A
CANETA PARKER 61
Sergio Dalla Vecchia
Meu olhar era fixo na caneta do meu pai, que estava
em uma das minhas mãos. Eu me encontrava em um quarto do Hospital da
Beneficência Portuguesa de São Paulo, onde me pai havia sido internado. O
motivo foi um AVC (acidente vascular cerebral) que ele sofrera naquele dia.
Recordo que logo após o AVC, ainda em casa, ele se
esforçou para me apontar com o seu braço na direção do criado mudo. Nele estava
sua carteira de dinheiro, a identificação de procurador da República e a inseparável
caneta Parker 61.
Imediatamente peguei as três. Coloquei as carteiras
nos bolsos das calças e a Parker no da camisa dele.
Rapidamente a ambulância chegou e fomos para o
Hospital, minha mãe, meus irmãos e eu.
Assim, depois dos primeiros exames, meu pai foi
medicado e induzido a um estado de coma.
Passados alguns dias, devido ao cansaço, nós nos
alternávamos no acompanhamento dele no período noturno.
Comecei também a lembrar de quanto o meu pai era
companheiro da turma. Sim turma, pois éramos quatro irmãos.
Aos domingos pela manhã, ele pegava o seu
lustroso Simca três Andorinhas e nos levava a passear aleatoriamente
nos diversos Parques da cidade de São Paulo, ou assistir os desenhos de Tom &
Jerry na matinê do cine Metro.
O que eu mais gostava de ir era ao Parque do
Estado, onde eu rolava nos taludes de grama de sombra com meus irmãos, e dava
pão para as traíras do lago.
Enfim, todos os Domingos eram uma festa.
Ríamos muito e brincávamos sem parar.
Quando retornávamos para casa, a mamãe nos
esperava com um laudo almoço. Ela mesma quem cozinhava. Era ótima, aprendera a
arte com a vovó Maria!
Enquanto nos lavávamos meu pai sentava-se na
poltrona da sala e bebia um shot do seu uísque preferido, o OLD PARR ao som da radio vitrola tocando
TCHAIKOVSKY.
Íamos à mesa, com uma fome de leão e paz de
cordeiro, pois todas as nossas energias ficaram pelos caminhos.
Assim, com a caneta sempre nas mãos, vez ou
outra eu acordava de um cochilo feliz da vida, pois a recordação dos bons
momentos me acalmava e me fazia esquecer a delicada situação.
Passaram-se dias de vigília na esperança de que
meu pai abrisse os olhos como sinal de vida.
A expectativa era tremenda! Orações, promessas, muita
fé, mas para nosso desapontamento conseguíamos apenas um esporádico piscar de
olhos.
Infelizmente e para a nossa tristeza, no
vigésimo dia Deus o levou!
Lembro-me dos marcantes discursos dos colegas
advogados durante o sepultamento no cemitério São Paulo. Foi uma emoção geral!
A Parker está comigo até hoje guardada carinhosamente
em um estojo forrado de veludo.
Quando a saudade aperta, retiro-a do estojo e
com uma flanela a esfrego como se fosse a lâmpada do Aladim.
O gênio
aparece e me diz:
— Já sei,
quer passear com seu pai de novo, não é?
— Seu desejo é uma ordem!
— Abracadabra!
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