ESTRELA CADENTE - PARTICIPANTE DO CONCURSO ESCREVIVER 2018 - EU E O UNIVERSO





 ESTRELA CADENTE




JOSÉ VICENTE JARDIM DE CAMARGO
PSEUDÔNIMO: BENDEGÓ TOPAI


Na imensidão do universo, onde tudo é superlativo, o silêncio também é absoluto, pois, pela falta de atmosfera, o som não se propaga. Este infinito silencioso pode ser tão maravilhoso, por conter  bilhões de astros luminosos que o riscam em formações geométricas de tirar o folego, quanto assustador, pela quantidade de mistérios que ainda o envolve.

Nesse cenário surreal, Ptolomeu − renomado astrônomo grego – num dia do ano 150 AC, mira, através de sua luneta, um ponto luminoso rasgando o firmamento numa velocidade acima da normal e numa trajetória em ziguezague, intercalada com piruetas, atípicas para os fenômenos celestes. Concentrou-se na tentativa de entender o fenômeno nunca antes visto. Consultou seus cadernos de anotações, manuscritos de outros  astrônomos, mas nada parecido encontrou. Então resolveu apelar a Zeus, deus do universo.

No oráculo do Monte Olímpio, diante da estátua de Zeus, solicitou esclarecimentos para entender tão estranho comportamento. Seria alguma outra divindade querendo desafiar o equilíbrio universal tão bem supervisionado por Zeus? Roga uma resposta...

A resposta não tarda! Zeus envia seus raios mensageiros, avisando que o astro rebelde é o asteroide Aristarchus, descoberto pelo astrônomo e matemático grego Aristarco de Samos e pertence ao cinturão de asteroides situado entre marte e júpiter. Após vários apelos para que volte a sua rota original, ele se recusa a obedecer. Junto com a mensagem, Zeus envia poderes extraordinários a Ptolomeu, para que, como última tentativa, entre em contato com Aristarchus e o convença. Caso contrário, será castigado pelos raios de fogo de Zeus, que o queimarão até virar cinza.

Ptolomeu, voltando ao seu observatório e à sua luneta, localiza no firmamento Aristarchus, eleva seus braços em direção a ele e, utilizando os superpoderes dados por Zeus, lhe diz:

— Aristarchus, porque não obedeces a Zeus, pai dos deuses, do universo e dos raios, e não retornas à tua rota no firmamento? A ordem dos astros neste espaço sem fronteiras, onde bilhões e bilhões deles gravitam e se sustentam mutuamente, é muito importante, pois gera o equilíbrio das forças magnéticas entre eles, vital para a sua sustentação. Esse seu comportamento de pular de órbita, pode causar um acidente sideral de grandes proporções, ainda mais se considerarmos a proximidade da sua trajetória com a do planeta Terra. Caso se choquem, seria uma hecatombe pior que a que aconteceu há milhões de anos atrás, quando outro asteroide rebelde atingiu esse planeta, modificando totalmente seus continentes e aniquilando a metade dos seres vivos que o habitavam. Eu, terráqueo e amante desse planeta de paz e amor, apelo ao seu bom senso.

Aristarchus, dando mais uma pirueta para demonstrar sua rebeldia, contesta:

— Zeus me esqueceu! Lhe disse várias vezes que estou cansado de vagar milhões de anos por esse espaço silencioso, essa solidão eterna, contornando uma miríade infinita de estrelas, constelações, planetas, a mercê das suas forças que me jogam para cá, para lá, tal qual uma peteca de brinquedo. Quero ter um lugar de destaque nesse universo: Ser uma estrela das bem brilhantes no centro de uma galáxia gigante, rodeada de inúmeros planetas com inúmeros satélites... Como o universo está em contínua expansão, pedi a Zeus criar essa galáxia que se chamaria Aristarchia! Mas ele não concordou! Me disse para ser mais humilde, pensar menor...Então estou protestando, mostrando que minha presença no cosmos é importante, posso até causar um desequilíbrio que pode gerar uma explosão maior que a do Big Bang...

Ptolomeu se dá conta que não será fácil convencer Aristarchus a voltar à razão e retomar à sua órbita. Realmente ele pode causar um desequilíbrio no cosmos e causar uma explosão de matérias com consequências imprevisíveis. Para evitar tal hecatombe, Ptolomeu tem uma ideia: vai explorar seus sentimentos humanos, transmitidos a ele − assim como aos demais astros do universo – pelo poder divino de Zeus e a vaidade de Aristarchus, sua necessidade de se expor, de chamar a atenção, será utilizada para tal fim.

— Aristarchus, tua rebeldia não será perdoada por Zeus! Teu desejo de ser a superestrela de uma galáxia, é difícil de realizar, dado as incertezas do universo − ora se expande, ora se retrai – mais um entre seus muitos mistérios...  Se não obedeceres, Zeus te castigará com o fogo dos seus raios até virares pó. Além do mais, corres o risco de, saltitando de orbita em orbita, acabes sendo sugado por um buraco negro e aí então conheceras o mais temido dos segredos siderais: o que esconde essa escura imensidão! Outros universos? Mediante tal perigo, sugiro que venhas para a orbita do planeta Terra, pois ao ingressá-la, enfrentarás o atrito da atmosfera terrestre, que o esfregará até que de quedes luminoso e tão brilhante que os terráqueos o chamarão de estrela cadente. Serás por eles admirado tal uma divindade e o teu esplendor será tanto, que passarão a te expor seus desejos para que cumpras. Terás vida curta, mas de lembrança longínqua. Se o desejo pedido for realizado, serás para sempre lembrado como a mais linda das estrelas cadentes e se o desejo demorar a vir, não te preocupes, pois os terráqueos se agarram muito às esperanças e estarás então nos seus corações ansiosos pela tua volta, na forma de outras estrelas que se deixam cair do firmamento, iluminando com sua calda incandescente o desmedido infinito.

Mal Ptolomeu expõe seu apelo, observa, no remoto horizonte do espaço sideral, um ponto luminoso e brilhante que, num mergulho vertical, entra a desbravar a atmosfera terrestre...
Assim iniciou-se, na história da humanidade terráquea, o conceito tão romântico de Estrela Cadente...e
As respostas para as inúmeras incógnitas do universo, podem não estar nos astros ou na religião, mas na literatura...


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