Vivo após 36 dias na mata amazônica.
Ises de Almeida Abrahamsohn
Este texto foi produzido a partir da notícia e
texto publicados no NYtimes em 28 de março de 2021, escrito por Manuela Andreoni e produzido em parceria
com Pulitzer Center’s
Rainforest Investigations Network
Antônio Sena tinha aceitado fazer aquele voo
naquele velho Cessna 210L
porque estava desesperado. Com a pandemia seu pequeno bar não dava para
sobreviver e os turistas tinham sumido do Pará. O destino era um garimpo ilegal em algum lugar no meio na selva
amazônica. Era seu voo de estreia sobre a mata. Estava a 1000 m de altitude
quando o motor deu pane. Pesou as chances. Poucas. Trazia 160 galões de diesel
consigo. Ao perder altura só via a densa copa verde abaixo. Conseguiu enviar um
comunicado curto no rádio aberto, que estava a meio caminho da mina Califórnia.
Até que, aos 100 m, viu um vale estreito ladeado de palmeiras. Deveria haver rio
próximo... E foi lá onde ele miraculosamente conseguiu aterrissar. Ainda tonto
com o baque, agarrou um canivete, lanterna, alguns isqueiros, o celular e se
esgueirou para fora. Minutos depois, já a distância segura, viu o avião
explodir.
Decidiu acampar ao lado dos destroços. O rio que havia imaginado não existia,
apenas água acumulada em poças. Pensou que os voos de resgate o achariam mais
facilmente. Porém após alguns dias percebeu que os voos de reconhecimento passavam
acima, mas não o viam, nem a fogueirinha, nem os sinais que colocou no chão com
folhas de plantas e restos carbonizados do avião.
Antes da bateria do celular morrer de vez, acionou
o aplicativo de geolocalização e com o mapa localizou um rio, o Paru, a cerca
de 90 km na direção oeste, onde ele sabia haver habitantes. E começou a
caminhar. Caminhava pela manhã e no começo da tarde montava um abrigo com
folhas para se abrigar da chuva e passar a noite. Tentava acampar nas áreas
mais altas. Os predadores em geral caçam próximo aos igarapés. À noite tinha
que se livrar dos macacos prego que queriam destruir o seu abrigo de folhas. Mas
com eles aprendeu que podia comer umas frutinhas vermelhas, breu ou guapuicí de
gosto resinoso, mas nutritivas. Conseguiu também três ovos de inhambu e algumas
folhas que conhecia. Depois de 4 semanas caminhando, ao acampar à tarde ouviu o
zumbido de uma serra elétrica. Não comia há três dias. Apurou o ouvido e ouviu
de novo. Mas já escurecia e ele ficou com medo de perder a direção na
escuridão. No dia seguinte ouviu de novo a serra que logo parou. Continuou a
caminhar na direção oeste como sempre e à tarde viu uma tenda de lona azul e um
homem quebrando castanhas. Era um acampamento de coletores de castanhas
liderado por Maria Jorge Tavares de 67 anos. Tinham vindo coletar em áreas mais
remotas e nesta, que não visitavam há 3 anos. No acampamento o piloto foi
alimentado e abrigado. Tinha perdido vinte quilos nesse período. D. Maria se
comunicou pelo rádio com a filha, Miriam, que por sua vez se comunicou com a
família de Antônio em Santarém. O pessoal a princípio não acreditou, achou que
era golpe, já o tinham dado por morto. Finalmente Antônio foi resgatado e jurou
nunca mais fazer voos para garimpos ilegais. São criminosos que destroem a mata
e poluem os rios.
NOMENCLATURA E SIGNIFICADO: GUAPUICÍ vem do tupi e significa: “Fruta com resina
refrescante”. Também é chamado
de Amescla, Almacega, almacegueira, Breu branco, Manguinha brava
e Pau de incenso.
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