EM
VISITA AO FORMIGUEIRO
Ledice Pereira
Naquele primeiro dia de
férias que passaríamos na fazenda, ouvi mamãe gritando com alguém e fui ver do
que se tratava. Encontrei-a muito brava, tentando acabar com um formigueiro que
parecia estar se instalando no jardim, que ela tratava com tanto carinho quando
ali estava. Quando vínhamos embora, ela recomendava à velha Helena que não
deixasse de cuidar de suas plantas. Por isso estavam sempre tão bonitas.
Mas, naquele momento,
estavam sendo devastadas. Enquanto gritava, mamãe jogava inseticida, passava um
pano molhado cheio de sabão e as pobres formigas estavam em polvorosa. Umas
tentavam escapar, subindo pelos caules, outras pareciam avisar as companheiras
que chegavam para que voltassem. Por um momento, desejei com toda minha força
tornar-me tão minúsculo que pudesse fazer uma excursão pelos caminhos do
formigueiro.
Como que por encanto, aquele
gênio apareceu e, sabendo do meu desejo, transformou-me num pequenino ser.
De repente, eu estava ali,
na boca do formigueiro. As formigas passavam por mim como se eu não existisse.
Iam e vinham, atarefadas. Algumas carregando pedaços de folhas maiores do que
elas, em um vaivém sem fim. Fiquei ali plantado, olhando admirado para aquela
colônia tão bem construída, cheia de caminhos tortuosos.
O que será que fariam com
tantas folhas, eu pensava curioso. Elas eram tremendamente organizadas e
depositavam as folhas num determinado local.
Fiz amizade com uma das
formigas, menos disposta – digamos – a trabalhar que, me encontrando, resolveu
perguntar quem eu era e o que fazia ali.
Contei-lhe da minha
curiosidade e ela deve ter ido com a minha cara e achou que eu não apresentava
nenhum perigo, pois prontamente explicou-me que elas não se alimentavam
diretamente das folhas das plantas. O material cortado e carregado para dentro
dos ninhos, seria utilizado como substrato para cultivo de um fungo específico,
que serviria de alimento para toda colônia. Ficamos amigos. Ela devia ter algum
cargo privilegiado e levou-me a conhecer todo o formigueiro. Como eu estava bem
acompanhado fiquei tranquilo. Ninguém nos incomodou e eu pude ver aquele
labirinto, cujos caminhos levavam a vários lugares. Fiquei sabendo, por
exemplo, que em cada colônia de formigas há muitas rainhas que são responsáveis
pela reprodução e que podem viver até 18 anos. A fecundação das
formigas-rainhas ocorre durante o voo nupcial, e o macho morre logo após. Antes
de colocar os ovos, as rainhas perdem suas asas.
Ela me contou que cada
formiga possui uma função bem definida dentro da colônia: todas as tarefas são
bem divididas entre todas elas. Em um formigueiro há as formigas que são
responsáveis pela segurança, as que abrem os túneis do formigueiro e buscam
alimentos e as responsáveis pelos cuidados com as larvas. O formigueiro é uma
estrutura bem complexa, cheia de galerias e túneis subterrâneos que se estendem
por vários metros.
Foi um passeio muito
instrutivo, mas eu tinha que voltar porque minha mãe devia estar preocupada.
Quando estava saindo vi um corre-corre. O formigueiro estava sendo atacado por
uma substância de cheiro muito forte. Quase fui atingido também. Tentei gritar,
mas minha voz saiu tão fraquinha, diferente da que tenho. Pude ver um enorme pé
com botas, que quase me esmagaram e vozes distantes uma das quais parecia vir
de minha mãe.
Tive muito medo. Gritei pelo
gênio. Quando ele apareceu, pedi para voltar ao normal.
Mamãe estava toda
paramentada, de botas e vassoura com um produto na mão e conversava com alguns
homens que lhe explicavam como devia aplicá-lo.
Chamei mamãe de lado e pedi
a ela que não fizesse nada antes de me ouvir.
Embora muito aborrecida, ela
sentou-se ao meu lado. Falei a ela que tinha tido aula sobre como afastar
formigas sem prejudicar o formigueiro.
─ Você pode usar talco ou
cal espalhando perto das plantas, ou do formigueiro, ou borra do café usado que
além de nutrir a terra também afasta as formigas.
─ Aprendi na escola que
outra forma, um pouco mais complicada, é usar um material circular um pouco
maior que a área que você quer proteger,
como baldes, sobras de cano de esgoto, entre outros. É só colocar no lugar,
cortando o fundo e a lateral para
encaixar no entorno da planta ou árvore. Enterrar um pouco abaixo da terra o
material circular aproximadamente 1 cm. Meu professor disse que essa barreira física
é muito eficaz. Muito mais do que inseticida e esses produtos que você está
usando.
Ela me olhou incrédula, me
deu um beijo e disse:
─ Eu não sabia que você se
interessava tanto por formigas, nem que estava aprendendo na escola. Fico
orgulhosa de ver como você está crescendo e até me ensinando como devo
proceder. Vou pensar seriamente no que me falou.
E foi falar com os homens,
dispensando-os.
É lógico que não vou contar
a ela sobre minha aventura. Até porque ela nem vai acreditar.
Pude ver aquela formiguinha
tão pequena que me ensinou tanta coisa. Tive a impressão de que sorria para
mim. Será que nessa altura eu estaria tendo visões?
Nenhum comentário:
Postar um comentário