UM ESPÍRITO INCOMODADO - Sérgio Dalla Vecchia




UM ESPÍRITO INCOMODADO

Sérgio Dalla Vecchia

 

João, é assim que irei chamá-lo. Poderia ser José, Antônio ou outro nome bíblico qualquer.

Yvette era a companheira e esposa. Poderia ser também Odette ou outra ette qualquer da bela época.

João e Yvette casaram-se, ele viúvo, e ela novinha nos seus dezessete anos, com uma vida pela frente.

Dessa união surgiram quatro filhos em intervalos de quatro anos cada.

O casal vivia muito bem, ela dona de casa exemplar e ele advogado sério e formal.

A harmonia existia naquela família até que, num certo feriado, o casal foi repousar após o almoço, quando do nada a porta do quarto se abriu e um só saiu do quarto em desespero. João ficou paralisado na cama por um AVC.

Ambulância, prantos, hospital e logo o funeral. Lá se foi o João. De cima, seu espírito incomodado observava a confusão.

Não entendia nada. Como pôde haver uma mudança tão brusca na sua existência? Da cama para o etéreo!

Deveriam ter me avisado de que morreria naquele feriado. Mas assim, de supetão, um advogado não pode aceitar. Vou impetrar na justiça e quero ver quem ganhará!

Assim o fez, mas Themis sobrecarregada com as causas do mundo, colocou o processo por baixo da pilha. Assim, João, enquanto aguardava o andamento, aproveitou para rondar os arredores da casa da família.

Observava o primogênito formado engenheiro já trabalhando na profissão.

Os outros filhos cursando também a faculdade de engenharia.

Isso o confortava muito. Missão cumprida enquanto vivo.

Mas a minha Yvette! Como está linda nos seus quarenta anos. Percebeu agora a diferença de idade de quatorze anos que havia entre eles. Isso doía.

Seu espírito se contorcia feito uma toalha molhada espremida, dela só vazavam ciúmes e ciúmes!

Yvette logo arrumou um namorado, que ainda por cima era médium.

Certo dia, o namorado estava na sala sozinho, quando de repente surgiu João vindo em sua direção! O namorado médium entendeu que poderia ser um parente da Yvette e logo levantou-se para cumprimentá-lo. O encontro dos dois foi hilário. Se trombaram, o namorado querendo cumprimentar e o João, com o punho fechado, desferindo um violento soco na cara do rival. Ele, além de não sentir nada, confuso, viu aquele vulto saindo pela parede. Nem desconfiou que era a alma do marido.

Frustrado por perceber que alma não consegue dar soco, João voltou triste para o etéreo, mas conformado de que agora estava em outra vida e que sua passagem pela terra foi promissora.

Passaram-se alguns anos e o namorado da Yvette faleceu.

Não sei o que aconteceu quando encontrou João no plano espiritual.

Será que lá o soco pega?

 

 

 


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