A PANDEMIA
Ledice Pereira
Estava indo tudo dentro da conformidade. Íamos
levando a vida na nossa rotina quando, de repente, surgiu a notícia de que um
vírus estava matando pessoas na China. Um vírus proveniente do morcego. Nossa,
do morcego?
Quão distante estamos da China e do morcego!
Mas a coisa era séria. Hospitais foram lá
construídos, em apenas dez dias, para receber vítimas do pavoroso e longínquo
vírus.
Vivemos num mundo globalizado. Pessoas viajam
diariamente de um continente a outro. E o vírus viajou.
Chegou à Itália, com uma força incontida,
infectando uma enorme quantidade de gente e dizimando, principalmente, idosos
numa fúria descontrolada.
Fronteiras foram fechadas com intenção de conter o
avanço a outros lugares da Europa, mas a pandemia era declarada.
A equipe da saúde bastante eficiente, diga-se de
passagem, aqui em nosso país movimentou-se rapidamente, tentando entender o que
vinha por aí, mas o desconhecimento do vírus levou-os a estudar, estudar e
estudar, além de receber orientação de quem já vinha passando pelo problema.
Decidiram orientar o isolamento. Têm sido
categóricos em determinar que fiquemos em casa. Única maneira de não nos
contaminarmos.
Na noite em que foi decretada a pandemia, ainda
participei do ensaio do nosso coral que por sinal foi ótimo. Estávamos animados
com o novo arranjo trazido pelo maestro, preparando-nos para cantar no dia do
lançamento do meu terceiro livro, quando aproveitaria para comemorar minhas
bodas de ouro.
Ao voltar para casa e assistir ao Jornal da meia
noite, a ficha caiu.
Naquela noite, custei a dormir. Comecei a pensar
que devia cancelar o evento. Não poderia colocar amigos em risco. Manhã
seguinte, estava decidida. Conversei com o marido e liguei para os filhos. Estávamos
todos preocupados.
O desconvite foi feito imediatamente e acolhido por
todos. E, desde aquela tarde de doze de março, não mais saí de casa.
E neste nono dia de confinamento vejo que estamos
apenas no início de um vendaval, desconhecido, perigoso, de proporções
devastadoras. Sentimo-nos pequenos, impotentes, despreparados, ameaçados, com
medo.
Mas temos que ter esperanças, força, resignação,
paciência e obediência.
Os dias para mim não estão tranquilos. Optei por
manter as duas diaristas na casa delas. Aliás sou de opinião que todos deveriam
tentar fazer o mesmo, sem evidentemente, deixá-las sem pagamento.
Por isso, há muito que se fazer em casa. Cuidado
redobrado com a higiene, lavagem mais frequente de toalhas e roupa de cama,
limpeza frequente de banheiros e cozinha, além do que já é de hábito se fazer,
cozinhar, ajeitar, guardar etc.
As compras, tenho recebido do filho e da nora que
também estão bastante atribulados. Estão trabalhando no sistema home-office,
e são requisitados quase as vinte e quatro horas do dia. Sem contar que também
dispensaram a ajudante, dividindo-se nos afazeres da casa e compras.
As compras de farmácia, encomendei online e recebi
estoque para três meses.
Mas sempre falta alguma coisa, além dos produtos já
faltantes como álcool gel, desinfetante lysoform e máscaras para uma
emergência.
Novos tempos, novos hábitos.
Escolas fechadas, comércio e lazer idem. A ordem é
FICAR EM CASA.
Difícil fazer muita gente aceitar que se trata de
um momento crítico. Difícil muitos entenderem que a situação é gravíssima.
Ao redor do mundo, pessoas que inicialmente eram
céticas, têm nos aconselhado a permanecer em isolamento diante de uma das
maiores crises da história.
As imagens mostradas da Itália são de cortar o
coração. Diante disso, tentei estabelecer uma rotina. A
parte da manhã até o almoço é toda dedicada à casa.
À tarde, tento ler, estudar as partituras novas
enviadas pelo maestro, ver a mensagens enviadas pelos amigos, efetuar
pagamentos online, tomar providências quanto a um apartamento que desalugou,
tendo conseguido finalizar a juntada e envio dos documentos para o contador que
fará nosso imposto de renda.
À noite, além de ver as notícias do dia, tenho
assistido a programas alternativos de TV, que sirvam para nos distrair um pouco.
Amanhã, domingo, estou me programando para ouvir
música no Spotify. Confesso que estou precisando. Anteontem, sem querer, sintonizei
uma apresentação da Orquestra Jazz Sinfônica com solo do Francis Hime e canto
da Olívia Hime. Foi lindo!
Assim, nessa barafunda de situações, tenho passado
meus dias nada monótonos. Com tempo ainda para falar pelo Skype com os netos da
Bahia.
Felizmente, fecharam para turistas, a entrada em
Barra Grande.
Esqueci de dizer que coloquei meu celular para
despertar todos os dias, às 18,00h para rezar pela paz numa corrente de fé.
Quero ter esperança de que passar por essa provação
nos torne mais fortes e nos dê uma nova dimensão do que significa viver no
sentido mais amplo da palavra. Dando mais valor àquilo que realmente importa, a
vida e os seres humanos. O resto? Bem, o resto é o resto.
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