irmãos nem se lembram que eu existo. Cada um na sua.
Ninguém quer saber se estou vivo ou não, se tenho problemas, se minha saúde está
boa.
Estou
vivendo o pior momento da minha vida! Um chefe deveria ser uma espécie de pai,
acolhedor. Esse imbecil não tem a mínima sensibilidade. Quer que eu faça em um
dia, o que levo uma semana para realizar. O problema não sou eu, é ele. Amanhã
vou despejar tudo em cima daquele velhaco. Se gostar, gostou. Não serei mais
capacho de ninguém.
Depois
de dormir apenas três horas, Rodolfo levantou-se, tomou um banho, fez um café
que bebeu apressado, engoliu os costumeiros comprimidos e dirigiu-se para o trabalho.
Tinha muito que fazer. Precisava agradar o chefe. Não podia perder aquele
emprego que custara tanto a arranjar...
Intimamente,
sentia uma insatisfação que foi se agigantando. Era uma questão de vida ou
morte. Virou uma obsessão, precisava fazer alguma coisa. Aquilo passou a
martelar em sua cabeça. Não tinha mais paz, não dormia mais, não se alimentava.
Tinha uma ideia fixa, uma ideia de vingança que se não realizasse ficaria
desmoralizado para sempre entre os colegas, a família, os poucos amigos que lhe
restavam.
Então
ele se preparou. Comprou a arma. Matriculou-se num clube de tiro. Treinou como
um louco. Aguardaria a chegada do chefe.
Não deixaria rastros. Torturaria o homem até que o velho lhe pedisse perdão.
Estariam só os dois.
Pela
janela, viu quando o carro entrou no estacionamento do prédio. Ele costumava
passar sempre no almoxarifado. Ficou ali de tocaia. Arma apontada para a porta.
Quando o homem se aproximou da porta, foi atingido de raspão na perna. Com o
choque estatelou-se no chão.
—
Você ficou louco! – Gritou.
Rodolfo
sentiu-se poderoso.
—
Apenas para lembrar que você não é melhor do que ninguém. Quando você morrer
vai pra um caixão como qualquer um. Sua fortuna ficará por aí.
Rodolfo
continuava a apontar a arma, fazendo com que o homem, apesar da dor, nem se
mexesse.
Estava
tão concentrado que nem percebeu quando os seguranças, tendo visto o chefe
chegar e estranhando a demora dele para subir à sua sala, resolveram checar o
que estava ocorrendo no almoxarifado. Desarmaram Rodolfo, imobilizando-o.
Acudiram o chefe e acionaram a delegacia próxima dali.
Rodolfo
foi levado e detido por tentativa de homicídio. Pouco tempo depois, examinado
por um psiquiatra, foi diagnosticado com um distúrbio de personalidade e
encaminhado a um Hospital psiquiátrico no interior de São Paulo.
Lá,
passou os últimos dias de sua vida, sem que nem mesmo os familiares o
visitassem. Em conversa com os outros pacientes costumava afirmar:
—
O problema não sou eu.
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