CONTO DE FÉRIAS Nº 3
SEGREDOS DE FAMÍLIA
Carlos
A. Cedano
Dona
Carmem olhou para o marido e disse:
— Precisamos conversar com urgência
sobre uma grave suspeita que não me dá sossego. Tenho certeza de que minha
filha, sua enteada, está grávida!
— E o que te faz pensar isso, mulher!
— Uma mulher percebe logo. Enjoos, azia,
desarranjos e só quer dormir, cansada o tempo todo! Preciso dizer mais?
—Mas, quem é o pai? Perguntou com
semblante de preocupação.
— Não sei! E ela não vai falar. Ela
disse que nem morta vai contar, e nega a
gravidez! Já insisti várias vezes, e cada vez se recusa com mais violência e
agressividade!
— A situação é grave, Carmem! Está em
risco nossa posição social, minha promoção a Juiz do Tribunal Superior, e expõe nossos filhos ao escárnio público.
Ter uma filha grávida sem saber quem é o pai, isso é demais!
— Que vamos fazer Francisco?
— Primeiro consultar um médico da
capital, desconhecido e que não receberá todas as informações sobre a Sarah.
Francisco
levantou-se da poltrona e foi falar com a enteada. Tiveram uma conversa a sós
por mais de uma hora. Ninguém soube o teor. Quando terminaram, Sarah parecia
apavorada!
Duas
semanas depois Dona Carmem, uma robusta mulher beirando aos quarenta, e sua
filha Sarah, empreendiam viagem para a capital do estado para “visitar parentes que há tempos não viam”.
Nos
dez dias que durou a ausência das duas mulheres o Juiz Francisco foi conduzido
ao cargo de Juiz do Tribunal Regional. Nomeação esperada, mas não tão rapidamente! Isto reforçou a sua posição e
acentuou o medo nas pessoas, pois tinha fama de ser extremamente rigoroso, e
cruel!
Perto
do Juizado havia o mercadinho de João Breno, um rapaz de 30 anos e
recém-casado. Na sua loja vendia de tudo, e o Juiz Francisco passava
frequentemente para comprar cigarros. Aos poucos foi surgindo certa aproximação
entre eles.
Um
dia o Juiz chamou João Breno ao seu gabinete. O motivo da reservada conversa
ninguém ficou sabendo, salvo que durou quase a manhã inteira.
Quando
a filha de Sarah nasceu, foi registrada como
filha de João Breno. Tudo dentro da maior discrição. Repentinamente os negócios
do João tiveram grande crescimento e modernização. A menina foi criada em dois
lares, na casa do João, e na casa do juiz onde era requisitada constantemente “para visitar os padrinhos”.
Quando
o Juiz Francisco morreu, os filhos já estavam graduados e trabalhavam na
capital. As filhas casaram com jovens da
pequena cidade.
Dona
Carmem e Sarah também foram morar na capital do Estado, levando a pequena Sonia
Maria com elas. Sarah recuperara a filha, que via
“seu pai” Breno durante as férias escolares. Guardava belas lembranças dele,
adorava-o!
Muitos
anos depois, em alegre almoço familiar de domingo, um dos primos de Sonia
observou a semelhança que havia entre ela e seu pai:
— Gente,
vocês perceberam a cara de meu pai e a da prima Sonia Maria? São iguais,
parecem gêmeos! Olhem! Vocês não acham?
Fez-se
silêncio pesado e desconcertante. Ninguém reagiu. Ninguém ousou responder! Os que não sabiam, perceberam! E os que fingiram
durante todos os anos, pálidos, mordiam os lábios!
A
mãe do garoto apressou-se e puxou-o pelo braço saindo rapidamente da sala de
jantar. Atrás deles foi o marido. Aos poucos as visitas discretamente, foram
“sumindo”. Restou apenas Dona Carmem, Sara e Sonia Maria. Foram três tragédias
num só ato!
Sonia
Maria, muda, ficou como sonâmbula. Em
estado catatônico foi para o quarto, e
dormiu muitas e muitas horas.
Dona
Carmem ficou desnorteada, e dolorida ao descobrir algo que tinha estado todo o tempo embaixo de seu
nariz. Não resistiu à traição e ao pecado do falecido juiz, e em poucas semanas faleceu de tristeza.
Sarah
quase morreu de raiva. Gritava: Meu
segredo! Ia levá-lo comigo para o túmulo! Acho que perdi minha filha pra
sempre! Rosnava chorando.
Passado
um tempo, quando já se sentia um pouco aliviada da dor, Sonia Maria viajou até
a cidade de seu pai. Ele foi avisado, antecipadamente, por Sarah. Quando a
jovem chegou Breno estava chorando, e lhe pediu perdão. Porém, ela queria saber
toda a verdade, e queria ouvi-la da boca de quem até agora chamou de pai!
Ele
contou o acordo feito com o Juiz. E que ele assumiu a paternidade, já que o
Juiz não poderia fazê-lo. E, para isso, recebeu muito dinheiro.
— Então! Eu sou filha de meu avô com a
enteada! É isso?
— Sim! - Sussurrou Breno quase
inaudível.
Sonia
Maria, estupefata, calou. Voltou para a
capital no mesmo dia, e sem falar com mais ninguém, despareceu.
Nunca
mais foi encontrada!
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