Oswaldo
U. Lopes
Jurema não é uma mulher comum. É pobre,
não miserável, justa, honesta, trabalhadora; bem até aí está mais comum que
goiabada com queijo.
Não é de levar desaforo para casa. Ah!
Começou a diferença. No infeliz mundo em que vivemos, as mulheres levam para
casa mais desaforos que deviam levar. Deviam?
Por que ficar calada quando ofendida ou
molestada? Por ser fisicamente mais fraca? Francamente, isso é argumento que se
apresente em pleno século XXI.
O Dr. Alex é muito inteligente, resiliente,
fisicamente forte, astuto e não é jovem. Você pode ser moço e inteligente, pode
ter porte físico, mas resiliência e perspicácia só se conseguem com a idade.
É o drama da medicina de hoje. Você deve
ter um conhecimento atualizado e recente, mas precisa de experiência e vivência
na arte médica. O êxito depende da combinação desses dois fatores, não é para
muitos.
O Dr. Alex se apresentava como
ginecologista e punha muita ênfase nisso. Muitos se dizem Obstetras e
Ginecologistas, ele não. Não gostava de obstetrícia, muita confusão e ainda por
cima, brincava, a maior operação deles era a cesárea, pura via de acesso.
Como cruzaram suas vidas fica para
esclarecer, foi uma mistura da generosidade dele com a necessidade dela.
Ouviu, espantado, mas sem demonstrar, a
incrível história da Jurema. Ela usava a palavra rape, tipicamente americana,
muito frequente em filmes e TV, parecia para os falantes mais suave que o
violento estupro do português castiço.
Por fora, parecia jogador de pôquer,
ouvia sem pestanejar ou dar mostras de incredulidade. Jurema fora vítima de rape aos nove anos de idade. O autor,
um tio, irmão de sua mãe. Perdida, sua mãe fazia de conta que nada acontecera,
escondera do marido temendo pela vida do irmão e achava que a menina poderia
viver com aquilo. Não podia, tivera rotura de períneo e escoriações na vagina.
Nunca tivera uma vida sexual que de longe pudesse ter esse nome.
Examinou-a com cuidado, tendo a
enfermeira presente, nesses casos essa presença dava segurança à vítima.
Sentou-se na sua cadeira e fitando
carinhosamente Jurema falou-lhe:
—
Os danos causados na sua genitália eu posso consertar, não são de difíceis
reparos. Não posso devolver-lhe a virgindade, nem seria o caso, mas posso
reconstruir seu períneo e a vagina.
Em relação a outros danos, psicológicos,
tentarei ajudar, mas você precisará de auxílio especializado que posso
conseguir. Prometo que estarei sempre a seu lado, vou ajudá-la no limite das
minhas forças.
Foi só aí, que a cara de jogador de
pôquer desapareceu, comovido com tanto sofrimento, esboçou um sorriso,
misturado com uma lágrima que teimosa escorria de seu olho.
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