À
SOMBRA DA MORTE
Sérgio
Dalla Vecchia
A
passarela estreita, junto à parede rochosa, rangia tábuas a cada passo de
Mario. Na altitude de 2000m, o vento balançava o corpo esguio do aventureiro
convicto. O único apoio era um corrimão feito com uma corrente, cravada na
rocha ao longo da passarela. Não se intimidava em olhar para baixo. Cena
atordoante para qualquer pessoa. Mario não pertencia a esse grupo!
Logo
atrás estava Pierre, companheiro de aventuras. Conheceram-se nas montanhas dos
Pirineus, na divisa entre Espanha e França e desde então, tornaram-se inseparáveis. Um encontrava no outro
coragem e forças para transpor qualquer obstáculo.
Naquele
momento Mario percorria a passarela em umas das montanhas sagradas da China, a
do Monte Huashan, a trilha mais arriscada do mundo, para mais uma de suas
aventuras radicais.
O
perigo o circundava, a adrenalina era seu oxigênio!
Fora
desse ambiente, Mario parecia não viver, apenas deixava o tempo passar
programando a próxima aventura.
Veterano
em turismo radicais, experimentou o volcano-boarding na Nicarágua,
escorregando em uma prancha, pela parede da cratera do vulcão Cerro Negro, em
direção a lava incandescente.
Percorreu
de bike a estrada da morte entre La Paz e Coroico na Bolívia. Mergulhou
com os maiores crocodilos do planeta em Darwin, Austrália. Pendurou-se
em um cabo a 553m de altura, dando volta no prédio da CN Tower, Toronto,
Canada. Mergulhou com os temíveis tubarões brancos na Cidade do Cabo, África do
Sul. Em saltos bungee jump atirou-se dos pontos mais altos do mundo.
Nada
era impossível para aquela alma destemida e seu companheiro Pierre.
Recebeu
na adolescência o apelido de Mario Louco, por andar pelo peitoral do salão de
festas, na cobertura do prédio onde morava. Peripécias com a motinho eram
indescritíveis!
Após
algum tempo de trilha os dois amigos chegaram em uma outra passarela mais
estreita, isolada e distante da principal. Buscavam não se sabe o que! Apenas
andavam. Parecia que algo os puxava para mais longe.
O
vento começou a uivar, as golfadas frias os incomodavam.
A
estreita passarela fletia a cada pisada, mas avançavam!
O
ventos catabáticos, descendentes característicos das montanhas de
60km/h os desiquilibravam, e a adrenalina alimentava cada célula dos
intrépidos. Olhavam-se a cada avanço, na esperança de ver o medo estampado,
nada. Eles sorriam e mostram um polegar ereto.
Assim
insistiam lutando contra a adversidade da natureza. A morte dava sinais de vida, escorregões e alguns
desiquilíbrios mais marcantes. O nevoeiro descia morro abaixo, como se quisesse
mostrar a eles, a velocidade que o vento lhe impunha. Serpenteava pelas reentrâncias
querendo esconder-se do vento frio, que o manipulava em curvas e rodopios
uivantes. O céu não se mostrava, o sol apagou-se. Eram apenas os dois avançando.
De repente ouviu-se um estalo, uma tabua partida e Mario pendurado sobre o
abismo. Segurava-se como podia, no que restou da escorregadia passarela
desgastada pelo tempo. Era forte o bastante para subir, tentava, mas o vento
não o permitia. Pierre logo atrás, com muito esforço, segurou-se na corrente
com uma das mãos, e com outra foi erguendo Mario. Era tudo difícil, a corrente
gelada queimava, a velha passarela rangia a cada puxada de Pierre, até que
conseguiu recolocar Mario a salvo. Corações acelerados, respirações ofegantes e
um grande abraço de alívio, que não chegou a se concretizar. Pierre com os
braços prontos para o abraço escorregou
e despencou!
A
cena era desesperadora. Mario viu no rosto em queda livre, aquele encorajador
sorriso do companheiro. Parecia lhe dizer: - Tudo bem amigo, esse obstáculo
também será transposto, coragem!
Desta
vez Mario não retribuiu com outro sorriso, mas sim com lágrimas nos olhos
estarrecidos!
Pierre
sumiu nas profundezas do grande abismo, em busca de mais uma nova aventura.
Para ele não havia antagonismo entre vida e morte.
Assim,
após um período de retrospecção, com a imagem do amigo tatuada na
mente, Mario resolveu persistir nas aventuras à sombra da morte, protegido
pela luz da vida!
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