PASSAGEM DE PLANTÃO
Oswaldo U. Lopes
Essa
história parece começar no Gênesis. Ninguém mais lembra como começou, mas é
assim até hoje. Há os residentes fixos no Pronto Socorro que lá ficam por dois
meses como parte do rodizio entre as várias clínicas e há os que entram à noite
e ficam até a manhã seguinte, revezando-se a cada seis dias.
Tudo
bem explicado, manda a boa tradição que ao entrarem os da noite, façam uma
visita discutindo cada leito junto com os assistentes que também dão plantão,
estes com escala fixa que é para poderem organizar a vida lá fora.
Por
mais que fiquem apenas aquela noite, não é raro alterarem medicação, conduta
etc. De manhã a coisa muda de figurino. É uma passagem rápida e tranquila, cada
um precisa seguir o seu rumo. Se não
está no Gênesis, deve estar no Êxodo.
Mesmo
em tempos de COVID, a coisa não muda muito. Há um PS especial só para os
doentes do vírus, uma equipe especializada e uma porta autônoma. De resto, como
costumam dizer: só porque é pandemia, os tiros não cessam, os desastres também
não, e as doenças agudas continuam a precisar de tratamento.
Tudo
isso pensava Ricardo enquanto ia passando os casos que entraram a noite,
esbarrando sempre naquele.
— Quem vai contar o caso do seu Joaquim, câncer
avançado de pulmão, falta de ar e falta de lugar onde ficar até morrer.
Pensou
e calou, eles descobririam por si mesmos, o que iriam fazer, era uma outra
história. Percebeu que não ia fazer parte dela, calou-se e foi-se. Será que era
isso que chamavam de endurecer a carapaça para poder aguentar o PS?
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