DUAS CRIANÇAS - Suzana da Cunha Lima




DUAS CRIANÇAS

Suzana da Cunha Lima

 

Ele nasceu há mais de dois mil anos em Belém, uma cidadezinha da Palestina, e foi colocado, recém-nascido, numa manjedoura.  Ainda bebê, precisou se refugiar no Egito, para fugir da sanha infanticida  dos soldados do Rei Herodes.

Quando o perigo acabou, voltou para sua terra onde cresceu, pobre e analfabeto. Morreu aos trinta e três anos, nas mãos dos carrascos de seu próprio povo.

Ele era Jesus de Nazaré, um Rei cujo reino não é deste mundo, porém o Poder transformador de sua Palavra e de sua Verdade permanece vivo até hoje.

Aylan Kurdi nasceu dois mil anos depois, em Korbana, na Síria, e morreu,  ainda criança, coberta de espuma e sal, nas praias de Ali Hoca, em Bodrun, Turquia.  Levada pelas ondas, como um dejeto qualquer, é um símbolo trágico do desespero migratório, que tem sepultado tantas vidas e tantos sonhos.

 Aylan Kurdi também precisou fugir do longo braço dos soldados de sua própria pátria, esfacelada pela guerra civil e por um perverso fanatismo que não obedece a nenhuma regra ou convenção humana civilizada.

Ele morreu, porém sua voz ressurge no grito e indignação dos povos e, quem sabe, consiga tocar, com sua inocência, os corações dos que possuem poderes para conter o Mal.

Há uma verdadeira e profunda ligação entre estas duas crianças: ambas fugiam da opressão de seus governos totalitários, ambas buscavam um espaço de liberdade para viver seus sonhos e cumprir sua missão.

O mundo caminha entre o Bem e o Mal desde que o primeiro homem pisou neste planeta.  O Mal se impõe pela violência e o Bem age pela paz.

Estamos nesta encruzilhada, é o que me vem à mente nesta época em que celebramos o nascimento de Jesus, cada vez mais angustiados e desesperançados diante da extrema crueldade como o Mal se manifesta.

Será que chegou a hora de nós, homens e mulheres do Bem, nos levantarmos contra a barbárie e desembainharmos também nossas espadas?

 Espadas de coragem e inconformismo, oferecendo o que temos de melhor, nossos talentos, nossa voz e nossa arte, para que não aconteça mais outros Aylans Kurdi.





(Texto baseado em fatos reais - reapresentação) 

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