CONTO DE FÉRIAS Nº 2
O
MISTERIOSO SENHOR RIOS
Carlos A Cedano
Era um homem estranho. Não
tinha contato com os vizinhos do prédio, não conversava com ninguém. No
elevador não respondia os comprimentos, ninguém o tinha visto sorrir, ninguém
lembrava o som de sua voz. A meu ver escondia alguma coisa.
Dias passavam, semanas e
messes e sempre a mesma rotina: saia por volta das dez e meia da manhã com
roupa esportiva, com uma mochila nas costas e sempre usando um boné. Voltava quase
às duas horas da madrugada.
Nada de correspondência
pessoal. Na sua ficha aparecia como sendo Raul Rios, nascido na Colômbia e
tinha trinta anos. O restante de seus dados era desconhecido e morava há menos
de um ano no prédio.
O imóvel tinha somente
quatro andares, os moradores se conheciam, e os comentários e fofocas sobre
Raul corriam soltos. Uma jovem senhora, recentemente divorciada, comentava:
— Nunca o vi receber visitas, nem
mesmo mulheres, isso é muito raro e ele é um gato! Concluiu ela com um profundo
suspiro.
Outras moradoras
cochicharam concordando.
— Vejo que você já reparou em
detalhes! Disse o síndico com certa ironia.
— Sim! Na semana passada
cheguei tarde, no mesmo momento que ele entrava no prédio, trazia o boné na mão
e pude perceber que além de alto era moreno com olhos esverdeados, retrucou a
jovem senhora.
A senhora Ofélia, moradora
do quarto andar comentou:
— Talvez possamos saber mais sobre
nosso misterioso vizinho se falarmos com sua faxineira, ela deve saber coisas
que ignoramos!
Vai ser difícil, disse o
velho zelador, sua faxineira vem somente uma vez por semana e nunca é a mesma.
Elas, antes de virem pra cá, têm que passar pela administradora para retirar a
chave do apartamento e têm instruções precisas para não falar coisa alguma do
inquilino caso contrario, podem perder o emprego e elas são bem pagas!
Desculpem meus amigos,
disse o síndico, dirigindo-se aos condôminos: Isto já esta ficando obsessivo!
Sem motivos sérios ou válidos, vamos deixar as coisas como estão. O senhor Rios
tem tido até agora um comportamento adequado além de ser muito discreto. Por
favor, voltem para seus apartamentos e vamos esquecer esta historia.
Passaram-se duas semanas
quando apareceram noticias alarmantes preocupando os moradores, e vizinhança.
Com grandes letras os jornais anunciaram a descoberta de duas senhoras
assassinadas em suas residências. As
vítimas moravam relativamente próximas do edifício..
Foi uma loucura geral. Os
moradores, talvez por medo ou por culpa de desejos inconscientes, assinalavam a
figura de Raul Rios como suspeito. Cadê
ele? Perguntavam um para o outro.
Ninguém sabia responder. O síndico convocou uma reunião geral para tomar medidas em aumentar a segurança.
A reunião realizou-se no
dia seguinte. Os primeiros minutos da
reunião foi um festival de manifestações histéricas. À duras penas o síndico,
com a colaboração de outro condômino, conseguiu estabelecer ordem. Amainaram os
choros desesperados, as acusações desenfreadas a Raul Rios e a indignação
contra a passividade do síndico que já deveria ter tomado medidas de segurança!
O misterioso colombiano não compareceu,
acentuando as desconfianças sobre sua pessoa.
O resultado da reunião
foi: alterar o “segredo” das fechaduras, maior rigor ao anunciar e identificar
as visitas e o pessoal de entregas e, substituir o zelador por um bem mais
jovem e mais forte.
A coisa piorou quando três
semanas depois houve uma terceira vítima morta do mesmo modo que as duas
anteriores. A mídia explorou intensamente o fato e anunciou que, com certeza,
se tratava de um “serial killer”!
A situação coincidiu com a
comunicação, por parte da firma imobiliária, que o senhor Rios tinha deixado em
definitivo o apartamento. No dia seguinte uma das faxineiras retirou os poucos
pertences que tinham ficado para trás.
Muita coincidência! Foi o
comentário general. O síndico, sem mais dúvidas, desta vez contatou a policia.
O investigador Pedro
Ferrer reuniu-se com os residentes. O síndico começou a falar, mas era
constantemente interrompido pelos presentes ansiosos por agregar detalhes ao
relato. O investigador Ferrer se encheu e fez valer sua autoridade e, curto e
grosso, disse:
— Ou vocês ficam em silencio ou quem
interromper será “convidado” a retirar-se! Esta é a primeira e única
advertência! Após o depoimento do síndico darei a palavra aos que a solicitem,
estamos entendidos? Silêncio geral, nenhuma reclamação!
Ferrer fez entrar seu
assistente, Joãozinho, que também era especialista em “retratos falados”. Após
duas horas de trabalho os moradores chegaram a um consenso. O retrato era
satisfatório.
— Sim, é a cara do senhor Rios! Disse
um senhor de media idade e os residentes concordaram.
O investigador Ferrer
respirou fundo e disse:
— Preciso ampliar as diligencias e
peço licença para retirar-me, estarei ausente uns três dias e prometo trazer
noticias pra vocês e foi saindo deixando os condôminos atônitos, e com mais dúvidas.
Com as mesmas
características aconteceu um quarto assassinato. Desta vez na casa exatamente
na frente ao prédio. Os moradores viram
a chegada da policia, escutaram a movimentação das viaturas e a presença das
diferentes mídias.
Foi demais! Houve necessidade
de chamar médicos e serviços de pronto socorro. A parafernália foi completa,
pra ninguém botar defeito!
Dois dias depois, a pedido
do investigador Ferrer foi convocada uma reunião urgente para as vinte horas.
Na hora exata apareceu o
síndico junto com o investigador Ferrer e dois colegas. O síndico, sem mais
delongas passou a palavra para o investigador que disse:
— Quando a maioria de
vocês reconheceu o senhor Rios como o assassino no “retrato falado”, fomos à
empresa administradora do imóvel para buscar mais informações. Após muita
insistência nos disseram que ele era profissional do sexo e contratado por uma
empresa paulista para produzir três filmes pornôs. Isso, acho, explica seu
relativo isolamento e discrição, disse Ferrer.
Houve um comprido e sonoro
oh! Por parte dos moradores.
O investigador continuou
— Fomos para a empresa produtora e o
gerente nos confirmou que, de fato, o senhor Rios tinha trabalhado pra ele,
tinha concluído satisfatoriamente o contrato e tinha viajado para seu país três
dias atrás.
— Então ele conseguiu fugir! Gritou
nervoso um senhor idoso.
O investigador Ferrer
continuou:
— Não nos precipitemos e mostrando uma
foto de Raul Rios perguntou aos assistentes: é este o senhor Rios?
— Sim! Foi a resposta unânime dos
moradores.
— Ok! - Disse o
investigador:
— Comparando o retrato falado feito
aqui com vocês com aqueles feitos na ocasião dos três crimes anteriores,
verificamos que se tratava de pessoas diferentes! O senhor Rios foi descartado
como suspeito. Ele já estava nos Estados Unidos onde mora, quando ocorreu o
quarto crime.
Ontem à noite prendemos
outro suspeito, comparamos as impressões digitais das diferentes cenas dos
crimes, revistamos sua casa e conseguimos as provas necessárias. Com as
evidências nas mãos ele confessou a autoria dos quatro assassinatos. Eu já tinha
visto antes este sujeito.
Com a tensão e ansiedade
aumentando alguém dos presentes gritou: Por favor, fale de uma vez, porra!
— É o novo zelador deste prédio —
disse o investigador mostrando os três retratos falados anteriores — sem dúvida
nenhuma, é ele! Concluiu Ferrer.
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