CONTO AMARELO – O MUNDO MUDOU
OSWALDO ROMANO
Estávamos no Japão, em viagem de lazer.
Éramos quatro. Eu, Norma minha mulher, e o casal
Mary e Carlos.
Quebramos nossa longa viagem com um stop
de três dias em São Francisco, cidade já visitada por nós há cinco anos. Nada a
ver com a primeira vez que ali estivemos. A música ouvida pelos cantos era a
mesma, I left my heart in San Francisco. Os prédios, as casinhas
coloridas também.
Mas o povo mudou. Os bondinhos, os
mesmos, ainda puxados por cabos
subterrâneos. Uma incrível lotação com
gente que se movimentava sem destino, só pelo direito de ir e vir. Estes, alegres
turistas, não davam espaço aos que precisavam do transporte para trabalhar.
Naquela época a Union Square era um palco
de desabrigados e mendigos. Os gays
tinham seu espaço. Não incomodavam.
Observamos ao fundo Alcatraz, a mesma
vista, a ex-morada do famoso All Capone. Não se pode falar do perigoso
traficante, sem que nos baixe a lembrança de Eliot Ness, o temível detetive que
metia bala sem dó.
No Pier 39 procuravam-se restaurantes
recomendados para saborear as delicias dos frutos do mar. Das casquinhas aos
camarões grelhados no azeite, das vieiras aos risotos, pedia-se perdão ao Ness,
o desafeto das bebidas, porque não se dispensava um bom Chiant.
O povo mudou. Não se usam mais ternos ou
gravatas. Não se confundem mais aparências com artistas, mas o que continua e não
mudou, foi a fome daqueles produtos. Comem-se com as mãos, camarões, mexilhões,
ostras, esqueceram as pinças próprias para esses deliciosos frutos. As
embarcações parecem as mesmas. Mas onde estão aqueles tripulantes galhardamente
vestidos, identificados por berimbelas douradas?
Essa nostalgia surge quando observamos
em qualquer canto da cidade, hippies, tatuados e tatuadas, homens de mãos
dadas, e os pirobos que não mais se escondem.
O povo da Califórnia mudou nesta
viagem. Paramos ali, a caminho do Japão. De lá queríamos apreciar um pouco da
nobreza da terra do sol nascente. Encontrar com gente elegante como a que vimos
em São Francisco, há cinco anos.
Prosseguindo a viajem estamos aqui.
Chegamos na terra dos imperadores ainda em tempo de embarcar no fabuloso trem
bala Shinkansen e com retorno marcado para o mesmo dia. Estes trens existem
aqui há 50 anos, com velocidade normal de 300 quilômetros por hora, iguais aos
da Europa, inclusive os de Portugal. Não fossem os escusos interesses eleitoreiros,
o Brasil poderia tê-los há muito tempo. Se lá chegar, vai chegar tarde porque,
um novo modelo está despontando. Traz o principio da levitação magnética, vai
viajar a 580 quilômetros por hora, flutuando sobre os trilhos!
Finalmente respiramos Tóquio. Descemos próximo a praça no Akasaka Hotel.
Mary, Norma e o Carlos, exaustos recolheram-se, pretendendo fazer um breve repouso.
Eu quis conhecer os arredores, atitude
normal de viajante que chega a cidade pela primeira vez.
Foi ruim. Estou desiludido. Voltei
indignado. Ai “Que saudade de São Francisco”. Minhas palavras surpreenderam. Inesperadas
achavam mal colocadas. Criou-se uma deprimida expectativa.
— O que houve? - Norma assustada perguntou
muito agitada, enquanto Mary e Carlos abrindo bem os olhos, pareciam
congelados, silenciavam.
— Surpresa gente! Surpresa! Tudo igual,
tudo igual. Eta mundo pequeno.
— Igual o que. Fala. Fala Alcides.
— A culpa é minha. Eu sou o culpado. O
mundo todo mudou! Fui eu quem programou esta infeliz viagem. Só hippies! Lá
fora vi só hippies e mulheres devassas. Tem mais do que toda população da
Liberdade. Um deles trepado numa cadeira, em plena praça gritava palavras de
ordens, enquanto outros igualmente tomados, cabelos pintados e espetados,
apontando o dedo em várias direções respondiam:
— Fujakatá, fujakatá, sápuuuuuuu,
sápuuuuuu, sápuuuuu, fujakatá, fujakatá.
— Alcides - O que eles queriam dizer?
— Sei lá... fuja- catá sapo... Quem fugiu fui eu. Foi tudo
que vi. Quero voltar pro Chico.
Pensando bem. Será que também exausto
fui repousar, dormi, sonhei, e o Japão não é nada disso?
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